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Chefe da Guarda Civil de SP diz que bairro é só um dos fatores que influenciam abordagens policiais

08.nov.2017 - Comandante geral da GCM da capital paulista, Adelson de Souza - Luís Adorno/UOL
08.nov.2017 - Comandante geral da GCM da capital paulista, Adelson de Souza Imagem: Luís Adorno/UOL

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

08/11/2017 14h44

Em um debate sobre como as autoridades policiais devem se dirigir às pessoas nas ruas, o comandante geral da GCM (Guarda Civil Metropolitana) de São Paulo, Adelson de Souza, disse que "cada abordagem é diferente" -- e o local da cidade onde ela acontece não pode ser determinante para uma ação policial diferenciada.

Esse tema foi objeto de grande repercussão após uma entrevista do comandante da Rota, Ricardo de Mello Araújo, ao UOL em agosto. 

Na entrevista, o comandante havia dito que os policiais militares que atuam na região nobre e na periferia de São Paulo adotam formas diferentes de abordar e falar com moradores. "É uma outra realidade. São pessoas diferentes que transitam por lá. A forma dele abordar tem que ser diferente. Se ele [policial] for abordar uma pessoa [na periferia], da mesma forma que ele for abordar uma pessoa aqui nos Jardins [região nobre de São Paulo], ele vai ter dificuldade. Ele não vai ser respeitado", afirmou o comandante Mello Araújo.

Vereadores organizaram a audiência pública na Câmara para tentar ouvi-lo sobre o tema, mas ele não compareceu. A Secretaria da Segurança Pública disse que o comandante da Rota, e outras autoridades da cúpula da polícia não puderam comparecer por incompatibilidade de agenda.

O comandante geral da GCM foi ao evento e disse que avalia de forma diferente o assunto. "Correndo o risco de ir na contramão [do que afirmou Mello Araújo], complementando o que ele disse, cada abordagem é única. Existem padrões que devem ser seguidos, na PM, Polícia Civil e GCM, mas cada abordagem é única e depende de inúmeros fatores", afirmou.

Ainda de acordo com Souza, a abordagem policial não é algo simples de definir. "É extremamente complexa. O crime, de modo genérico, é baseado em cima de três pilares: autor, vítima e ambiente", disse. Segundo ele, o padrão de abordagem "é aquele que respeita a dignidade humana. Qualquer ação que seja contrária, [vocês ]nos ajudam quando nos informam. É a oportunidade de corrigir", complementou.

Morador de um bairro periférico da zona leste de São Paulo e negro, Souza admitiu que "talvez o comandante [da Rota] tenha sido duro demais [no que disse na entrevista]". Com repercussão negativa na periferia, Souza entende que a "indignação é válida e legal".

Neste ano, porém, a GCM também foi alvo de polêmica. Abordagens da guarda contra usuários de drogas na Cracolândia em setembro foram consideradas abusivas pela Defensoria Pública. Em maio, um guarda foi filmado agredindo um morador de rua que resistiu à apreensão de seus pertences pela prefeitura.

Relembre a entrevista do comandante da Rota

UOL Notícias

Debate em audiência pública

O vereador Alfredinho (PT), da comissão de segurança, que iniciou o debate, afirmou entender que "foi uma declaração muito forte, polêmica" do comandante da Rota. Por isso, o vereador afirmou que fez o requerimento por entender que "a PM e a GCM (Guarda Civil Metropolitana) têm de ter um relacionamento com a comunidade por igual, sem nenhum tipo de recriminação".

Já o vereador Fernando Holiday (DEM), presidente da comissão da criança e adolescente, disse que "é muito fácil criticar o trabalho daqueles que na maioria das vezes, também vive na periferia, ganha mal e sofre com falta de estrutura". Para o vereador, é necessário reconhecer o trabalho do bom policial. "Se não fosse por esses policiais, carreira mais do que perigosa, o que seria de nós, que já sofremos com mais de 60 mil homicídios por ano?", questionou. Cinco minutos depois, ele deixou a audiência. Ele não se posicionou sobre a entrevista em si.

Além do comandante da Rota, foram chamados para a audiência o secretário da Segurança Pública, Mágino Alves Barbosa Filho, o comandante da PM, o coronel Nivaldo Cesar Restivo, o secretário de Segurança Urbana, coronel José Roberto Rodrigues de Oliveira e um organizador da Marcha da Consciência Negra. Nenhum era obrigado a comparecer. Nenhum deles compareceu.

A assessoria de imprensa da PM chegou a afirmar na ocasião da entrevista do comandante da Rota que a fala dele foi infeliz e pediu que a entrevista fosse retirada do ar. Com a negativa, no fim do mesmo dia, em uma outra entrevista feita com o comandante pela comunicação social da PM, Mello Araújo tentou se justificar, dizendo que apenas a linguagem é diferente, dependendo de cada região da cidade.

O ouvidor da Polícia de São Paulo, Julio Cesar Fernandes Neves, cobrou publicamente "providências" do Estado após as declarações. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) minimizou: "ele já explicou o que tentava dizer".

Tiago Soares, do Movimento Negro (à esq.), vereador Alfredinho (PR) e o comandante da GCM Adelson de Souza (à dir.) - Luís Adorno/UOL - Luís Adorno/UOL
Tiago Soares, do Movimento Negro (à esq.), vereador Alfredinho (PT) e o comandante da GCM Adelson de Souza (à dir.) durante audiência pública sobre abordagem da Rota
Imagem: Luís Adorno/UOL