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'Quando ouvi, não acreditei', diz mãe de santo xingada por Sérgio Camargo

Adna dos Santos, religiosa xingada pelo presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo - Divulgação/Ògan Luiz Alves/Projwto Oníbodê
Adna dos Santos, religiosa xingada pelo presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo Imagem: Divulgação/Ògan Luiz Alves/Projwto Oníbodê

Jéssica Nascimento

Colaboração para o UOL, em Brasília

04/06/2020 18h53

"Eu estou até agora perplexa com os áudios. Estou chocada, de verdade. Ele tentou colocar minha moral em jogo. Isso é racismo religioso." O desabafo é de Adna dos Santos, religiosa xingada de "macumbeira" e "filha da puta" pelo presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo. A Policia Civil do Distrito Federal investiga o caso.

Adna é conhecida como mãe baiana, trabalhou por quatro anos na Fundação Palmares e atualmente é coordenadora de Políticas de Promoção e Proteção da Diversidade Religiosa da Subsecretaria de Direitos Humanos e Igualdade Racial no Distrito Federal.

Ao UOL, a mãe de santo contou que teve acesso aos áudios pelas redes sociais. Ela foi ontem registrar um boletim de ocorrência na Delegacia Especializada em Crimes por Discriminação Racial e Religiosa. O caso está sendo investigado como injúria e discriminação racial.

"Quando ouvi, não acreditei. Foi uma injustiça muito grande. Não conheço essa pessoa (Sérgio Camargo), nunca trabalhei com ela. Foi uma calúnia, uma injúria. Uma difamação. Os áudios deixam claro isso. Denunciei porque isso era o meu papel. Representei a todos que ele magoou com uma mensagem tão preconceituosa", pontua.

A Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) acionou hoje o Ministério Público para que tome providências contra o presidente da Fundação Zumbi dos Palmares.

Para Fábio Felix, presidente da Comissão de Direitos Humanos da CLDF, fala de Sérgio Camargo é lamentável. Segundo ele, todos os órgãos serão notificados para que sejam tomadas as medidas cabíveis contra o representante.

"Sérgio usou o racismo religioso de sempre para atacar uma mulher que vem há anos lutando para defender a população negra. Não aceitaremos nenhum tipo de violência contra os nossos. Sérgio precisa ser responsabilizado por todo desserviço e violência que tem prestado contra o povo preto do Brasil. Nosso foco será o de intolerância religiosa, mas também o de racismo", esclareceu.

"Verba para terreiros"

No áudio, obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo, Camargo cita Adna dos Santos, e diz que não dará verba para terreiros, numa alusão a locais usados para cerimônias de candomblé e outras religiões de matriz africana.

"Tem gente vazando informação aqui para a mídia, vazando para uma mãe de santo, uma filha da puta de uma macumbeira, uma tal de Mãe Baiana, que ficava aqui infernizando a vida de todo mundo", disse ele.

Na mesma gravação em que ofende religiões de matriz africana, Camargo classificou o movimento negro como "escória maldita", que abriga "vagabundos", e chamou Zumbi de Palmares de "filho da puta que escravizava pretos".

Questionada sobre uma possível para Camargo, a mãe baiana disse que irá entrar em contato com ele e que apenas espera que Deus ilumine a mente dele para pensar no que disse. Ela também quer justiça.

"Sou preta, sou mãe, sou avó, sou religiosa, sou do terreiro... mas sou humana. Ele tentou colocar minha moral em jogo, a dos pretos, a dos umbandistas. A justiça vai ser feita. Tenho fé", disse.

Camargo fala em "gravação ilegal"

Em nota, o presidente da Fundação Cultural Palmares (FCP), Sérgio Camargo, disse que lamenta a gravação "ilegal de uma reunião interna e privada" e que, reitera que a Fundação, em sintonia com o Governo Federal, está sob um novo modelo de comando.

"O comando é mais eficiente, transparente, voltado para a população e não apenas para determinados grupos que, ao se autointitularem representantes de toda a população negra, histórica e deliberadamente se beneficiaram do dinheiro público. Infelizmente ainda existem, na gestão pública, pessoas que não assimilaram esta mudança e tentam desconstruir o trabalho sério que está sendo desenvolvido. Seguimos firmes em prol do Brasil e dos brasileiros, afirmou a nota.