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Corregedorias apuram ação da PM com filho de Telhada que terminou em morte

Tenente Telhada, filho de deputado estadual, ao lado de policiais do COE - 02.mar.2019 - Reprodução/Facebook
Tenente Telhada, filho de deputado estadual, ao lado de policiais do COE Imagem: 02.mar.2019 - Reprodução/Facebook

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

05/03/2019 08h22

Resumo da notícia

  • Secretaria da Segurança informa que PMs e delegado são alvo de inquérito policial
  • Condepe aponta série de erros e cobra da Ouvidoria acompanhamento de apuração
  • Ouvidor solicitou laudos de local, balísticos e de necropsia, além de acompanhar caso
  • Tenente Telhada, alvo da Corregedoria, afirma que "providências serão tomadas"

As corregedorias da Polícia Militar e da Polícia Civil investigam se uma ação da PM na divisa Osasco, na Grande São Paulo, que terminou na morte de um suspeito, na manhã do último sábado (2), teve excesso ou algum ato ilegal por parte de policiais, segundo a SSP (Secretaria da Segurança Pública).

Entre os policiais envolvidos na ação, estava o tenente Rafael Henrique Cano Telhada, 32, filho do deputado estadual Paulo Telhada (PP-SP). Após participar da ação policial, ele comemorou o fato de o suspeito ter morrido, ao escrever, em redes sociais que "a caveira sorriu mais uma vez" e que "mais um inimigo [foi] tombado".

Em nota oficial, a PM informou que "as opiniões pessoais do tenente não refletem a posição da instituição e serão apuradas". Em posicionamento enviado à reportagem, a SSP disse que "o caso é investigado pelo Setor de Homicídios e Proteção à Pessoa de Osasco" e que "a PM instaurou um inquérito policial militar para apurar todas as circunstâncias relativas ao caso".

O ouvidor das Polícias de São Paulo, Benedito Mariano, afirmou que instaurou procedimento para acompanhar na Ouvidoria o caso. "Conversei no domingo (3) com o corregedor da Polícia Militar, que já está apurando o caso. Quarta-feira (6) vou solicitar da Polícia Técnico Científica os laudos de local, balísticos e necropsia", disse.

Tenente Telhada comemora "mais um inimigo tombado" após matar suspeito - 02.mar.2019 - Reprodução/Instagram - 02.mar.2019 - Reprodução/Instagram
Tenente Telhada comemora "mais um inimigo tombado" após matar suspeito
Imagem: 02.mar.2019 - Reprodução/Instagram

O caso foi levado à Ouvidoria pelo Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), após o caso ter sido revelado pelo UOL, com base no boletim de ocorrência, obtido pela reportagem. "Vi que as testemunhas são só PMs. Um traço comum nos casos de execuções e em confrontos forjados. E comemorar a ação configura apologia ao crime, segundo o artigo 287 do Código Penal", afirmou o advogado Ariel de Castro Alves, membro do conselho.

Além da comemoração, a ação da Polícia Civil de não requisitar perícia ao local do fato também é alvo da Corregedoria. De acordo com Castro Alves, "o delegado que não determinou a perícia pode responder por prevaricação, de acordo com o artigo 319 do Código Penal, sob pena de detenção de três meses a um ano, além de multa".

Outra irregularidade apontada pelo advogado foi o fato de o delegado, do 10º DP (Distrito Policial) de Osasco, não ter apreendido a arma utilizada pelo tenente Telhada, o que é comum em situações semelhantes, para auxiliar a perícia.

De acordo com o boletim de ocorrência do caso, os PMs acionaram o resgate para levar o suspeito ao hospital, onde morreu, e levaram a arma que teria sido utilizada por ele, além das roupas que ele vestia, para a delegacia. Segundo a desembargadora Ivana David, do Tribunal de Justiça de São Paulo, trata-se de alteração da cena do crime, uma vez que a Polícia Civil deveria ter ido ao local para fazer perícia.

"Providências serão tomadas"

Após a reportagem ter revelado como foi a operação, com base no boletim de ocorrência registrado no 10º DP de Osasco, Paulo e Rafael Telhada reagiram contrariamente ao que foi registrado e noticiado, chamando a reportagem de "fraude" e de conter "hipocrisia". A reportagem solicitou entrevista com tenente Telhada, através da SSP, mas o pedido não foi atendido.

O pai do tenente escreveu quatro vezes no Twitter para defender o filho. "Meu filho guerreiro e seus comandados estão bem e em casa, isso é o que interessa. Ladrão escolhe o caminho que quer: cadeia ou saco. Aquele vagabundo escolheu o que quis e teve o que merecia", disse.

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, parabenizou o tenente através do Instagram. Em resposta, o tenente da PM paulista escreveu que "as providências serão tomadas", sem especificar quais, ao complementar que "esses órgãos de imprensa medíocres insistem em publicar matérias tendenciosas e criminosas".

Imagem publicada pelo deputado federal Guilherme Derrite, amigo do tenente Telhada - 04.mar.2019 - Reprodução/Instagram - 04.mar.2019 - Reprodução/Instagram
Imagem publicada pelo deputado federal Guilherme Derrite, amigo de Telhada
Imagem: 04.mar.2019 - Reprodução/Instagram

O tenente também foi defendido pelo seu amigo deputado federal Capitão Derrite (PP-SP), que, enquanto tenente da PM, em 2015, teve de ir à Corregedoria da PM por dizer considerar "vergonha" um policial não participar de ao menos três ocorrências com morte em cinco anos. Inquérito policial apontou que sua opinião não configurou crime militar.

"Tendo em vista que os atos policiais estão abarcados pela presunção de veracidade e de legalidade, e pelo o que dizem as testemunhas na matéria do jornal, até que se prove o contrário, aplaudo de pé e agradeço firmemente estes nobres policiais", escreveu Derrite, que chegou a fazer uma arte com um print screen da reportagem a chamando de hipócrita.

Por meio do Twitter, o presidente Jair Bolsonaro defendeu que "é urgente que o Congresso aprecie matérias para que os agentes de segurança pública, ou não, usem a letalidade para defender a população".

Segundo a desembargadora Ivana David, que já recebeu prêmio do Conselho da Polícia Civil e que, em 2017, recebeu a medalha da Constituição das mãos do deputado Paulo Telhada, houve indícios de, ao menos, dois erros na ação policial: a alteração da cena do crime feita pelos PMs e a falta de trabalho de perícia no local.