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Eles também viram seus filhos morrer no trânsito; no PR, pedem justiça em júri de ex-deputado

Pais e mães de jovens mortos no trânsito por motoristas embriagados - Janaina Garcia/UOL
Pais e mães de jovens mortos no trânsito por motoristas embriagados Imagem: Janaina Garcia/UOL

Janaina Garcia

Do UOL, em Curitiba

28/02/2018 13h08Atualizada em 28/02/2018 14h59

Pais e mães de jovens mortos no trânsito por ação de condutores embriagados compareceram ao Tribunal do Júri de Curitiba nesta quarta-feira (28) para manifestar apoio às mães de Gilmar Yared e Carlos Murilo de Almeida –mortos em maio de 2009, aos 26 e 20 anos de idade. Dentro do tribunal, o ex-deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho é submetido desde ontem a um júri popular que decidirá hoje se ele é inocente ou culpado pelas duas mortes.

Carli Filho, 35, é acusado de duplo homicídio com dolo eventual por ter assumido o risco de morte ao dirigir:

  • em alta velocidade, entre 161 e 173 km, segundo a perícia
  • embriagado; ele havia consumido quatro garrafas de vinho antes do acidente
  • com a carteira de habilitação vencida; o documento acumulava 130 pontos e 30 multas, 23 delas por excesso de velocidade

Para os pais e mães que compareceram hoje ao tribunal onde Carli Filho é julgado, uma eventual condenação dele será uma espécie de justiça indireta por seus próprios mortos – nos casos dessas famílias, os condutores ainda foram a julgamento e respondem em liberdade.

“Meu filho havia ido buscar um lanche quando foi atingido em cheio pela camionete em alta velocidade de um homem alcoolizado. Deixou três filhos e minha nora grávida do quarto – o motorista está solto e nunca foi julgado”, disse Terezinha de Fátima, de Colombo (região metropolitana de Curitiba). O filho dela, o motoboy Jeferson Queiroz de Araújo, tinha 27 anos quando morreu no acidente, em abril de 2005. “Para mim, é tudo hoje esse julgamento. É a justiça que eu não tive”, desabafou.

Auxiliar administrativa em um instituto voltado a mães que perderam filhos no trânsito criado pela agora deputada federal Christiane Yared (PR-PR), mãe de uma das vítimas do acidente com Carli Filho, Rose Mari Carriel de Lima, 52, perdeu o filho em dezembro de 2008. No acidente, ocorrido na Linha Verde – uma das vias expressas de Curitiba –, Robson Eduardo Carriel de Lima, morreu aos 21 anos depois que o condutor do veículo em que ele estava de carona perdeu o controle e bateu. O motorista, que é filho de um policial e tinha bebido, está solto, segundo ela.

Com cartazes, familiares de vítimas pedem justiça durante sessão do júri - Giuliano Gomes/Estadão Conteúdo - Giuliano Gomes/Estadão Conteúdo
Para os pais das vítimas, uma condenação de Carli Filho será uma espécie de justiça indireta por seus próprios mortos
Imagem: Giuliano Gomes/Estadão Conteúdo

“A legislação de trânsito precisa ser mudada para punir de um jeito mais exemplar quem bebe e dirige, mas acredito que uma condenação do ex-deputado pode ser exemplo para outros –isso ajuda a dar, também a casos como o meu, alguma sensação de justiça. Quem mata assim nunca mais deveria pegar uma carteira de habilitação novamente”, defendeu Rose Mari.

Também presente no protesto, o comerciante Henrique Zanetti, 44, disse que não quer que outros pais e mães passem pela mesma situação vivida por ele. “Nossa justiça, infelizmente, é muito lenta.” Zanetti perdeu o filho no Réveillon do ano passado em um acidente em Itapoá, litoral catarinense. Marlos Zanetti, 19, morreu quando um condutor embriagado bateu de frente no carro em que ele estava. “É importante a simbologia de um ex-deputado que matou, com álcool e direção misturados, ser condenado hoje. Esperamos essa resposta dos jurados”, disse.

Sentença deve sair hoje

A estimativa do juiz Daniel Avelar, que preside o júri, é que a sentença de Carli Filho seja proferida até o final da tarde. Desde as 9h30, é realizado o debate entre acusação e defesa; ontem, foram ouvidas sete testemunhas e tomado o interrogatório do réu –que assumiu a culpa pelo acidente, mas negou a intenção de matar. “Assumo a minha parcela de culpa. Eu sou culpado. Mas jamais tive a intenção”, disse. “Lembro disso todos os dias.”

A defesa do ex-deputado, que alega que os dois jovens teriam desrespeitado uma via preferencial, tentou evitar ou adiar o júri popular em 33 recursos em todas as instâncias do Judiciário nos últimos oito anos e nove meses. Caso seja condenado hoje, Carli Filho poderá recorrer em liberdade, já que é réu primário e não responde ao processo preso.