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Menino achado em cela já dormiu no mesmo presídio com o pai, diz promotor

Divulgação/Sinpoljuspi (Sindicato dos Agentes Penitenciários do Piauí)
Imagem: Divulgação/Sinpoljuspi (Sindicato dos Agentes Penitenciários do Piauí)

Aliny Gama

Colaboração para o UOL, em Maceió

03/10/2017 20h11Atualizada em 03/10/2017 20h35

Os pais do adolescente achado dentro de uma cela da Colônia Agrícola Major César de Oliveira, no município de Altos, região metropolitana de Teresina (PI), com um preso que cumpre pena por estupro de vulnerável, serão indiciados por ao menos dois crimes cometidos. O menino e os pais prestaram depoimento na tarde de hoje na delegacia de Altos. Segundo o Ministério Público, a criança já dormiu em uma cela da unidade prisional quando o pai estava recluso.

O delegado Jarbas Lima informou que o casal vai ser enquadrado nos artigos 232 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), por suspeita de submeterem o garoto a vexame, e no 133 do Código Penal Brasileiro, por suspeita de abandono de incapaz. Em caso de condenação, a pena para quem infringir o artigo 232 do ECA é de seis meses a dois danos de reclusão. Já para o infrator do artigo 133, a pena é de seis meses a três anos de prisão.

Se for comprovado abuso sexual do preso contra o adolescente e que os pais receberam alguma vantagem por exposição da criança à prostituição, eles também vão ser enquadrados do artigo 244-A do ECA, que trata de recebimento de qualquer vantagem para criança ou adolescente se submeter a prostituição ou exploração sexual. A pena para este crime é de quatro a dez anos de reclusão, além de pagamento de multa.

“Caso seja confirmado que o menor foi abusado, iremos pedir mandado de prisão preventiva [contra os pais] e a guarda provisória da criança ficará a cargo do Conselho Tutelar, que definirá se algum familiar dele terá condições de ser o responsável. A criança é franzina, tem corpo de nove, dez anos, mas tem 13 anos”, contou o delegado.

O garoto e os pais foram localizados na tarde desta terça-feira (3). O promotor de Justiça Paulo Rubens Parente, da comarca de Altos, e o Conselho Tutelar acompanharam os depoimentos. A situação da guarda da criança vai ser definida em uma reunião nesta quarta-feira (4) entre o Ministério Público, Policia Civil e Conselho Tutelar, que deverá apresentar um relatório sobre o ocorrido.

Criança já havia dormido em cela, diz MP

O menino foi encontrado debaixo de uma cama do alojamento 1 da Colônia Agrícola Major César de Oliveira com um preso que cumpre pena por estupro de vulnerável. José de Ribamar Pereira Lima, 52, está preso pelo estupro de duas crianças em 2008 e 2009 na cidade de Amarante (PI) e Aroazes (PI). Ele estava preso na penitenciária de Picos, quando, em 2015, conseguiu progressão de pena e está no semiaberto na colônia agrícola.

O pai do menino, Gilmar Francisco Gomes, 49, é ex-presidiário e cumpre pena em liberdade por estupro de uma criança ocorrido em 2012 no município de Alto Longá. Ele conheceu José de Ribamar Pereira Lima quando cumpria pena na Major César. Segundo o Ministério Público, a criança já dormiu em uma cela da colônia agrícola quando o pai estava recluso.

“Lamentavelmente, casos como este de uma criança dormir numa cela já ocorreram outras vezes na colônia agrícola. O menino dormiu com o pai quando ele estava preso. Percebemos que precisa de imediato maior fiscalização na penitenciária. Há carência enorme de material humano esse quadro facilita situações como esta”, disse o promotor.

Ainda nesta tarde, o promotor Paulo Rubens Parente inspecionou as instalações da colônia agrícola para analisar como ocorreu a entrada da criança dentro da unidade prisional. O MP informou que só poderá detalhar as medidas que deverão ser tomadas para preservar o menino quando forem finalizadas algumas diligências e ocorrer a reunião com a equipe multidisciplinar nesta quarta-feira (4).

Contradições em depoimentos

O pai disse à polícia que o menino pediu para dormir na unidade prisional, e que os pais deixaram porque, no dia seguinte, a mulher dele iria levar roupas que lavou do preso --e assim pegariam o menino.

Já o menino e a mãe dele afirmaram que o pai insistiu para que ele ficasse na colônia agrícola. A mulher disse desconhecer que o homem, amigo do marido, cumprisse pena por estupro.

Já o detento afirmou ignorar que o menino fosse dormir na cadeia, apesar de os pais da criança terem ido embora à noite. Ele negou que tenha abusado do adolescente.

Erros

O delegado Jarbas Lima criticou o trabalho inicial da polícia realizado na Central de Flagrantes de Teresina, quando o caso foi descoberto e os envolvidos, conduzidos à delegacia.

O delegado plantonista, que não teve o nome informado, não colheu depoimento de nenhum dos envolvidos e liberou o menino para ir para casa com os pais. Após exame, o IML (Instituto Médico Legal) de Teresina descartou que a criança tenha sido submetida a conjunção carnal.

 

“Mesmo com o exame de conjunção carnal dando negativo não significa que a criança não foi abusada sexualmente. O ato libidinoso vai depender do termo de declaração do menor. Ele pode ter tido as partes íntimas tocadas ou ainda ter sido obrigada a fazer sexo oral e nada disso é comprovado no exame do IML. Era para quem recebeu o caso na Central de Flagrantes ter colhido depoimento dos envolvidos para que nenhuma informação fosse perdida”, reclamou o delegado.

O diretor do Sinpoljuspi (Sindicato dos Agentes Penitenciários do Piauí), José Roberto Pereira, contou que agentes penitenciários desconfiaram que tinha um visitante dentro da unidade prisional após o término do horário de visita, depois que compararam o número de pessoas que entraram com o número de saída. Agentes penitenciários fizeram revistas em todos os alojamentos e descobriram o menino embaixo da cama, usando apenas um short.

O menor de idade, o preso e os pais dele foram conduzidos para a delegacia de Altos, mas o prédio estava fechado por ser fim de semana. O caso foi remetido para Central de Flagrantes de Teresina, que direcionou o menino para o IML. Como o exame deu negativo, foram liberados o detento, os agentes, os pais e o adolescente.

A Polícia Civil tem 30 dias para investigar e concluir o inquérito, que será remetido ao Ministério Público. Caso haja consistência na denúncia, o MP remeterá o caso à Justiça.

O UOL entrou em contato com a Vara de Execuções Penais de Teresina para localizar o juiz Vidal de Freitas, responsável pelos presídios do Estado, e foi informado que o magistrado está em férias. O TJPI (Tribunal de Justiça do Piauí) não designou substituto para comentar o assunto.

A Secretaria de Justiça do Piauí informou que abriu sindicância para investigar em que circunstâncias a criança foi deixada na unidade, bem como apontar responsáveis pelo ocorrido. Os trabalhos devem ser concluídos em até 30 dias. A comissão de sindicância foi designada pelo gabinete do secretário, por meio da Portaria nº 062/17, nesta segunda-feira (2).