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Atestados: jovens de Paraisópolis morreram por asfixia e trauma na coluna

Marcelo Oliveira*

Do UOL, em São Paulo

02/12/2019 20h15

Resumo da notícia

  • O UOL teve acesso a 4 das 9 declarações de óbito das vítimas de Paraisópolis
  • Dois deles apontam asfixia, um informa trauma medular e um quarto não indica a causa da morte
  • A família de uma quinta vítima afirma que a calça do morto não tinha marcas de pisadas
  • OAB-SP e Comissão de Direitos Humanos receberam denúncias dizendo que os corpos não foram fotografados

Atestados de óbito de quatro dos nove jovens que morreram no último fim de semana após operação policial em um baile funk em Paraisópolis, na zona Sul de São Paulo, apontam asfixia e trauma na medula como "causa mortis"

O UOL teve acesso aos documentos, sob a condição de não publicá-los na íntegra.

Segundo a polícia civil, que registrou a ocorrência com base em informações da polícia militar, as vítimas morreram pisoteadas ao fim do Baile da DZ7, realizado nas ruas de uma das maiores favelas da cidade de São Paulo.

A análise dos quatro atestados de óbito indicam estas causas de morte:

  • Gabriel Rogerio de Moraes, "asfixia mecânica por 'enforcação indireta'" (nota da redação: segundo especialista ouvido pelo UOL, não existe "enforcação indireta", o termo correto é "sufocação indireta" e deve ter havido erro na transcrição da declaração de óbito, preenchida a mão pelo médico, para a certidão de óbito, documento entregue para os familiares da vítima)
  • Luara Victoria Oliveira, "asfixia mecânica por sufocação indireta"
  • Mateus dos Santos Costa, "trauma raquimedular por agente contudente"
  • Bruno Gabriel dos Santos, "a determinar" (aguarda resultado de exames)

Família não acredita em pisoteamento

Familiares de algumas das vítimas estranham o fato de não haver marcas esperadas por pisoteamento — como feridas ou sangue.

Calça usada por Denys Henrique Quirino da Silva - Lucas Martins / Jornalistas Livres - Lucas Martins / Jornalistas Livres
Calça usada por Denys Henrique Quirino da Silva
Imagem: Lucas Martins / Jornalistas Livres
Em entrevista ao site Jornalistas Livres, dois irmãos de Denys Henrique Quirino da Silva, 16, duvidaram da versão da polícia. Para demonstrar a tese, mostraram a calça da vítima, que não tinha marcas de pisadas, mas estava suja apenas de barro nos joelhos e na altura das nádegas.

"Se passaram por cima do meu irmão, porque a roupa dele está limpa assim?", disse Danylo Amilcar, um dos irmãos de Denys. Eles afirmam também que os braços do irmão estavam quebrados.

Fotos dos corpos

Os advogados Dimitri Sales, presidente do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) e Arnóbio Rocha, coordenador da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, receberam denúncia de que os corpos das vítimas de Paraisópolis não estavam sendo fotografados pelo IML durante a necropsia (exame realizado em um corpo para detectar o que causou a morte de alguém).

A fotografia dos corpos é essencial para que se possam fazer cruzamentos de dados e apurar divergências ou verificar omissões existentes entre os laudos e conclusões da perícia de local, por exemplo.

Eles receberam a denúncia na noite de ontem e na madrugada de hoje tentaram falar com o médico responsável pelo plantão do IML Central de São Paulo, onde estavam os corpos de quatro das nove vítimas, que negou-se a atendê-los.

A SPTC (Superintendência da Polícia Técnico-Científica), órgão que supervisiona o Instituto Médico Legal e o Instituto de Criminalística, emitiu nota ontem dizendo que "o trabalho pericial seguiu as normas legais".

Segundo a nota, "todos os corpos foram fotografados, os sinais característicos e individualizadores registrados e as impressões digitais coletadas". Além disso, exames complementares estão em elaboração para identificar as causas das mortes.

* Colaborou Luís Adorno, da reportagem do UOL, em São Paulo