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'Ele só queria brincar', diz avó de Guilherme, morto com dois tiros

Guilherme Silva Guedes, morto na Vila Clara - Reprodução/ Facebook
Guilherme Silva Guedes, morto na Vila Clara Imagem: Reprodução/ Facebook

Marcelo Oliveira

Do UOL, em São Paulo

16/06/2020 20h57

Enquanto a reportagem do UOL escrevia este texto, bombas e rojões explodiam pelo bairro da Vila Clara, na zona sul de São Paulo. Uma delas bateu no muro de contenção e caiu no córrego do Cordeiro, bem ao lado da casa em que morava Guilherme Silva Guedes e o local onde o adolescente de 15 anos foi sequestrado na madrugada de domingo (14).

Logo após a explosão, um carro da PM parou em frente à casa da avó paterna e das tias do estudante, com as luzes ligadas. Elas imediatamente entraram em desespero. "Eles vão entrar aqui", gritou uma delas. O mesmo clima de insegurança deu o tom da revolta popular que tomou as ruas do bairro no final da tarde de segunda-feira (15), quando dois ônibus e quatro trólebus foram incendiados e outros dois ônibus foram depredados em protesto pelo assassinato do jovem.

Segundo sua avó materna, Antonina Arcanja da Silva, Guilherme havia voltado para São Paulo recentemente, após ter morado três meses com a mãe em Tupã, região oeste do Estado, e era um adolescente quieto e brincalhão. "Ele só tinha tamanho. Só queria saber de brincar."

Ela conta que a diversão principal de Guilherme era ouvir música e brincar com a cachorra da família, Charlotte. Quando Guilherme saía de casa, geralmente o fazia acompanhado de primos e primas e de um dos tios.

Desde que voltou de Tupã, Guilherme morava com a avó paterna e duas tias. Toda a família, contudo, estava sempre por perto: Antonina, em uma casa próxima, e a mãe do jovem, na rua de cima.

Os artistas preferidos de Guilherme eram MC Gui e Mc Kevin o Chris. "Ele gostava demais dessa música ('Espera Eu Chegar'). Era a preferida dele", conta Antonina.

Que mundo é esse tão cruel que a gente vive? / A covardia superando a pureza / O inimigo usa forças que oprimem / Oprimem / É, vai na paz, irmão, fica com Deus / Eu sei que um dia eu vou te encontrar"

A letra da música parece falar do momento vivido pelos amigos, vizinhos e familiares de Guilherme que se reuniram nesta terça para protestar na Vila Clara pedindo justiça pela morte do rapaz, usando o funk como trilha.

'Parecia criança'

"Ele parecia criança", lembra a avó. "Quando ia à minha casa ele me falava: 'Vó, dá cinco reais para o seu neto mais bonito?'".

A prima de Guilherme, Adriane, confirma a versão da avó materna. "Ele era muito amoroso, próximo da família e nunca levantou a voz ou desrespeitou ninguém. Não tinha o que falar dele", disse.

Apesar de afirmar sem medo que tem certeza de que os autores do assassinato de Guilherme são policiais, Antonina relata que nunca a violência policial havia sido sentida por alguém da família.

Ela afirma que a imagem do sequestro de Guilherme foi a origem da desconfiança. "Um amigo da família que conhece polícia ao ver as imagens disse ter reconhecido os gestos e o caminhar de um dos homens como típicos de um policial", diz.

No meio da multidão de manifestantes na Vila Clara, jovens como Guilherme, a maioria negros e mestiços, além de outras idosas e mães, pedia justiça. "Elas temem que aconteça com outras famílias o que fizeram com Guilherme."