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Chacina do Fallet: peritos atribuem falhas em laudos a falta de estrutura

Peritos da Polícia Civil do Rio fazem reprodução simulada na comunidade do Fallet, em Santa Teresa - Thathiana Gurgel / DPRJ
Peritos da Polícia Civil do Rio fazem reprodução simulada na comunidade do Fallet, em Santa Teresa Imagem: Thathiana Gurgel / DPRJ

Igor Mello

Do UOL, no Rio

05/02/2020 14h32

O Sindperj (Sindicato dos Peritos Oficiais do Estado do Rio de Janeiro) atribuiu à falta de investimentos do governo do estado as falhas nos laudos do IML (Instituto Médico-Legal) no caso da chacina do Fallet, em fevereiro de 2019. Os problemas foram apontados em duas análises feitas por peritos internacionais a pedido da ONG Human Rights Watch. Os documentos foram divulgados pelo UOL nesta segunda-feira (3).

As análises dos experts apontaram diversas omissões graves no trabalho feito no IML, responsável por analisar os corpos das 15 vítimas da operação— realizada por policiais militares do Batalhão de Choque e do Bope (Batalhão de Operações Especiais). Os exames feitos em nove das vítimas, todas mortas em uma casa na entrada da comunidade, foram avaliados.

Entre as falhas apontadas está o fato de não terem sido realizados exames para procurar vestígios de pólvora nas mãos das vítimas, a falta de descrição das trajetórias dos tiros que as atingiram, assim como o pequeno número de fotografias feitas de cada um dos corpos. Para os peritos internacionais, os laudos revelam a "baixa qualidade" do trabalho do IML e não têm valor legal.

Segundo a nota do Sindperj, vários dos problemas apontados pelos especialistas estrangeiros estão relacionados à falta de pessoal, estrutura e investimentos na Polícia Técnico-Científica do Rio, que é vinculada à Polícia Civil. O sindicato afirma que o quadro de peritos legistas em serviço atualmente corresponde a apenas 45% do número mínimo estabelecido por lei, quadro que se repete em outras funções, como técnicos e auxiliares de necropsia.

O sindicato destaca que os exames para encontrar resíduos de pólvora nas mãos das vítimas não foram feitos por falta de equipamentos e insumos: "A respeito de exame residuográfico de tiro, é necessário esclarecer que a Polícia Civil do Rio de Janeiro não possui um microscópio eletrônico de varredura (MEV), tampouco fornece material adequado às coletas de resíduos de tiro, ambos necessários para realizar o exame. Também não vigora qualquer instrumento oficial de convênio ou parceria com entidade que possua o MEV de forma a suprir esta necessidade".

Em novembro, o UOL mostrou que a proposta de orçamento para 2020 enviada pelo governador Wilson Witzel (PSC) à Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) previa um corte de 86% nos recursos destinados à Polícia Técnico-Científica. A previsão era de que apenas R$ 816 mil fossem aplicados no custeio dos serviços. Porém, os deputados reverteram o corte e aprovaram duas emendas que destinam mais R$ 8,3 milhões ao orçamento destinado às perícias.

Além disso, o sindicato diz que os profissionais "enfrentam a dura rotina de trabalho em meio à falta de equipamentos e insumos adequados à realização dos exames, que são realizados em um ambiente completamente insalubre, cuja exposição é remunerada com apenas R$ 33,28".

Sobre as omissões de informações básicas nos laudos, o Sindperj diz que hoje os peritos plantonistas do IML central são obrigados a analisar a cada expediente de 30 a 40 corpos, quando o ideal para que houvesse tempo para um trabalho detalhado seriam máximo 12 exames. Também ressaltam o fato de não haver tempo designado em serviço para que eles elaborem os laudos após os exames, forçando-os a assumir essa tarefa em seus dias de folga.

"O Sindperj oficiou a Secretaria de Polícia Civil em 26/07/2019, mas até o momento não houve qualquer retorno ou tentativa de solucionar o problema. Muito pelo contrário, há peritos respondendo a sindicâncias por atrasos na entrega de laudos, fato gerado muitas vezes pela própria gestão da instituição. Exemplo disso foi o recente acúmulo de laudos nos setores de laboratórios da Perícia, por falta de reagentes e outros insumos", diz a nota.

O UOL procurou a Polícia Civil para obter um posicionamento a respeito das críticas feitas pelo Sindperj, mas não obteve resposta até o momento.