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Laudo aponta mais de 200 tiros em ação militar que matou músico e catador

07.abr.2019 - Carro em que músico foi morto ao ser baleado por militares Imagem: Jose Lucena/Futura Press/Estadão Conteúdo

Marina Lang

Colaboração para o UOL, no Rio

09/05/2019 18h39

Mais de 200 tiros foram disparados por militares na ação que terminou com a morte do músico Evaldo Rosa dos Santos, 46, e feriu o catador de papel Luciano Macedo, 27, no dia 7 de abril em Guadalupe, zona norte do Rio de Janeiro. Do total, 83 disparos acertaram o carro em que o músico estava com a sua família. Macedo ficou internado em estado grave e morreu em decorrência dos ferimentos no dia 18 de abril no Hospital Carlos Chagas, na zona norte carioca.

A informação sobre o total de disparos consta em um laudo revelado ontem pela ministra Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha, do STM (Superior Tribunal Militar), em audiência para analisar pedido de habeas corpus de nove militares presos apontados como responsáveis pelos tiros.

No começo da noite, o ministro José Barroso Filho pediu vistas para consultar o processo. Ele terá até dez dias para devolver os autos a fim de o julgamento ser retomado. Enquanto isso, os oficiais permanecem presos. Até o pedido de vistas de Barroso Filho, o resultado parcial da votação contabilizava quatro votos a favor da soltura dos militares e um pela manutenção das prisões. O resultado preliminar, contudo, pode ser modificado, uma vez que os ministros podem mudar seus votos até o final do julgamento. A Corte é composta por 15 ministros --o presidente da STM só votará em caso de empate entre os magistrados.

A ministra citou nominalmente cada um dos militares que efetuou disparos e quantos tiros foram disparados. Segundo ela, o laudo foi produzido em 11 de abril.

Somente o tenente Ítalo da Silva Nunes Romualdo teria efetuado 77 disparos --a magistrada informou que outros 11 tiros foram dados pela sua arma no mesmo dia, mas não há confirmação de que teriam ocorrido na ação do Exército que vitimou o músico e o catador.

Ainda conforme o documento, outro militar que compunha a patrulha efetuou 54 disparos; três soldados atiraram 20 vezes cada um e um disparou 14 vezes. Os demais atiraram de uma a nove vezes.

Santos foi atingido com nove tiros --três deles na cabeça-- e Macedo foi alvejado três vezes nas costas.

A ministra Maria Elizabeth abriu a divergência na votação de ontem e classificou a ação dos militares como "desmedida e irresponsável". Ela também contestou a primeira versão dos militares --segundo consta nos autos, eles teriam sido acionados por um civil que reportou um assalto feito por supostos criminosos em um carro similar ao de Santos.

"Eles não tinham que fazer o papel de radiopatrulha sob hipótese alguma, até porque já havia sido cometido o assalto. A vítima não corria perigo. Simplesmente, eles inventaram uma versão para o comando. As vítimas só foram ouvidas depois. Os militares mentiram para o comando e venderam uma versão de que haviam sido atacados. Está provada [a contestação da versão] na medida em que eles atiraram lateralmente e por trás", disse a ministra na audiência.

"A decisão [sobre a prisão preventiva em 1ª instância] não padece de falta de fundamentação", disse ela. "Dois civis vieram a óbito. (?) O carro foi alvejado em segundo momento, parado e com as portas abertas", afirmou a ministra, com base nos autos do processo.

Ainda segundo a magistrada, laudos periciais já concluídos confirmam o depoimento das testemunhas --inclusive o da mulher de Santos, Luciana dos Santos Nogueira, que sobreviveu à ação. Ela citou também o risco dos investigados "manipularem as investigações".

"É injustificável esse veículo ser alvejado por 83 tiros. Eles [os militares] não estavam sob a Garantia de Lei e Ordem. Eles só poderiam ter atuado se o quartel ou eles próprios tivessem sido atacados, o que não ocorreu", afirmou, acrescentando que não cabe às Forças Armadas o policiamento ostensivo --tal atribuição compete à Polícia Militar.

Na audiência, a defesa dos militares argumentou ser direito dos nove militares responderem ao processo em liberdade. O advogado Paulo Henrique Pinto de Mello classificou a prisão como "genérica".

"Estamos diante de uma prisão genérica, que foi construída pela mídia. A mídia, o tempo inteiro, colocou os militares como assassinos sem uma apuração dos fatos. A imprensa está usando esse caso para macular as Forças Armadas", declarou Pinto de Mello.

O pedido de liberdade foi apoiado em sustentação oral pelo procurador Carlos Frederico de Oliveira Pereira, do Ministério Público Militar.

Procurado pela reportagem, o advogado dos militares não foi localizado para comentar o laudo que aponta os mais de 200 disparos.

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