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MP: Flordelis já havia tentado matar marido por envenenamento e com matador

17.jun.2019 - Flordelis (PSD-RJ), de óculos escuros, durante o enterro de Anderson do Carmo de Souza; deputada foi denunciada como mandante do assassinato - Wilton Junior/Estadão Conteúdo
17.jun.2019 - Flordelis (PSD-RJ), de óculos escuros, durante o enterro de Anderson do Carmo de Souza; deputada foi denunciada como mandante do assassinato Imagem: Wilton Junior/Estadão Conteúdo

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

24/08/2020 12h18Atualizada em 26/08/2020 15h11

A Polícia Civil e o MP-RJ (Ministério Público do Rio) afirmaram na manhã de hoje que a deputada federal Flordelis (PSD-RJ) planejava matar o marido havia mais de um ano. O pastor Anderson do Carmo foi assassinado em junho de 2019. Hoje, cinco filhos e uma neta dela foram presos por suspeita de participação no crime, e Flordelis foi denunciada sob acusação de ser a mandante do assassinato.

Para o MP e para a Polícia Civil, não há dúvidas de que Flordelis é quem mandou matar o marido.

Além de arquitetar, ela [Flordelis] financiou a compra da arma, convenceu a pessoa a praticar o crime, arregimentou, avisou sobre a chegada da vítima ao local e ocultou provas. Não resta a menor dúvida de que ela foi a grande cabeça desse crime
Allan Duarte, delegado

Seis tentativas de envenenamento

Segundo a Polícia e o MP, a deputada praticou pelo menos seis tentativas de envenenamento no ano que precedeu a morte do pastor, a primeira delas em maio de 2018. Doses de arsênico chegaram a ser colocadas na comida do pastor, que precisou buscar atendimento de emergência em unidades de saúde com sintomas como diarreia, sudorese e vômitos.

"Pelo menos outras duas tentativas foram arquitetadas para vitimar o pastor e só não ocorreram por circunstância alheias à vontade dessas pessoas. Uma foi quando ele foi efetuar a compra de um veículo na Barra da Tijuca acompanhado de outros filhos. Ela, juntamente com outras pessoas, arquitetou, planejou e deliberadamente falou para que o executor o matasse simulando latrocínio, se cercando para que demais pessoas não fossem atingidas", disse o delegado.

A segunda situação ocorreu quando um homem chegou a ser pago para matar o pastor. Segundo o delegado, o crime não foi cometido na ocasião porque ocorreu uma troca de veículos, o que criou uma confusão no executor, além de outra pessoa estar junto ao pastor no momento em que o assassinato aconteceria.

"Ela, ao assumir o cargo de deputada, nos parece que se sentiu mais empoderada para levar a cabo esse crime. Vimos tentativas de contratar pistoleiros, matador profissional, chegou a ser pago alguém, mas não foi levado a cabo e por fim o grupo familiar convenceu a executar o pastor quando ele chegava em casa", disse o promotor Sérgio Luiz Lopes Pereira, do Grupo de Atuação Especializada e Combate ao Crime Organizado (Gaeco).

Deputada não foi presa

Flordelis responderá por homicídio qualificado, tentativa de homicídio, falsidade ideológica e organização criminosa. Ao todo, dez pessoas foram presas. A deputada só não foi presa porque tem imunidade parlamentar. O chefe do Departamento Geral de Homicídios, delegado Antônio Ricardo, disse que medidas cautelares foram solicitadas.

"Foi deferido pelo juízo com base no pedido da DH e do MP que ela [Flordelis] tenha restrição de contatos, que não possa se locomover fora do território da cidade onde ela reside e em Brasília, onde ela exerce atividades laborais. Além disso foi deferido também o recolhimento do passaporte dela para que não se ausente das fronteiras nacionais e para que não mude de residência", disse Ricardo.

Desde o início das investigações, a parlamentar nega participação no assassinato de Anderson. Hoje, a defesa dela se disse "surpresa" com a operação.

O advogado Maurício Mayr, que defende a deputada, enfatizou que ela foi ouvida na condição de testemunha e que a defesa só teve acesso ao processo no dia de hoje e estudará os documentos.

"A deputada desde o início desse segundo inquérito foi tratada como testemunha, vindo a ser indiciada agora no final e denunciada. Tivemos acesso hoje ao processo, vamos fazer análise e estudo do caso. Ela figurava como testemunha na ocasião e não atrapalhou as investigações. Todos foram encontrados, as pessoas que tiveram a prisão em seu desfavor. O passaporte dela vai ser entregue pelos advogados conforme determinação da 3ª Vara Criminal. A juíza da Vara acertadamente falou da desnecessidade de prisão preventiva da deputada, apesar de ter a imunidade parlamentar, ela entendeu ser desnecessário prendê-la neste momento até por causa do lapso temporal que se passou desde o fato até o presente momento. Vamos estudar o processo, vamos fazer os pedidos pertinentes em favor dela, pois acreditamos na inocência dela."

