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Família de morta por coronavírus sofre com preconceito e bebê infectada

Rafaela morreu vítima do coronavírus, e Erisvaldo sofre com preconceito - Arquivo pessoal
Rafaela morreu vítima do coronavírus, e Erisvaldo sofre com preconceito Imagem: Arquivo pessoal

Aurelio Nunes

Colaboração para o UOL, em Salvador

08/04/2020 12h02

Em meio ao luto pela perda recente da mulher Rafaela, 28, para o novo coronavírus, o empresário Erisvaldo Lopes dos Santos, 47, se vê diante de um novo desafio: a filha do casal, Alice, de apenas 14 dias de vida, também contraiu a doença.

A bebê foi a única de um grupo de sete pessoas que teve contato com Rafaela a apresentar resultado positivo nos testes para a covid-19 realizados na semana passada, em Trancoso, litoral da Bahia. Até ontem, viviam na casa quatro adultos e três crianças. Agora só restaram Erisvaldo, uma amiga que está cuidando de Alice, além da recém-nascida. Os demais mudaram-se para outra casa.

Resignado com a perda de Rafaela, Erisvaldo é otimista quanto ao futuro de Alice. "Minha filha nasceu com 4,290kg e com 52cm. Ela se alimenta bem, não chora, não teve febre e está forte e saúdável. Vai dar tudo certo", diz.

Proprietário de uma empresa de transfer turístico, Erisvaldo viu o sonho de sua mulher de virar mãe transformar-se em pesadelo há exatamente uma semana, quando Rafaela morreu em uma Unidade de Pronto Atendimento de Itapetinga, sete dias após ser submetitida a uma cesariana no Hospital Cristo Redentor.

Situada a 287 km da casa onde vivia o casal, em Trancoso, Itapetinga foi escolhida para ser o local do parto porque é lá onde moram os familiares de Rafaela. Na casa da tia, local onde o casal ficou hospedado, o clima é de medo.

A professoara Leidiane Souza Azevedo, 37, acompanhou Rafaela desde a preparação para o parto até a morte e reclama que, até agora, não foram disponibilizados testes para ela e seus familiares. "Com o resultado positivo de Alice fiquei apavorada. Tenho uma filha de quatro anos e uma mãe de mais de 60 e acho que tenho o direito de saber se eu também fui infectada", reclama.

Ela afirma que tem sido tratada com atenção pela equipe da vigilância epidemiológica de Itapetinga, mas que além dos testes não recebeu luvas, máscaras, álcool em gel ou qualquer outro tipo de proteção.

O pessoal de lá (Itapetinga) foi muito cruel com Rafaela e continua não dando a menor atenção para a família dela
Erisvaldo Lopes dos Santos

Além da falta de assistência, Erisvaldo reclama do preconceito de seus próprios vizinhos. "Os meus irmãos me ajudam com as compras da casa, os bons amigos mandam orações e mensagens de solidariedade, mas ainda chega muito comentário maldoso de gente que diz que eu estou espalhando o vírus por aí", reclama o viúvo. "Não desejo que ninguém passe o que eu tô passando", desabafa.

Leidiane confirma que também é vítima da língua ferina da vizinhança, mas prefere relevar. "É uma bomba após a outra. São pessoas que não conseguem respeitar o luto, mas a gente releva, porque são mal informadas".