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Decano cita feminista e critica Damares: 5 frases do voto sobre homofobia

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

15/02/2019 04h01Atualizada em 15/02/2019 12h39

Membro mais antigo do STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Celso de Mello iniciou ontem a leitura de seu voto no julgamento sobre a criminalização da homofobia com declarações de impacto. Defendeu direitos dos LGBTs, disse que o Congresso foi "omisso", citou filósofa feminista e criticou uma ministra do governo Bolsonaro (PSL).

Apesar de não ter concluído seu voto, que será plenamente conhecido na quarta, o ministro teve seu discurso considerado como "histórico" pelos ministros Luís Roberto Barros e Cármen Lúcia. Ele é o relator de uma das duas ações que pedem que o STF reconheça o dever do Congresso de tornar a homofobia crime.

Veja alguns trechos:

1. Congresso omisso

Para o ministro, a Constituição Federal, ao determinar que "a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais", obrigou o Congresso Nacional a criar legislação que proteja minorias sociais como a população LGBT. 

Mas não foi o que se viu, segundo Celso de Mello. Para ele, o legislativo brasileiro tem sido omisso.

[Há] evidente e inconstitucional inércia estatal inteiramente imputável ao Congresso Nacional.

"Essa clara omissão normativa, que se acha objetivamente constatada na presente causa, revela-se lesiva ao texto da carta política [a Constituição] por que transgressora, por injustificável inação congressual, das cláusulas constitucionais de proteção penal previstas nos incisos 41 e 42 do artigo 5º da Lei Fundamental", disse Celso.

2. Ideologia de gênero

Em outro ponto de seu voto, Celso de Mello criticou o uso da expressão "ideologia de gênero", termo usado por segmentos religiosos para criticar a ideia da livre orientação sexual em contraponto à ideia de que o sexo biológico deve determinar o gênero e a orientação sexual.

Se algo aqui é ideológico, no sentido pejorativo, é a tese que defende que as pessoas nascem heterossexuais e cisgêneras e que por orientação sexual posteriormente passam a escolher alguma orientação sexual não heterossexual.

De acordo com os estudos de gênero, pessoas cisgêneros são as que se identificam com o sexo biológico - em oposição às pessoas transgêneros.

3. 'Meninos de azul, meninas de rosa'

O ministro também citou, em tom crítico, a frase da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, registrada durante comemoração pouco depois de tomar posse no cargo.

Na ocasião, ela disse: "Atenção, atenção. É uma nova era no Brasil. Menino veste azul e menina veste rosa".

Meninos vestem azul e meninas vestem rosa-- essa concepção de mundo impõe, notadamente em face dos integrantes da comunidade LGBT, uma inaceitável restrição às suas liberdades fundamentais, submetendo tais pessoas a um padrão existencial heteronormativo incompatível com a diversidade e o pluralismo que caracterizam uma sociedade democrática.

4. Feminista francesa

Para ilustrar seu raciocínio, Celso de Mello também citou uma frase famosa de uma filósofa feminista francesa:

É por isso que Simone de Beauvoir, em sua conhecida obra O Segundo Sexo, escrita em 1949 já manifestava sua percepção em torno da realidade de que sexo e gênero constituem expressões conceituais dotadas de significado e sentido próprios, sintetizando em uma fórmula tipicamente existencialista e fenomenológica, mas de caráter tendencialmente feminista, que: ninguém nasce mulher, torna-se mulher.

5. Críticas ao voto

No início do seu voto, o ministro disse acreditar que seria criticado por aqueles que ele chamou de "cultores da intolerância" e comparou as críticas à lista de livros proibidos pela Igreja Católica durante a Idade Média, o Index librorum prohibitorum, no termo em latim. 

Serei inevitavelmente incluído no índex mantido pelos cultores da intolerância, cujas mentes sombrias que rejeitam o pensamento crítico, que repudiam o direito ao dissenso, que ignoram o sentido democrático da alteridade e do pluralismo de ideias.

Celso de Mello diz que voto provocará críticas de 'intolerantes'

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