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Ratos, falta de energia e tesoura de jardim: condições precárias fazem MP interditar IML de João Pessoa

Sala de trabalho do Instituto de Polícia Científica da Paraíba - Divulgação/Sindicato dos PeritosOficiais do Estado da Paraíba
Sala de trabalho do Instituto de Polícia Científica da Paraíba Imagem: Divulgação/Sindicato dos PeritosOficiais do Estado da Paraíba

Valéria Sinésio

Colaboração para o UOL, em João Pessoa

07/03/2018 19h34Atualizada em 07/03/2018 19h36

Estrutura precária e falta de condições de trabalho causaram a interdição na tarde desta quarta-feira (7) do IPC (Instituto de Polícia Científica) da Paraíba, em João Pessoa, e a consequente suspensão dos serviços de necropsia.

A recomendação para a interrupção dos serviços foi feita nesta terça-feira (6) pelo MPT-PB (Ministério Público do Trabalho), após inspeção no local na semana passada.

Até que a situação seja regularizada pelo Governo do Estado, os corpos ficarão armazenados no núcleo de Campina Grande, a 130 quilômetros da capital. A distância dificulta a identificação dos cadáveres pelos familiares. A falta de necrópsia também deve impedir que os corpos sejam liberados para sepultamento. Em média, o instituto recebe seis corpos para análise por dia.

Segundo o presidente do Sindicato dos Peritos Oficiais do Estado da Paraíba, Hebert Bonson, as condições de trabalho no local são “degradantes”. “As condições precárias de funcionamento da sede, em João Pessoa, ferem o princípio da dignidade humana, tanto para os mortos e seus familiares como para os peritos”, afirma.

Segundo ele, para as necropsias dos corpos, os profissionais precisam usar serra e martelo de funilaria e tesoura de jardim. “É uma falta de respeito. Ninguém quer ver o filho, o pai ou a mãe sendo tratado dessa forma.”

Os problemas não param por aí: há câmaras frigoríficas quebradas e outras superlotadas. “São dois cadáveres por gaveta. Já teve dia de colocarmos três”, acrescenta Bonson. Os corpos amontoados nas câmaras, geralmente, são de mortos não identificados.

O presidente do sindicato também diz que o mau cheiro no setor de necropsia é insuportável. “Cadáveres em decomposição são necropsiados em uma área a céu aberto, porque, segundo Bonson, não há sala com exaustor. “Isso se faz necessário porque esse tipo de cadáver exala um gás altamente insalubre, mas não temos exaustor.”

Na inspeção, MPT também identificou a presença de vísceras na parte externa do Instituto de Medicina Legal, o que também implica riscos para a vizinhança. Outra irregularidade apontada foi a falta de gerador. Com isso, quando falta energia, as câmaras descongelam e líquidos dos corpos escorrem pelo local.

O procurador do Trabalho, Eduardo Varandas, responsável pela fiscalização, disse que, de zero a dez, o nível de gravidade é 9. “A interdição é, na verdade, o início da solução dos problemas”, afirmou. O procurador afirmou que vai solicitar laudos para verificar se há contaminação do lençol freático devido ao vazamento constante de líquidos cadavéricos do IML.

Em nota, a Secretaria de Estado da Segurança e da Defesa Social afirmou que entrou com um recurso administrativo no Ministério do Trabalho pedindo a suspensão da interdição “tendo em vista os danos causados à população, bem como à ordem e segurança pública estadual”.

7.mar.2018 - Instituto de Polícia Científica da Paraíba, em João Pessoa - Divulgação/Sindicato dos PeritosOficiais do Estado da Paraíba         - Divulgação/Sindicato dos PeritosOficiais do Estado da Paraíba
Imagem: Divulgação/Sindicato dos PeritosOficiais do Estado da Paraíba
Outros serviços também foram afetados

Com a interdição do IPC, também ficam comprometidos outros laboratórios essenciais para a construção de prova pericial. Um deles é o de DNA, indispensável nos casos de suspeita de crime sexual, por exemplo.

Segundo o MPT, são muitas as irregularidades encontradas nesse laboratório, inclusive a presença de ratos. Laboratórios de balística e de toxicologia também param. Apesar do problema, os peritos continuam a comparecer em cenas de crime quando solicitados, segundo o sindicato dos peritos.

O instituto também apresenta paredes mofadas, riscos de incêndio e falta de material de escritório. O sindicato disse que, não raro, os peritos tiveram que comprar o próprio material para continuar o trabalho, a exemplo das maletas levadas para as cenas de crime, copos descartáveis e até folha A4 para imprimir laudos.

Equipamentos modernos, de alta tecnologia, doados pelo Ministério da Justiça estão empacotados, sem uso. Alguns, inclusive, não foram instalados por risco de serem danificados devido à estrutura precária.

Em entrevista coletiva na manhã desta quarta-feira (7), o diretor do IPC afirmou que não haverá prestação de serviços, inclusive a confecção de documentos de identidade.

“Hoje temos uma demanda de 17 mil documentos de identidade confeccionados por mês e toda a estrutura necessária para isso fica dentro do instituto. Não há como termos uma solução paliativa. Estaremos presentes em locais de crime, mas nossos laboratórios estarão fechados”, disse Israel Aureliano, diretor da unidade.