Topo

Batalhão é suspeito de abrigar 'fura fila de vacina' para familiares de PMs

PM médico utiliza jaleco da corporação - Divulgação/PM-SP
PM médico utiliza jaleco da corporação Imagem: Divulgação/PM-SP

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

15/04/2021 15h12Atualizada em 15/04/2021 19h40

Um batalhão da PM (Polícia Militar) no interior de São Paulo é suspeito de ter abrigado um esquema de fraude de aplicação de vacinas contra a covid-19. A corporação iniciou apuração interna para saber se familiares de oficiais foram vacinados irregularmente.

Ao todo, 62 pessoas estão sendo investigadas. A reportagem apurou junto a policiais militares de Assis, cidade a 430 km da capital paulista, que cerca de 20 familiares, entre eles, mulheres de PMs do oficialato do 32º batalhão, localizado no município, furaram a fila da vacina no dia 7 de abril.

Entre 5 e 11 de abril, 145 mil agentes da segurança pública que trabalham no estado foram vacinados. Outros 35 mil não foram vacinados. Sem obrigatoriedade de vacinação, houve uma campanha interna, em alguns batalhões do estado, contra a vacinação em massa.

Além de PMs, foram imunizados na semana passada policiais civis, federais, técnico-científicos, penais, guardas civis metropolitanos, além de agentes da Polícia Rodoviária Federal e da Fundação Casa. O governo paulista não informou os números de vacinados e não vacinados divididos entre as corporações.

PM justifica que frascos devem ser aproveitados

Por meio de nota, a PM afirmou que seguiu todas as recomendações do PNI (Programa Nacional de Imunizações) e do PEI (Plano Estadual de Imunização) para vacinação contra a covid, assim como os protocolos técnicos de ambas as instâncias.

A corporação argumento que os protocolos do PNI e do PEI "preveem o aproveitamento de doses remanescentes em frascos abertos ao fim do expediente de imunização, se houver". A PM reforçou, também, que o Comando de Policiamento do Interior - 8 (Presidente Prudente) instaurou sindicância para apurar a situação.

Familiares não podiam entrar em batalhão

De acordo com a nota de serviço interna da PM sobre as diretrizes da campanha de vacinação para profissionais da segurança pública, assinada pelo subcomandante da corporação, o coronel Marcus Vinicius Valério, foi estabelecido que familiares nem sequer poderiam entrar nos batalhões durante o processo de imunização.

"Como forma de proteger o público-alvo e minimizar riscos de propagação da doença, o acesso aos locais de vacinação será restrito aos profissionais de segurança pública, sendo vedado o comparecimento acompanhado de amigos/familiares/outros nas referidas localidades", descreve a ordem assinada por Valério.

Uma lei assinada pelo governador João Doria (PSDB) em 12 de fevereiro enumera penalidades que podem ser aplicadas caso determinações na campanha não sejam cumpridas. Entre elas, sanções que podem ser impostas por meio de processo administrativo e que incluem multas de R$ 850 a R$ 1.700.

Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Rafael Alcadipani diz que "é completamente inaceitável e inacreditável que se tente criar benefícios para familiares numa situação com muitas pessoas precisando de vacina, numa situação com fila clara". "Isso denota um egoísmo muito grande e necessidade de controle muito mais rígido. Estamos falando de questões de valores de pessoas e de instituições."

Prefeitura de Assis responsabiliza PM

A Prefeitura de Assis enviou ao Ministério Público uma lista com todos os imunizados no batalhão, a pedido da Promotoria. "Urge esclarecer que o município de Assis não participou de nenhum critério ou avaliação de elegibilidade para a vacinação dos profissionais de segurança pública", afirmou a gestão municipal.

Ainda de acordo com a prefeitura, "todo o direcionamento, local e horário, organização da fila, pré-cadastramento e registro no sistema VaciVida ficou de total responsabilidade da Polícia Militar e da equipe da Penitenciária de Assis".

"Coube ao município apenas realizar a aplicação do imunizante em parceria com a Grupo de Vigilância Epidemiológica do Estado, pois a Polícia Militar não tinha profissional qualificado para este fim. Já a Penitenciária de Assis, que dispõe de uma equipe de saúde, realizou a aplicação da vacina de seus servidores", complementou.

MP diz que não há comprovação

Após a publicação da reportagem, a Promotoria disse que "foi instaurado procedimento investigatório para a apuração da conduta no campo da improbidade administrativa e da saúde pública" e que "esclarecimentos foram solicitados".

"Caso comprovadas as ilegalidades, medidas serão adotadas com vistas à responsabilização dos agentes públicos e particulares envolvidos", afirmou. A Promotoria acrescentou que "não foi recebida nenhuma denúncia e que a instauração foi de ofício".