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Quem tem epilepsia pode dirigir, mas lei estabelece regras específicas

Motorista que atropelou 18 pessoas em Copacabana alegou ter passado por uma crise de epilepsia - Vanessa Ataliba/Brazil Photo Press
Motorista que atropelou 18 pessoas em Copacabana alegou ter passado por uma crise de epilepsia Imagem: Vanessa Ataliba/Brazil Photo Press

Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

19/01/2018 15h48

Uma suposta crise de epilepsia teria sido a razão para um brusco movimento que levou o motorista Antônio de Almeida Anaquin, 41, a atropelar 18 pessoas e matar um bebê no calçadão de Copacabana, na noite desta quinta-feira (18), no Rio. Esse foi o argumento utilizado pelo próprio motorista e por uma mulher que estava com ele no carro e se tornou testemunha-chave do caso. Frascos de medicamentos para o tratamento da doença foram encontrados dentro do veículo.

Apesar do acidente, ter epilepsia não está entre as restrições da legislação brasileira para que se tire a CNH (Carteira Nacional de Habilitação). A lei, porém, estabelece uma série de condições a pessoas portadoras da doença para que a licença seja concedida pelos departamentos de trânsito dos Estados e Distrito Federal.

Quem tem diagnóstico positivo para epilepsia precisa informar a sua condição no exame de aptidão física e mental a que é submetido durante o processo para tirar ou renovar a CNH. No exame, o médico perito pede que o candidato a condutor preencha um questionário; entre os itens, um deles questiona se a pessoa tem epilepsia.

“É imprescindível que pessoas com epilepsia informem sua condição, que busquem o Detran, que tenham sua situação regularizada”, afirma Maria Luiza Manreza, coordenadora do departamento científico de Epilepsia da ABN (Academia Brasileira de Neurologia).

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Após declarar no formulário sua condição, o candidato precisa apresentar um relatório do médico que o acompanha informando os detalhes das crises e da doença. “Dessa forma, de posse das informações prestadas pelo candidato a condutor e do relatório do médico assistente, o médico perito terá condições de julgar se o candidato está apto ou inapto a conduzir com segurança”, esclareceu o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) em nota enviada ao UOL.

O Denatran estabelece regras específicas para pacientes que tenham declarado epilepsia, estejam ou não sendo medicados para a doença.

Pessoas que tomem remédio precisam atestar essa condição no formulário e apresentar relatório médico comprovando que não tenham passado por crises há pelo menos um ano. “O médico tem que achar a medicação certa para ele e ter a certeza que ele toma a medicação. Ao assinar a carta a ser entregue ao Detran, o médico também se responsabiliza pela condição do seu paciente”, afirma.

No caso de quem não toma ou está deixando de tomar a medicação, o período sem crise a ser informado pelo médico assistente ao perito é de ao menos dois anos.

Além disso, a validade da CNH pode ter um período mais curto em comparação aos demais condutores. “Esse prazo pode ser diminuído a critério do médico perito”, informa a nota.

Câmera de quiosque registra acidente em Copacabana

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Condutor pode responder por falsidade ideológica

No caso de Anaquim, o Detran-RJ informou que ele negou ter “qualquer doença neurológica”, inclusive epilepsia, ao ser submetido ao exame de validação da CNH. O que pode fazer com que ele também responda criminalmente por falsidade ideológica.

“Quando ele falta com a verdade ao preencher o formulário, ele pode também responder por falsidade ideológica, além de homicídio e lesão corporal culposos. Além disso, dirigir com a habilitação suspensa também é crime”, explica João Paulo Martinelli, criminalista e professor de direito penal e econômico do IDP (Instituto de Direito Público) de São Paulo. Ainda segundo ele, as penas podem chegar até cinco anos de reclusão.

Segundo Manreza, é informando sobre a epilepsia e apresentando todos os documentos requisitados pelo Detran que o condutor com essa condição fica resguardado em caso de se envolver em um acidente.

“Muitos pacientes não mencionam, mas a gente [neurologistas] fala que não pode, que tem que informar, tem que ser responsável. É informando que ele se protege e ajuda a diminuir o estigma que existe em relação à doença. Queremos que ele tenha uma vida mais normal possível, mas ele precisa saber que existem limitações e responsabilidades por parte do médico e do paciente”, afirma.

Crises vão além de convulsão

A coordenadora do departamento científico de Epilepsia da ABN (Academia Brasileira de Neurologia) esclarece que as crises epiléticas não se restringem às convulsões. “Epilepsia é uma doença variável. Existem vários tipos de crise, que vão desde as convulsivas, até as de ausência, os lapsos de interação com o meio, pode ter alteração apenas em uma parte do corpo”, esclarece Manreza.

As crises costumam durar alguns minutos e, depois que passam, o paciente pode não se lembrar do que aconteceu. Algumas pessoas ficam ausentes, com o olhar fixo, outras aparentam ter tomado um pequeno susto. O tipo mais conhecido, no entanto, é aquele em que a pessoa se contorce, faz movimentos involuntários com o corpo, e às vezes chega a babar, urinar e vomitar.

Segundo a médica, com o uso da medicação, 70% dos pacientes conseguem controlar as crises.