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Homem negro relata agressão após falsa acusação de furto em mercado de MG

Bruno Torquato

Colaboração para o UOL, em Betim (MG)

08/12/2020 10h49Atualizada em 09/12/2020 21h09

O homem negro Alex Júnior Alves de Souza, de 28 anos, relatou que foi agredido e ofendido com expressões racistas por funcionários do supermercado Guaicuí, em Várzea da Palma (MG), no bairro Planalto. De acordo com Alex, em vídeos divulgados pelas redes sociais, ele foi ao local para comprar uma sandália e um frango para o almoço, mas o segurança do local o chamou de ladrão, acusando-o de ter furtado a botina que usava.

O calçado foi adquirido em outro estabelecimento, em versão que também consta no boletim de ocorrência. O caso aconteceu neste final de semana e teve repercussão hoje. Há menos de um mês, em caso semelhante, João Alberto Silveira Freitas foi morto no Carrefour, em Porto Alegre, após uma série de agressões realizadas por seguranças.

Ainda no vídeo, Alex diz que um homem que seria o dono do supermercado, identificado como Rubens, e o segurança do local deram socos na barriga e no rosto e, enquanto ele ainda estava no chão, os dois lhe deram chutes. "Essa agressão não pode ficar assim", disse Alex, no vídeo divulgado.

foto - Reprodução de vídeo - Reprodução de vídeo
Homem negro acusa funcionários e dono de mercado de agressão em MG
Imagem: Reprodução de vídeo

Já no hospital, Alex disse em outra gravação que estava se recuperando das agressões e que foi tratado com racismo. "Me chamando de negro ladrão e ao fato de me arrastarem e terem feito o que fizeram comigo".

Outros clientes que estavam no supermercado Guaicuí registraram o momento da confusão e tentaram impedir a gravação das imagens no local. "Vou chamar a polícia, você quer ser testemunha?", questiona uma funcionária à pessoa que gravava a cena.

Em vídeo exibido pela TV Globo, Alex relata ameaça que foi ameaçado com uma arma: "Ele [dono] pôs a mão na arma, ele ia tirar a arma, só não sei se ia atirar em mim. Ele pegou, pôs a mão para trás e só falou assim 'vamos ali conversar'. O segurança me pegou, me travou por trás, juntou mais uns dois e saiu me arrastando igual a um cachorro, igual a um lixo pelo corredor".

relato - Reprodução/TV Globo - Reprodução/TV Globo
Alex é visto comprando botina em outro mercado, antes da acusação de furto
Imagem: Reprodução/TV Globo

A Polícia Civil informou ao UOL que um procedimento investigatório irá apurar os fatos, mas que até o momento nenhum envolvido foi conduzido à delegacia. Ainda de acordo com a Polícia Civil, a vítima será intimada a comparecer à unidade policial.

Nas redes sociais, os moradores de Várzea da Palma (MG) planejam protestos na porta do supermercado para o próximo sábado, às 10h. "Vamos mostrar que nossa cidade não apoia nenhuma forma de discriminação racial, racismo ou qualquer outro ato discriminatório", diz a descrição do grupo no WhatsApp.

Gerente tentou oferecer a ele compras e trabalho

Em contato com a Polícia Militar, o UOL teve acesso ao conteúdo do Boletim de Ocorrência. Com o relato do fato, o gerente da unidade teria oferecido a Alex Júnior um trabalho e as compras de graça que ele estava fazendo naquele momento.

O Boletim diz que esse fato se deu após funcionários do supermercado irem ao outro estabelecimento e terem constatado que a vítima teria de fato comprado a botina no Supermercado Líder. Ainda de acordo com essas informações, nenhum outro funcionário foi localizado pela Polícia Militar para darem suas versões do fato.

A reportagem tentou contato com o Supermercado Guaicuí por telefone e redes sociais, mas ainda não obteve nenhuma resposta.

Depoimento

O UOL conversou com o advogado Artur Fagundes, que representa Alex, logo após o depoimento ser realizado durante a tarde desta quarta-feira. Ele informou que a Polícia Civil ouviu seu cliente por cerca de duas horas, momento em que Alex contou toda a história

. Os funcionários do supermercado foram representados criminalmente por calúnia, lesões corporais, cárcere privado, injúria racial e racismo. Já o supermercado será processado por danos morais. "O caso ressalta o racismo estrutural. Ele foi pré- julgado e teve um tratamento ríspido antes mesmo de ir ao caixa", relata o advogado.

Ainda sobre os acontecimentos no supermercado, Arthur ressaltou ainda que Alex não foi autorizado a sair pela porta da frente do estabelecimento, mesmo após a confirmação que a botina foi comprada em outro local.

"Ele saiu pela porta dos fundos e esse fato machucou ele muito, pois ele queria sair pela porta da frente, mostrando aos presentes que ele estava certo", disse.