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OAB-RJ lança ação pelo fim de prisões com base em reconhecimento por foto

Mesmo inocentadas, algumas pessoas têm as fotos mantidas no banco de imagens da polícia e são reconhecidas novamente por crimes que não cometeram - Luiz Silveira/Agência Nacional de Justiça
Mesmo inocentadas, algumas pessoas têm as fotos mantidas no banco de imagens da polícia e são reconhecidas novamente por crimes que não cometeram Imagem: Luiz Silveira/Agência Nacional de Justiça

Do UOL, em São Paulo

30/10/2020 14h46

A OAB-RJ (Ordem dos Advogados do Rio de Janeiro) lançou na noite de ontem uma campanha pelo fim de prisões com base exclusivamente em reconhecimento por fotografia. A iniciativa, chamada "Justiça para os inocentes", aponta que 70% dos inocentes presos injustamente por falhas no reconhecimento são pessoas negras.

O objetivo é estabelecer um diálogo propositivo com o TJ-RJ, a Polícia Civil, o Ministério Público e a Defensoria Pública para que sejam criados protocolos e recomendações que superem os problemas decorrentes dos reconhecimentos de pessoas no âmbito da investigação criminal e da justiça criminal
Nota da OAB-RJ

O lançamento da campanha, realizado ontem, teve participação do cantor Caetano Veloso. A ação promoveu um vídeo relatando o caso de um jovem negro e inocente, preso apenas pelo reconhecimento fotográfico.

O órgão afirmou que, ao longo de quatro semanas, apresentará vídeos de outros casos em que pessoas inocentes, em sua maioria negras, são presas e processadas unicamente com base no reconhecimento de imagens.

Modelo foi presa ao ser 'reconhecida pelo cabelo'

A modelo e dançarina Barbara Querino, conhecida como Babiy, foi fichada sob a acusação de ter participado de um roubo de carro, em São Paulo. No momento do crime, no entanto, ela estava no Guarujá, litoral paulista, a cerca de 100 km da capital. Ela foi reconhecida pelas vítimas por fotos enviadas via WhatsApp.

Babiy foi presa e cumpriu um ano e sete meses de pena no regime fechado. Mesmo apresentando fotografias na praia e contando com depoimentos de amigos que a acompanharam na viagem, o juiz do caso considerou as imagens que comprovavam ela em outra cidade como "provas imprecisas", pois delas não se poderia extrair data ou horário.

O magistrado a condenou a cinco anos e quatro meses. Babiy ficou fichada por quase três anos até ser absolvida. Ela relatou sua história ao UOL na série Retrato, ao falar sobre judiciário e racismo.

Com base em foto, inocente foi acusado mais de uma vez

Auxiliar de serviços gerais, Douglas Moreira foi preso em 2014 sob acusação de roubar um carro em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Ele foi detido a 39 km do local, no bairro da Tijuca, Zona Norte do Rio.

Ele foi identificado pela vítima, de forma errônea, após a polícia mostrar uma foto de Douglas no Facebook. A história foi relatada em reportagem do UOL.

Douglas apresentou registros do sistema do RioCard, o bilhete eletrônico do transporte público carioca, que provavam que ele estava no ônibus em direção ao bairro da Pavuna no momento do assalto. O tempo mínimo para realizar o trajeto de transporte público é de duas horas.

Só foi solto após 30 dias e, mesmo inocentado, teve a foto mantida no banco de imagens da polícia. Isso o levou à prisão injusta, mais uma vez, por tentativa de homicídio em março de 2015.

Em outro caso, também relatado na reportagem, um suspeito foi identificado em uma foto no celular do policial. O homem já havia sido acusado e inocentado outras três vezes. Todas com base em fotografias. Há ainda casos em que a vítima apontou um suspeito em uma ocasião, voltou à delegacia dias depois e indicou outra pessoa.

STJ absolveu condenado

Na quarta-feira (27), a Sexta Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) absolveu um homem condenado por assalto, em Santa Catarina, com base exclusivamente em reconhecimento por fotografia.

As vítimas do assalto afirmaram que o suspeito teria 1,70m de altura, enquanto o homem que identificaram como o culpado pelo crime tem 1,95m. A Defensoria Pública entrou com pedido de habeas corpus apontando a distorção na altura e afirmando que o réu foi condenado 'com base em reconhecimento fotográfico extrajudicial realizado pelas vítimas'.

A condenação dele havia sido fixada em cinco anos e quatro meses de prisão.

O que precisamos é sair dessa prova oral, dessa comodidade de achar que confessou ou que fez o reconhecimento, acabou. A polícia e o Ministério Público estão desincumbidos de se esforçar e de fazer um esforço argumentativo maior para comprovar os fatos que alega em uma denúncia
Ministro Rogério Schietti Cruz, relator do habeas corpus no STJ