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A última denúncia de Marielle: ativista relata ameaças de PMs de batalhão que mais mata no Rio

Coletivo Fala Akari
Imagem: Coletivo Fala Akari

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

17/03/2018 04h00

Portões quebrados, casas invadidas sem mandado, moradores fotografados, troca de tiros. Essa tem sido a realidade de moradores de Acari que denunciam a ação truculenta de policiais do 41º BPM (Irajá) na região. A bandeira contra ações violentas da polícia na favela da zona norte foi levantada por PSOL, Marielle Franco. A vereadora do PSOL foi assassinada na última quinta-feira, quatro dias depois de ajudar a denunciar os casos.

Segundo a moradora Buba Aguiar, integrante do coletivo Fala Akari, no último sábado (10), moradores foram ameaçados por PMs. Ela contou que as ações da polícia têm levado terror aos moradores com frequência.

“Eles andavam pelas ruas gritando que só iriam embora depois que matassem três ou quatro”, diz moradora de Acari

Buba diz que as incursões dos policiais passaram a ser mais frequentes em Acari após o decreto de intervenção federal na segurança do Rio, assinado pelo presidente Michel Temer (MDB).

Segundo ela, policiais adotaram o mesmo procedimento das Forças Armadas – de “fichar” moradores por meio de fotografia. Buba Aguiar, denuncia também que diversas ações ocorrem de forma extraoficial. “A operação acontece e quando a gente procura a PM, eles falam que não havia operação na região.”

De acordo com denúncias do coletivo “Fala Akari”, há duas semanas dois jovens foram mortos durante a presença da polícia na favela e os corpos foram abandonados no rio Acari. Esse episódio foi um dos denunciados pela vereadora no último final de semana.

“O 41° Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro está aterrorizando e violentando moradores de Acari. Nessa semana dois jovens foram mortos e jogados no valão”, escreveu a vereadora nas redes sociais neste fim de semana.

Buba conta que Marielle não esteve na favela e que a vereadora tomou ciência dos episódios através das denúncias do coletivo. “Por ela ser uma mulher da favela, envolvida com direitos humanos, abraçou a nossa causa e começou a ajudar dando visibilidade para o que estava ocorrendo”, diz Babu.

Dados do ISP (Instituto de Segurança Pública) indicam que nos últimos cinco anos, o 41º BPM registrou cerca de 450 mortes. Trata-se do maior índice de letalidade do Estado do Rio de Janeiro durante o período.

O 41º Batalhão foi criado pelo então secretário de Segurança Pública José Mariano Beltrame dentro do espaço da Ceasa (Centrais de Abastecimento do Estado do Rio) carioca em 2011, e herdou o policiamento de parte da área do 9º BPM, ficando responsável pelos bairros de Irajá, Pavuna, Vicente de Carvalho e Costa Barros, onde estão os complexos de favelas da Pedreira e Chapadão. Longe do mar e dos cartões postais do Rio, a área é uma das mais violentas da cidade com forte presença do tráfico e tiroteios diários.

Polícia apura denúncias

Procurada, a Polícia Militar do Rio de Janeiro disse que o comando do 41º BPM abriu um inquérito policial para apurar as denúncias dos moradores.

A corporação explicou também que no dia 5 de março a PM realizou uma operação em Acari e que o grupo de policiais foi recebido a tiros na localidade conhecida como “Fim do Mundo”. Na ação houve apreensão de um rádio transmissor, sete carregadores de pistola, 280 pinos de drogas e munições. Segundo a PM, não houve registros de mortos e/ou feridos. No entanto, diz a nota que no mesmo dia, o batalhão foi informado pelo Hospital de Acari que uma pessoa ferida deu entrada na unidade hospitalar, mas que não resistiu aos ferimentos e morreu. 

Segundo a nota, ainda na segunda-feira (5), o BPM de Irajá foi chamado para uma ocorrência de encontro de cadáver, na rua Padre Lima e que a Delegacia de Homicídios foi acionada.

Também procurada, a Polícia Civil do Rio não respondeu se foi realizada perícia na região.


Casos envolvendo o 41º BPM

Também são deste Batalhão os quatro policiais militares acusados de participar da chacina em Costa Barros, quando mais de cem tiros foram disparados e cinco jovens foram mortos. Também integravam este batalhão os PMs que faziam uma operação que terminou com a morte da estudante Maria Eduarda Alves da Conceição, de 13 anos, dentro da escola, em março do ano passado.

A aluna da rede pública bebia água em um bebedouro no intervalo de um treino no pátio da sua escola, em Acari, quando foi atingida por três tiros de fuzil: dois na cabeça e um no quadril. Os tiros atravessaram os muros do colégio.

A adolescente sonhava em ser jogadora de basquete e, desde que começara a treinar, passara a colecionar medalhas.