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Piloto diz que agiu em morte de líderes do PCC no Ceará após ser torturado

Piloto de helicóptero Felipe Morais diz que foi agredido por membros do PCC - Reprodução/STJ
Piloto de helicóptero Felipe Morais diz que foi agredido por membros do PCC Imagem: Reprodução/STJ

Josmar Jozino e Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

28/08/2020 17h58

O piloto de helicóptero Felipe Ramos de Morais, 33, afirma ter sido torturado por integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital) em uma favela no Guarujá, Baixada Santista, em 13 de janeiro de 2018, um mês antes de transportar para a morte Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, e Fabiano Alves de Souza, o Paca, líderes da facção criminosa.

A informação sobre a tortura e fotos mostrando lesões e hematomas no corpo de Morais constam na petição feita pela mãe do piloto, a advogada Mariza Almeida Ramos Morais, no habeas corpus com pedido de liminar protocolado no STJ (Superior Tribunal de Justiça), no dia 4 deste mês, solicitando alvará de soltura em favor do filho.

Na petição, a advogada relata que o narcotraficante Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, o mesmo homem acusado de comandar os assassinatos de Gegê e Paca, ordenou a tortura e também ameaçou matar o piloto porque ele tinha intenção de não prestar mais serviços de transporte aéreo para a organização criminosa.

Após ser torturado, Morais foi internado no Hospital Ana Costa, no Guarujá. A Polícia Militar foi avisada. O PM Rodrigo Guesse do Santos, 36, foi ao local e conversou com o piloto. Em seguida, o policial dirigiu-se para a Delegacia de Polícia da cidade e narrou para o delegado Mário Olinto Junqueira de Oliveira Filho o teor do diálogo com Morais.

No histórico do boletim de ocorrência número 359/18, registrado como roubo, não é citado o caso de tortura. Consta apenas que o piloto caminhava pela rua Júlio Prestes de Albuquerque quando três homens o abordaram e anunciaram o assalto. Morais teve o celular roubado e os desconhecidos o agrediram com socos e pontapés e o espancaram com pedaço de ferro. Segundo a defesa do piloto, ele não narrou a tortura no momento por medo.

Também na petição, a advogada Mariza Morais diz que 12 dias depois de ser torturado, o filho foi procurado em sua empresa no Guarujá por Cabelo Duro. O traficante voltou a ameaçá-lo e disse que a tortura era só um aviso e que se Morais deixasse de prestar serviços ao PCC, a família do piloto seria caçada.

No pedido de habeas corpus, a advogada acrescenta que o piloto ficou com medo e, por isso, obedeceu a ordem de Cabelo Duro para estar em Fortaleza no dia 14 de fevereiro de 2018 para prestar outro serviço de transporte aéreo. Gegê e Paca foram encontrados mortos na aldeia indígena de Aquiraz, região metropolitana de Fortaleza.

Carta escrita por Felipe Ramos Morais; piloto se disse inocente e se dispôs a fazer delação premiada - Reprodução/STJ - Reprodução/STJ
Carta escrita por Felipe Ramos Morais; piloto se disse inocente e se dispôs a fazer delação premiada
Imagem: Reprodução/STJ

Queimas de arquivo após ação no Ceará

Gegê do Mangue e Paca foram assassinados por terem desviado dinheiro do PCC, sobretudo o que circulava na região do porto de Santos, de acordo com investigações da Polícia Civil e do Ministério Público.

O duplo homicídio teria sido aprovado pela cúpula da facção, incluindo Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, e organizado por Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, que ficou foragido até abril de 2020.

O responsável por executar o plano de Fuminho foi o traficante Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, segundo as investigações. Ele foi assassinado a tiros de metralhadora, uma semana depois das mortes de Gegê e Paca, no Tatuapé, zona leste de São Paulo.

O bairro teve, depois de Cabelo Duro, o assassinato de Cláudio Roberto Ferreira, o Galo, numa provável queima de arquivo. Ele estava com mais de R$ 70 mil em espécie e roupas novas no porta-malas do carro, o que fez a polícia acreditar que ele iria tentar fugir.

Delação premiada

Depois da morte de Cabelo Duro, o piloto de helicóptero fugiu para Portugal. Ele foi preso em maio de 2018 e, nos primeiros dias no cárcere, passou a negociar um acordo de delação premiada com policiais civis, segundo a defesa.

Na petição, Mariza Morais reclama que o acordo não foi cumprido e que houve um "estelionato jurídico". A reportagem questionou o Depen (Departamento Peitenciário Nacional), mas até esta publicação não houve retorno.

O piloto Morais e outras nove pessoas foram denunciados à Justiça do Ceará pelos assassinatos de Gegê do Mangue e Paca. O piloto continua preso na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS).

A audiência de Morais sobre o duplo homicídio estava marcada para segunda-feira passada (24), por videoconferência. Porém, a Justiça do Ceará resolveu adiar para outra data porque advogados de outros réus não poderiam participar porque são considerados do grupo de risco para covid-19.

Ouça também o podcast Ficha Criminal, com as histórias dos criminosos que marcaram época no Brasil. Esse e outros podcasts do UOL estão disponíveis em uol.com.br/podcasts, no Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts e outras plataformas de áudio.