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Quem é o desembargador que censurou o especial de Natal do Porta dos Fundos

O desembargador Benedicto Abicair, que censurou o especial do Porta dos Fundos - Divulgação/ TJ-RJ
O desembargador Benedicto Abicair, que censurou o especial do Porta dos Fundos Imagem: Divulgação/ TJ-RJ

Igor Mello

Do UOL, no Rio

08/01/2020 20h24

Resumo da notícia

  • O desembargador Benedicto Abicair defendeu uma série de posições controversas em artigos para sites jurídicos
  • Abicair justificou em 2018 o pagamento de auxílio-moradia para juízes, pois eles teriam vida "difícil e sacrificante"
  • Em 2011, ele defendeu um colega que deu voz de prisão ao ser parado em blitz da Lei Seca, que ele já havia atacado em 2009
  • O desembargador criticou a presença de "homens e mulheres seminus, encostando seus corpos suados" em aviões

Responsável por determinar a retirada do ar do especial de Natal do grupo Porta dos Fundos, o desembargador Benedicto Abicair, da Sexta Câmara Cível do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), possui um histórico de posições controversas em artigos escritos para sites ligados à comunidade jurídica. Entre elas, estão críticas à Operação Lei Seca (blitze de motoristas para inibir consumo de álcool ao volante) —inclusive defendendo um colega de tribunal que deu voz de prisão a agentes que pararam seu carro.

Abicair também se manifestou diversas vezes contrariamente à criação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), órgão que faz o controle das atividades dos magistrados. Além disso, já defendeu a manutenção do auxílio-moradia para juízes —descritos por ele como pessoas como vida "difícil e sacrificante", cheia de "agruras"— e foi contrário à dispensa do uso de ternos por advogados durante o verão.

Abicair determinou ontem (7), em decisão liminar (provisória), que a Netflix retire do ar o especial A primeira tentação de Cristo em que os comediantes satirizam passagens bíblicas. Na obra, Jesus Cristo é retratado como um homem gay, enquanto Maria, José e Deus formam um triângulo amoroso. O programa provocou reações de movimentos conservadores e religiosos.

Na véspera de Natal, um grupo integralista atacou a sede do Porta dos Fundos com coquetéis molotov. Abicair diz, em referência ao ataque, que é "incontroverso que toda ação provoca uma reação, eventualmente de caráter violento".

Abicair atuou como advogado de 1978 a 2006, quando passou a ocupar vaga de desembargador do TJ-RJ destinada a advogados. Ele frequentemente escreve para sites jurídicos sobre variados temas, tendo com frequência posições em defesa de interesses corporativos da magistratura.

Em meio à polêmica sobre o fim do auxílio-moradia para juízes, o desembargador escreveu um artigo para o site Conjur, em março de 2018, em que ironizava as afirmações de que membros do Judiciário seriam privilegiados com salários exorbitantes.

No texto, ele afirma que os juízes ingressam na carreira por concurso público depois de "20 anos de estudo" e, ao assumir o cargo, passam por uma "nova etapa de agruras". "Como é difícil e sacrificante a vida na magistratura", desabafa no artigo.

Desde a criação da Operação Lei Seca, Abicair se mostra contra a forma como a operação —que é reconhecida por ter reduzido significativamente as mortes no trânsito— funciona. Segundo ele, os motoristas alcoolizados não deveriam ser alvo de uma fiscalização especial, já que outras infrações são cometidas no trânsito.

"A fiscalização deve ser aplicada a todos que cometam infrações no trânsito, para, então, ser possível levantar suspeitas sobre motoristas alcoolizados, pois são muitos os que sóbrios são mais perigosos que alguns com pequena dosagem de álcool no sangue", opinou em artigo publicado no site do TJ-RJ em julho de 2009.

As críticas à Lei Seca foram mantidas por ele até mesmo em um episódio controverso. Em novembro de 2011, o desembargador Cairo Ítalo França David, colega de Benedicto Abicair no TJ-RJ, deu voz de prisão a um fiscal após seu motorista se recusar a fazer o teste do bafômetro em uma blitz.

Abicair comparou os juízes às vítimas do nazismo ao comentar o caso em artigo no site Conjur. Para ele, o colega defendeu "suas próprias convicções jurídicas" em um episódio que "caracteriza a ousadia de servidores do Executivo em perpetrar violações a direitos constitucionais".

Crítica a "seminus, encostando corpos suados" em aviões

O desembargador também criticou a presença de "homens e mulheres seminus, encostando seus corpos suados" em aviões

O magistrado também protestou, em artigo publicado no site da Amaerj (Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro), contra a decisão da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de dispensar o uso de terno durante o verão, em 2011.

Em julho daquele ano, o desembargador destacou a importância de se "preservar tradições" e demonstrou insatisfação com "homens e mulheres seminus, encostando seus corpos suados" nos aviões.

"Lembro, ainda, que, tempos idos, era obrigatório, ou pelo menos de boa prática, o traje 'passeio completo' para os passageiros de avião. Atualmente vemos homens e mulheres seminus, encostando seus corpos suados nos ocupantes dos minúsculos assentos geminados. Bons tempos quando era politicamente correto ser bem vestido", destaca, antes de completar: "Bons tempos quando era politicamente correto ser bem vestido".

O desembargador também se manifestou diversas vezes contra a criação do CNJ, órgão idealizado com o objetivo de dar maior transparência e controle sobre as atividades de tribunais e magistrados. "CNJ é criação infeliz e remonta à ditadura", diz Abicair no título de seu artigo ao site Conjur.