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PMs envolvidos em morte de estudante de 14 anos em Santo André (SP) são afastados

Segundo a família, Luan estava indo comprar bolachas quando foi morto pela PM - Arquivo pessoal
Segundo a família, Luan estava indo comprar bolachas quando foi morto pela PM Imagem: Arquivo pessoal

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

08/11/2017 15h00

Dois cabos da PM (Polícia Militar) que participaram da ocorrência que terminou na morte do estudante Luan Gabriel de Souza, 14, no domingo (5), em Santo André (Grande São Paulo), foram afastados dos serviços operacionais, segundo a SSP (Secretaria da Segurança Pública). Os policias afastados são: Adilson Antonio Senna de Oliveira e Alecio Jose de Souza, ambos de 39 anos.

De acordo com a SSP, "todas as circunstâncias dos fatos estão sendo apuradas no inquérito policial militar instaurado pelo 10º BPM/M e acompanhado pela Corregedoria da PM. Os policiais envolvidos foram afastados do serviço operacional. A investigação segue com o 2º DP de Santo André e testemunhas estão sendo ouvidas."

A reportagem ligou para o batalhão dos PMs envolvidos, mas não conseguiu localizar os policiais para que eles pudessem se defender. Em depoimento cedido à Polícia Civil, eles informaram que, ao chegar ao local dos fatos, foram recebidos a tiros por cerca de 15 jovens que estavam em uma viela do bairro Parque João Ramalho, e reagiram com três tiros.

"Durante abordagem, uma delas [das 15 pessoas] retirou uma arma e foi baleada. Dois adolescentes foram levados ao 2º DP (Distrito Policial) de Santo André, ouvidos e liberados. A Polícia Civil investiga o caso", informou a PM.

Ainda de acordo com relato dos PMs no distrito policial, havia uma moto roubada de um pátio do Detran na viela 7 da rua Paraúna e que dois jovens suspeitos de estarem desmontando a motocicleta foram levados à delegacia. Como o envolvimento com o crime não foi comprovado, eles foram liberados.

O estudante Luan de Souza morreu depois de ter sido atingido por um tiro na nuca durante a ação policial. O garoto foi enterrado na manhã desta terça-feira (7) sob forte comoção. A família contesta a versão dos PMs e diz que o garoto estava indo a um mercado comprar um pacote de bolacha quando foi baleado. 

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A família e testemunhas afirmam, ainda, que os PMs envolvidos debocharam da situação e que ameaçaram os moradores locais para não deporem contra a ação policial. Segundo a mãe de Luan, Maria Medina, 43, ele só foi comprar bolacha porque o almoço ia demorar para ficar pronto. "Quero Justiça. Meu filho não era bandido, era um menino de ouro", disse. "Vou até o fim da minha vida para provar a inocência dele", afirmou.

Maria Medina é consolada por amigos e familiares no cemitério Curuça, em Santo André - Luís Adorno/UOL - Luís Adorno/UOL
Maria Medina, mãe de Luan, é consolada por amigos e familiares durante o enterro
Imagem: Luís Adorno/UOL

Uma tia do jovem, a florista Maria do Carmo Rodrigues, 56, disse que Luan estava no 9º ano do ensino fundamental e tinha o sonho de cursar medicina. "O policial que fez isso também é filho de Deus. E Deus vai tocar no coração dele para mostrar que ele tirou a vida de um inocente. A Justiça de Deus não falha", afirmou.

Luan tinha dois irmãos. Uma menina, de 2 anos, e o irmão mais velho, o ambulante Lucas Nogueira, 23, que disse que foi duas vezes à delegacia, mas, lá, o delegado não quis ouvir a versão da família porque "a versão dos PMs bastava" e que o boletim de ocorrência foi negado a ele.

Procurado, o ouvidor da Polícia de São Paulo, Julio Cesar Neves, afirmou que o delegado, como autoridade policial, pode decidir ouvir ou não a testemunha. "No entanto, o garoto foi morto com um tiro na nuca. Não ouvir muitas pessoas, pode parecer falta de interesse em investigar", disse.

Neves afirmou que enviou um ofício à Corregedoria da Polícia Civil para que o delegado explique por que decidiu não ouvir a família e ao MP (Ministério Público) para que o órgão acompanhe a investigação.

Dois jovens que estavam na rua quando ocorreu a ação policial afirmaram ter sido ameaçados pelos PMs. Eles pediram para não ser identificados por medo de represália. "Chegaram correndo e deram um tiro para cima. Depois, mais dois em direção da gente. Aí pegou o Luan", disse ao UOL.

"Me pegaram pelo colarinho [da camiseta], ameaçaram quebrar a minha cara, caso eu colocasse a culpa neles [policiais]", afirmou. O jovem diz ter sido ameaçado na frente da mãe e de amigos, que teriam interferido na abordagem até ele ser largado pelo PM.

O advogado Ariel de Castro Alves, membro do Condepe (Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) presta apoio à família. "Moradores viram PMs tirarem o corpo do lugar, para colocá-lo próximo de uma moto furtada. Uma testemunha viu o PM sair dando risadas e dizendo 'subiu mais um', com referência à morte do Luan", disse.

Ainda de acordo com o conselheiro, os jovens que tentaram retornar depois para prestar socorro ao estudante foram ameaçados e expulsos pelos PMs. "Não deixaram a mãe e o irmão ver o corpo. Eles só ficaram sabendo que era o Luan pelos relatos das testemunhas. PMs mandaram a mãe calar a boca e ir para casa", afirmou Alves.

"Eu só reconheci pelo tênis. Os PMs disseram que não era meu filho e me mandaram ir embora", disse a mãe.