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"Precisamos ficar mais alertas aos sinais que nossos filhos nos dão", diz mãe de colega de atirador

Arma era da mãe e estava escondida em casa, diz polícia

UOL Notícias

Luciana Amaral

Do UOL, em Goiânia

21/10/2017 11h27

Mãe de um colega de sala do atirador que matou dois estudantes em uma escola em Goiânia, na sexta-feira (20), a funcionária pública Luciana Teixeira afirmou ao UOL que não condena o autor dos disparos, por se tratar de um adolescente. Aliviada pelo fato de o filho ter escapado ileso da tragédia, Luciana disse ainda que os fatos ocorridos no colégio Goyases deixam uma lição para pais e mães: "Só fica o alerta de que precisamos ficar mais alertas aos sinais que nossos filhos nos dão."

Teixiera afirmou que o filho estava em sala de aula no momento em que o atirador, um adolescente de 14 anos, abriu fogo contra os colegas. Ele só teria escapado, segundo relato da mãe, porque estava perto da porta, tirando dúvidas sobre um projeto de ciências de uma mostra que aconteceria neste sábado (21). Dessa forma, o jovem conseguiu fugir rapidamente ao escutar o som do primeiro disparo.

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“Ele [o atirador] estudou com meu filho desde o jardim de infância. Muitos alunos estudam juntos desde o jardim. [...] [Meu filho] Escutou aquele barulho e, quando olhou, o menino estava com a arma na mão. Tinha dado um tiro no teto e viu dando outro no chão. Meu filho só saiu correndo da sala, mas ouviu os outros tiros, os gritos. Foi muito chocante."

Apesar do trauma, Luciana disse ponderar o fato de que o atirador, que foi apreendido pela polícia após o crime, tem a mesma idade de seu filho. "A gente não pode condenar. A gente não sabe o que passa na cabeça dessa criança", declarou ela.

Leonardo Calembo (camisa lilás), pai de João Pedro, é consolado durante o velório do filho - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
Leonardo Calembo (camisa lilás), pai de João Pedro, é consolado durante o velório do filho
Imagem: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

De acordo com o delegado que investiga o caso, Luis Gonzaga Júnior, o autor dos disparos queria se vingar pelo fato de ter sido vítima de constante de bullying na relação com colegas de sala de aula.

Luciana contou que o filho sempre costuma sentar em um cantinho da sala, mas não estava lá no momento em que o adolescente de 14 anos decidiu abrir fogo. “Agradeço a Deus pelo meu filho, Deus deu um livramento. Ele costuma sentar lá no fundo num cantinho, mas não estava lá na hora. Mas peço a Deus pelas famílias que perderam seus filhos, a do garoto. Sei que estão sofrendo demais também."

A funcionária pública elogiou a escola e disse que a base educacional é boa e que todos os funcionários são atenciosos. Para ela, o ocorrido foi uma “fatalidade”. A coordenadora que impediu que o atirador fizesse mais vítimas e se matasse é considerada rigorosa pelos alunos, mas, ao mesmo tempo, muito querida e respeitada. Nas palavras de Luciana, “excepcional” e “exemplar”.

Sobre o bullying supostamente praticado contra o atirador, Luciana afirmou não saber ao certo, mas falou que uma vez presenciou um grupo de meninos chamando-o de "fedido".

20.out.2017 - Mulher é consolada do lado de fora da escola particular Colégio Goyases, em Goiânia (GO), onde dois estudantes foram mortos e outros quatro ficaram feridos em um atentado a tiros no final da manhã desta sexta-feira, 20. O tenente-coronel Marcelo Granja, assessor de comunicação da Polícia Militar de Goiás (PM-GO), confirmou que o autor dos disparos, um adolescente de 14 anos, é filho de um Policial Militar. A arma usada, segundo Granja, é da Polícia Militar - CRISTIANO BORGES/O POPULAR/ESTADÃO CONTEÚDO  - CRISTIANO BORGES/O POPULAR/ESTADÃO CONTEÚDO
Mulher é consolada do lado de fora do Colégio Goyases, em Goiânia
Imagem: CRISTIANO BORGES/O POPULAR/ESTADÃO CONTEÚDO

Crime deixou dois mortos e quatro feridos

Os mortos na ação foram os meninos João Pedro Calembo e João Vitor Gomes, enterrados na manhã deste sábado (21). Quatro adolescentes feridos permaneciam internados na manhã de sábado: L.F.B., 14; Y.M.B., 13; I.M.S., 14; e M.R.M., 13. Uma adolescente de 13 anos estava em coma induzido, estado considerado gravíssimo, no Hugo (Hospital de Urgências de Goiânia). Outras duas vítimas, um garoto e uma garota, também de 13 anos, estão em estado estável, segundo o diretor técnico do Hugo, Ricardo Furtado. A quarta vítima está internada no Hospital dos Acidentados.

O colégio Goyases, onde ocorreu o ataque, fica a cerca de sete quilômetros da região central de Goiânia. O estabelecimento atende a alunos da educação infantil e do ensino fundamental (1º ao 9º ano).

Inspiração em Columbine e Realengo

O jovem atirador que matou dois colegas relatou, em depoimento à polícia, que buscou inspiração nos nos tiroteios de Columbine, nos Estados Unidos, e de Realengo, no Rio de Janeiro. A informação foi dada pelo delegado Luis Gonzaga Júnior.

“O adolescente agiu motivado por um bullying que ele sofria de outro adolescente. Segundo informação do próprio adolescente, ele se inspirou em duas tragédias. Uma tragédia que aconteceu [em 1999] nos Estados Unidos, no colégio Columbine, e outra [em 2011] no Realengo, aqui no Brasil. Dessa inspiração fez nascer a ideia nele de matar alguém. Depois, motivado por esse bullying que ele sentia e sofria por parte de um dos seus colegas, ele resolveu executar e matar pessoas”, disse o policial.

Ele relatou em depoimento que tinha como alvo um dos dois jovens que morreram, que o "amolava muito", sem especificar como era a perseguição. “[Ele matou] primeiro esse colega e, depois, segundo ele, teve vontade de matar mais. No momento da execução ele falou para todo mundo: ‘Vocês vão todos morrer’”, acrescentou o delegado.

O delegado disse à imprensa, entretanto, que o adolescente não relatou, em seu depoimento, já ter feito alguma reclamação à escola sobre ser vítima de bullying. Funcionários do colégio também afirmaram à polícia que não havia registro de bullying em relação ao jovem que cometeu o crime.

O atirador contou ainda também que já passou por acompanhamento psicológico, o que foi confirmado por seu pai, mas nenhum dos dois deu detalhes do que se tratava e o que o motivou, segundo Gonzaga, da Depai (Delegacia de Polícia de Apuração de Atos Infracionais).

Questionado se o adolescente esboçou algum sentimento de culpa, Gonzaga disse que ele não chegou a falar a palavra "desculpas", mas, pela feição, aparentava estar arrependido "com certeza".