"Organização criminosa intrafamiliar"

Segundo o MP, as investigações levaram à conclusão que Flordelis e familiares integravam um grupo criminoso.

Além do crime apurado, outros crimes foram descobertos. Ao final das investigações, chegou-se à conclusão que não se tratava de uma simples família, mas de uma organização criminosa intrafamiliar que tinha o objetivo bem específico de ceifar a vida dessa pessoa para alcançar maior propulsão financeira e política
Sérgio Luiz Lopes Pereira, promotor o Gaeco

O motivo do crime, segundo a denúncia, seria o fato de a vítima manter rigoroso controle das finanças familiares e administrar os conflitos de forma rígida, não permitindo tratamento privilegiado das pessoas mais próximas a Flordelis em detrimento a outros membros da família.

"Ao longo da investigações a gente observa que a vítima geria a carreira política, religiosa e artística da deputada, todo lucro que essa família auferia, seja em shows, cultos, era ele que fazia a gestão e que solucionava conflitos intrafamiliares. Essa gestão financeira e essa forma rígida de solucionar os conflitos geraram revolta na primeira geração da família, essa geração que foi presa hoje, e acabou culminando na morte dele. Arquitetaram esse plano tendo em vista essa indignação com a gestão financeira", explicou o delegado Allan Duarte.

Dois filhos da deputada federal Flordelis chegam à delegacia após serem presos por envolvimento na morte do pastor Anderson do Carmo, marido da parlamentar. Ela foi denunciada como mandante do crime. Cinco filhos e uma neta dela foram presos hoje - JOSE LUCENA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO - JOSE LUCENA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
Dois filhos de Flordelis chegam à delegacia após serem presos por suspeita de envolvimento na morte de Anderson do Carmo
Imagem: JOSE LUCENA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Os 11 denunciados

Além da deputada, dez pessoas foram denunciadas pelo MP. Os sete presos hoje são:

  • Adriano dos Santos Rodrigues (filho)
  • André Luiz de Oliveira (filho)
  • Carlos Ubiraci Francisco da Silva (filho)
  • Marzy Teixeira da Silva (filho)
  • Simone dos Santos Rodrigues (filha)
  • Rayanne dos Santos Oliveira (neta)
  • Andrea Santos

Outros dois filhos —Flávio dos Santos e Lucas Cézar dos Santos— e o ex-PM Marcos Siqueira Costa já estavam presos. A mulher do ex-PM, Andrea, foi presa hoje.

Os mandados foram cumpridos em Niterói (RJ), na casa onde mora a parlamentar; em Brasília, onde ela possui apartamento funcional; e também em São Gonçalo. As decisões foram expedidas pela 3ª Vara Criminal de Niterói.

Ao todo, o crime contou com a participação de 20% da família, segundo a polícia.

"Nós temos 11 pessoas respondendo criminalmente. Levando em conta que a família são 55 [pessoas], temos aí 20% da família envolvida nesse crime", afirmou o delegado Antônio Ricardo.

Defesa de filhos e neta diz que acusações são genéricas

O advogado dos cinco filhos e da neta da parlamentar presos hoje, Luiz Felipe Alves, disse que o processo está em segredo de Justiça, o que implicou na demora da leitura dos autos. Segundo ele, já é possível afirmar que os argumentos da decisão são genéricos "sem qualquer individualização quanto a real e efetiva necessidade de prisão cautelar para cada um dos acusados".

Em nota, a defesa enfatizou que os filhos e a neta da parlamentar são "pessoas íntegras, primárias, detentoras de ótimos antecedentes, com residência fixa e trabalho lícito". "Ademais, ressalta-se que permaneceram em liberdade durante toda a tramitação do inquérito policial que perdurou cerca de um ano e dois meses, inclusive colaborando com a investigação, não sendo demonstrado, de forma concreta, a efetiva necessidade de agora se verem presos preventivamente".

A nota termina dizendo que a defesa aguardará o amplo acesso a todo conteúdo do inquérito policial junto à Justiça "para tomar as medidas jurídicas cabíveis na busca da revogação da desnecessária prisão preventiva decretada em desfavor dos mesmos". A defesa do ex-PM Marcos Siqueira Costa e da sua mulher não foi localizada.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que informou o primeiro parágrafo, Flordelis é deputada federal, e não deputada estadual. A informação foi corrigida.