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Além da homofobia: interrupções no STF adiam julgamentos de direitos LGBT

DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO
Imagem: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

02/03/2019 04h00

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, encerrou há uma semana a sessão que julgava a criminalização da homofobia sem anunciar quando o tema voltará à pauta. Na prática, o ato de Toffoli suspendeu o julgamento do processo e não há definição sobre quando o tema voltará a ser julgado pelo Supremo.

Perguntado por jornalistas, Toffoli disse, sem precisar uma data, que o caso voltaria a ser julgado "provavelmente neste semestre". 

O julgamento foi suspenso quando já havia quatro votos favoráveis a reconhecer a obrigação do Congresso Nacional de uma lei que torne crime os atos de homofobia e para que, até que essa lei seja criada, seja aplicada a Lei de Racismo para punir a discriminação contra população LGBT.

Não é a primeira vez que o STF interrompe julgamentos adiando a definição sobre direitos da população LGBT. 

Além da questão da homofobia, outros dois processos estão parados por pedidos de vista dos ministros do Supremo: o julgamento sobre se transexuais podem usar o banheiro público correspondente ao gênero com o qual se identificam e sobre a proibição de que homens gays doem sangue. Os ministros que pediram vista, em 2015 e 2017, ainda não devolveram os processos para julgamento.

O pedido de vista serve para que o ministro possa analisar por mais tempo o processo antes de votar.

O Regimento Interno do STF estabelece que o processo deve ser devolvido para julgamento após duas sessões ordinárias, o que na rotina do Supremo significa quase sempre duas semanas. Mas, na prática, os ministros não seguem o prazo e os julgamentos costumam ficar suspensos indefinidamente após um pedido de vista. 

No caso da homofobia, não houve pedido de vista feito por Toffoli. Como cabe ao presidente do tribunal estabelecer a agenda de julgamentos, ele apenas usou dessa prerrogativa para suspender a análise da questão, sem deixar claro quando o tema será retomado.

Parada para ouvir a sociedade

Em novembro de 2015, o ministro Luiz Fux pediu vista do processo que trata do direito dos transexuais a utilizarem banheiros públicos destinados ao sexo com o qual eles se identificam socialmente. 

O julgamento foi interrompido quando os ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin já haviam votado favoravelmente à possibilidade. Os outros nove ministros, incluindo Fux, ainda não tinham votado. 

Em seu voto, o relator do processo no Supremo, ministro Luís Roberto Barroso, tratou como um "direito fundamental" que os transexuais sejam tratados de acordo com sua identidade assumida socialmente.

"O indivíduo nasceu e vai morrer assim. Vale dizer, nenhum tipo ou grau de repressão vai mudar a natureza das coisas. De modo que destratar uma pessoa por ser transexual, destratá-la por uma condição inata, é a mesma coisa que discriminar alguém por ser negro, ou por ser judeu, ou por ser mulher, ou por ser índio, ou por ser gay", afirmou o ministro. 

Fux justificou o pedido de vista argumentando que queria analisar o pensamento da sociedade sobre o tema. 

"Nos processos objetivos onde há desacordo moral razoável é preciso que nós tenhamos os ouvidos atentos ao que a sociedade pensa", disse. "Essa é uma questão que gravita em torno de um desacordo moral bastante razoável no seio da nossa sociedade", afirmou Fux.

Após Fux anunciar o pedido de vista, Barroso argumentou que os direitos das minorias devem ser protegidos, mesmo que não sejam aprovados pela maioria da sociedade. 

"Os direitos fundamentais funcionam como trunfos contra a maioria. Ou seja, não importa que a maioria esteja infeliz com isso, se há um direito fundamental ele deve prevalecer contra a maioria", disse Barroso.

Doação de sangue

Em outubro de 2017, o ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo que contesta a proibição a homens homossexuais de doar sangue. 

O julgamento foi suspenso quando havia quatro votos favoráveis a alterar as regras para permitir a doação de sangue por homossexuais: do relator, Edson Fachin, e dos ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux.

As regras gerais de doação de sangue são definidas pelo Ministério da Saúde e pela Anvisa

O Ministério considera "inapto" a doar sangue por um período de 12 meses "homens que tiveram relações sexuais com outros homens e/ou parceiras sexuais destes". Proibição semelhante consta na norma da Anvisa.

Em seu voto, o relator Edson Fachin defendeu que as regras que definem os parâmetros para doação de sangue devem criar restrições sobre condutas impostas igualmente a todos os candidatos a doador, e não eleger "grupos de risco" como proibidos à doação.