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Suspeita de covid-19 em asilo da prefeitura gera tensão em 210 idosos em SP

Fachada da Morada São João, no centro de São Paulo - Wanderley Preite Sobrinho/UOL
Fachada da Morada São João, no centro de São Paulo
Imagem: Wanderley Preite Sobrinho/UOL

Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

12/04/2020 04h00

Medo e apreensão tomaram conta de um asilo para idosos no centro de São Paulo, depois que um homem foi internado na semana passada sob suspeita de estar infectado com a covid-19.

"O Silvio tem mais de 60 anos. Ele foi levado para a Santa Casa e depois para um hospital na zona norte, com suspeita de coronavírus", contou ao UOL um dos idosos, sob condição de anonimato. "Aqui somos muitos, todo mundo está com medo."

O Centro de Acolhida Especial para Idosos Morada São João funciona desde dezembro de 2010, na avenida São João, em um antigo hotel. Ele foi transformado pela prefeitura em um asilo, para acolher idosos sem contato com a família que viviam nos centros de acolhida da prefeitura.

Ali moram 210 pessoas com mais de 60 anos: 170 homens e 40 mulheres. São seis andares, o primeiro só para mulheres. Os idosos dormem em grupos de três ou quatro pessoas em um quarto com banheiro. No térreo, com vista para a avenida famosa, fica o refeitório com 80 lugares.

Homem dormindo na Morada São João - Wanderley Preite Sobrinho/UOL - Wanderley Preite Sobrinho/UOL
Morador do centro na recepção do prédio, que já foi um hotel
Imagem: Wanderley Preite Sobrinho/UOL
"Cheguei aqui faz cinco meses. Divido o quarto com outros três", contou seu Francisco, 62.

"Meu comércio faliu, me desquitei da mulher, que ficou com a casa. Recentemente eu caí em um bueiro, quebrei a perna, mas a Previdência não me deu benefício. O jeito é ficar aqui, mas ainda sonho em alugar um quarto só meu."

Seu Francisco, que caminha pela calçada do asilo com a ajuda de uma muleta, conta que já viu morrer cinco pessoas desde que chegou ao centro. "Se foi de coronavírus, eu não sei."

Seu Francisco, 62  - Wanderley Preite Sobrinho/UOL - Wanderley Preite Sobrinho/UOL
Francisco, 62, já viu cinco pessoas morrerem desde chegou ao centro
Imagem: Wanderley Preite Sobrinho/UOL
A alguns metros dele, dois idosos se lembram do momento em que seu Silvio foi levado para o hospital. "Começaram a falar em coronavírus, as pessoas passaram a comentar, a ficar com medo."

Prédio de lado - Wanderley Preite Sobrinho/UOL - Wanderley Preite Sobrinho/UOL
Morada São João, no centro de São Paulo
Imagem: Wanderley Preite Sobrinho/UOL
Ao lado, o colega diz que a administração faz silêncio sobre o caso. Embora não negue a suspeita, não entra em detalhes. "Eles não informam nada para gente. Fica essa tensão."

Outro homem, também sob anonimato, disse que o quarto de Silvio não foi interditado depois da internação. "Os outros três senhores continuam dormindo lá."

Ele, que raramente deixa o asilo, reclama que precisa dormir no mesmo quarto de idosos que saem do centro e ficam fora o dia todo. "E se eles voltam com corona?", questiona.

Outro homem, há oito anos no Morada São João, reclama da comida, servida "sem sabor nem nutrientes. Nem sempre há legumes, e a carne é de porco, cozida. As pessoas vivem com anemia aqui dentro. Imagina com essa pandemia."

Cuidados

Apesar das reclamações, a administração tomou algumas providências. Na recepção há um cartaz com orientações de higiene e um frasco de álcool em gel, também instalado ao lado dos bebedouros em cada um dos seis andares.

Recepção da Morada São João - Wanderley Preite Sobrinho/UOL - Wanderley Preite Sobrinho/UOL
Recepção da Morada São João
Imagem: Wanderley Preite Sobrinho/UOL
Desde que o vírus chegou à capital paulista, o asilo passou a servir as refeições durante duas horas, e não em uma como antes da pandemia. "É para que a gente não se aglomere no refeitório e não forme filas", conta seu Francisco.

Os grupos de idosos que se formavam no entorno do prédio para conversar foram proibidos, e não há permissão para sentar ao lado de ninguém. "É uma cadeira ocupada e outra vazia", alertava uma funcionária do centro.

Refeitório Morada São João - Wanderley Preite Sobrinho - Wanderley Preite Sobrinho
Refeitório da Morada São João
Imagem: Wanderley Preite Sobrinho
As atenções e o medo devem persistir, mesmo que Silvio não seja diagnosticado com a covid-19. "A gente é a população de risco. Tem muitos aqui que, além de idoso, são doentes", diz uma mulher. "Só sossego quando a pandemia acabar."

Procurada, a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social afirmou em nota que "que não cita casos pontuais e os dados são divulgados de forma geral no site da pasta".

"A Prefeitura de São Paulo [...] informa que o Centro de Acolhida Especial (CAE) Morada São João faz higienização constantemente, as janelas estão mantidas abertas e as camas foram remanejadas para que haja um metro de distância entre os conviventes. Equipes de saúde realizam frequentemente orientações nos sete Centros de Acolhida Especiais para Idosos (CAE) que a pasta disponibiliza.

A rede socioassistencial intensificou as orientações sobre os cuidados com a higiene para os conviventes, como: lavar bem as mãos com água e sabão, cobrir a boca e o nariz ao tossir e espirrar, evitar tocar os olhos e não compartilhar objetos de uso pessoal.

O Centro de Acolhida Especial (CAE)Morada São João é administrado pela Organização da Sociedade Civil (OSC) Bom Jesus dos Passos desde 2016.

Os encaminhamentos da rede socioassistencial podem ser feitos por meio do Centro Referência de Assistência Social (CRAS), Centro de Referência Especializada em Assistência Social (CREAS), por meio de abordagens realizadas por pelo Serviço Especializado de Abordagem Social (SEAS) e procura espontânea."