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MP abre investigação sobre reparo de semáforos e cobra de Doria lista de doadores à Prefeitura

A capital paulista enfrentou uma série de problemas com semáforos ao longo de 2017 - Luiz Claudio Barbosa/Futura Press
A capital paulista enfrentou uma série de problemas com semáforos ao longo de 2017 Imagem: Luiz Claudio Barbosa/Futura Press

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

13/11/2017 18h23Atualizada em 13/11/2017 19h20

O Ministério Público Estadual instaurou inquérito para apurar se houve fraude em dois pregões eletrônicos feitos pela Prefeitura de São Paulo, por meio da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), para contratação dos serviços de manutenção de semáforos na cidade. A iniciativa é da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, que atendeu pedido protocolado pelo diretório municipal do PT e pela bancada petista na Câmara de Vereadores.

No ofício de instauração do inquérito, com data do último dia 27, o promotor Silvio Marques requereu à Prefeitura de São Paulo e às empresas Meng Engenharia, Comércio e Indústria Ltda. e Arc Comércio Construções e Administração Ltda., que participaram dos pregões, que se manifestassem sobre as supostas irregularidades.

No caso do prefeito João Doria (PSDB), o MP cobrou também cópias dos dois pregões e uma lista nominal de empresas que realizaram doações à Prefeitura, bem como “quais delas se sagraram vencedoras de certames no corrente ano”. Tanto as empresas quanto Doria têem 15 dias de prazo para a resposta.

Marques acolheu os argumentos do PT para embasar a abertura da investigação. Entre eles, por exemplo, estão as declarações do ex-governador e recém-empossado presidente interino do PSDB, Alberto Goldman, que, em vídeo com críticas a Doria, mês passado, acusou o correligionário de direcionamento nas licitações municipais para beneficiar empresas e de "falta de comprometimento com a cidade". Na ocasião, Doria elevou o tom contra Goldman e o chamou de “um improdutivo, um fracassado” que “vive de pijamas na sua casa”.

Dias depois, entretanto, Goldman se desculpou, em post em seu blog: "Baseado em observações pessoais e em decisões do Tribunal de Contas do Município eu disse que todas as licitações da atual administração eram dirigidas, com editais que já pré determinam as empresas que vão ganhar. Cometi o equívoco ao usar a expressão todas". Goldman afirmou, porém, que "em alguns casos" parece que houve direcionamento. "Mas não tenho elementos suficientes para afirmá-lo sem margem de erro. Além disso a simples impugnação do TCM não é suficiente para confirmar o direcionamento", escreveu ele.

Outro argumento destacado pelo promotor de Justiça foi o fato de uma terceira empresa participante da licitação para a manutenção semafórica, a austríaca Kapsch Trafficom, ter apresentado proposta mais vantajosa e, mesmo assim, ter sido “desclassificada em circunstâncias que, supostamente, sugerem irregularidades” –ao ponto de o próprio Tribunal de Justiça de São Paulo ter concedido a ela liminar que apontou “violação da isonomia e direcionamento concorrencial”.

Dúvidas sobre doações de empresas

No pedido ao MP, o PT destacou ainda que as duas empresas vencedoras do certame questionado judicialmente pela Kapsch teriam sido “indevidamente beneficiadas no processo licitatório por terem sido doadoras de serviços à Prefeitura de São Paulo no período de janeiro a março do corrente ano, quando estenderam a garantia de seus serviços de consertos em semáforos defeituosos, bem como, quando da troca de placas e da sinalização que indicavam a velocidade máxima das pistas das marginais Pinheiros e Tietê.”

“A pergunta que tem sido repetida à exaustão, desde que o prefeito passou a propalar a ideia de que consegue gerir a cidade com desinteressadas doações empresariais, é: haverá algum benefício financeiro futuro às empresas que tenham aderido ao programa de doações do prefeito? O que se vê agora são duas empresas doadoras sendo beneficiadas em um procedimento licitatório sub júdice”, diz o PT.

Para o presidente do diretório municipal do partido, Paulo Fiorilo, a decisão do MP de abrir a investigação “pode ajudar a colocar luz nas doações que empresas fazem à Prefeitura, e nos benefícios que elas podem receber”. “A fala do agora presidente nacional do PSDB naquele vídeo do mês passado levantou uma questão gravíssima sobre o direcionamento das licitações. É preciso agora a Promotoria apurar se houve algum dolo ou algum dano à cidade, porque a desistência de uma empresa com uma proposta melhor, mas desclassificada, deixou claro que havia alguma irregularidade”, disse, para concluir: “Esse governo deixa muita dúvida entre o público e privado.”

Outro lado

Em nota, a CET informou que prestará todos os esclarecimentos necessários ao MP.

"A CET ressalta que os pregões seguiram rigorosamente os trâmites previstos na Lei de Licitações. As doações foram feitas de acordo com a legislação e obedeceram a chamamento público aberto a todo o mercado. Duas empresas que fizeram doações este ano participaram do pregão dos semáforos e não obtiveram vitória no certame", diz o comunicado.

Entenda o caso

No começo de outubro, a gestão Doria conseguiu retomar os contratos de manutenção de semáforos de parte da cidade que estavam suspensos desde 19 de setembro. Isso porque a empresa austríaca Kapsch --líder do consórcio SP Manutenção Semafórica -- desistiu de avançar com o processo na Justiça, mesmo após ter conseguido nela duas vitórias seguidas e o reconhecimento judicial de que o contrato firmado entre a gestão Doria e os prestadores de serviço no setor tinham indícios de ilicitudes e direcionamento na concorrência.

No processo, a multinacional alegou ter tido informações de que mais de 50% do contrato já havia sido executado e que, por isso, não interessava mais, comercialmente, o prosseguimento na disputa judicial. Com a decisão, a CET reativou dois dos três contratos que estavam suspensos (lotes 1 e 3) e que tinham como objetivo manter funcionando os semáforos da cidade.

À época, à Folha, a empresa disse ter havido excesso de rigor na análise de seus documentos e negligência com os das vencedoras da disputa. A multinacional foi inabilitada por apresentar uma certidão do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia com capital social desatualizado. Para a empresa, trata-se de detalhe não relacionado ao papel do Crea de atestar tecnicamente sua habilitação para os serviços. Para a CET, a desatualização foi motivo para retirá-la da disputa.

No TJ, em uma primeira análise sobre o assunto, o desembargador Marcelo Semer argumentou que o atraso na contratação foi "aparentemente criado pelo próprio ente público" e que a demora do pregão, por problemas anteriores da própria administração, "não pode representar um salvo-conduto para eventual direcionamento concorrencial".

Dividida em três lotes, a licitação de R$ 40,5 milhões foi vencida pelas empresas que prestavam os serviços até os últimos meses de 2016. Algumas fizeram doações à gestão Doria, como a troca das placas de sinalização de velocidades das marginais e a extensão de garantias não previstas no contrato anterior. A CET e as empresas afirmam que as doações foram feitas de forma transparente.