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Após morte de mulher de covid, pai vive saga para registrar bebê no Ceará

Mailson do Nascimento, 33, tenta registrar o filho após morte da esposa de covid-19 - Arquivo pessoal
Mailson do Nascimento, 33, tenta registrar o filho após morte da esposa de covid-19 Imagem: Arquivo pessoal

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

16/06/2021 04h00

O pequeno Taison tinha apenas quatro meses de vida quando sua mãe, Maria Mirele Paula da Silva, 26, adoeceu de covid-19 e morreu, no último dia 7 de março, em Fortaleza.

Hoje aos sete meses, o bebê vive com o pai, mas ainda não tem a certidão de nascimento. O motivo é que não há qualquer prova de que Taison seja filho de Mailson do Nascimento, 33.

Ele conta que morava com Mirele havia um ano e três meses, mas nunca procuraram cartório para registrar a relação.

Quando Taison nasceu, a mãe não estava com a documentação em ordem, e o bebê não pôde ser registrado. "A mãe tinha perdido todos os documentos, só tinha o registro de nascimento, mas estava com a data errada. Por isso não conseguimos registrar o Taison", conta.

Morte após negar internação

Maria Mirele Paula da Silva, 26, morreu no dia 7 de março e deixou o filho, Taison - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Segundo o viúvo, Mirele tinha asma e chegou a procurar um serviço de saúde quando teve os primeiros sintomas da covid-19. "Ela começou a sentir dores no pulmão e foi para a UPA Autran Nunes. Chegando lá, os médicos resolveram interná-la, mas ela não queria por causa do bebê, então voltou para casa", relata ele.

O quadro de Mirele se agravou. Poucos dias depois, com dores, ela foi à UPA mais uma vez. "Os médicos voltaram a dizer que era caso de internação. Desta vez, ela ficou —mesmo não querendo ficar longe do nosso filho. A partir daí, foi intubada e ficou lá até falecer, no dia 7 de março", lembra.

Mailson explica que tentou levar Taison para ser registrado, mas não deu certo.

Fui em um cartório aqui do centro e o cara da portaria falou que só registrava com ordem de um juiz.

Desempregado, Mailson mora no Lagamar, uma comunidade vulnerável em Fortaleza. No conselho tutelar, foi informado que teria de fazer um exame de DNA para que comprovasse a paternidade do menino, caso quisesse registrar o filho.

"Não tenho emprego, minha mãe é que esta me ajudando financeiramente. Faço bico só quando aparece, mas é difícil. Como ia pagar um DNA?"

A outra opção seria que que o avós maternos registrassem o garoto, mas Mailson quer o nome dele no documento do filho.

Constrangimento sem registro

O pai de Taison conta que já se sentiu constrangido ao levar o filho a um serviço de saúde.

"Uma vez tive que levar o neném no posto de saúde aqui do bairro, mas eles pediram o registro para consultar Taison. Perguntaram pela mãe dele, e tive que explicar tudo o que aconteceu. É um constrangimento ter que explicar tudo isso", diz.

Para consegui ter acesso aos serviços, ele conta que um amigo o orientou a fazer um boletim de ocorrência na Polícia Civil para justificar a ausência de documentos. "Fiz esse B.O. no dia 13 de abril. Tenho que levar ele para todo canto quando preciso sair com meu filho. Eu não quero isso, quero o registro", relata.

Apoio da defensoria

Mailson decidiu procurar ajuda jurídica para conseguir registrar o filho pequeno. Segundo Natali Pontes, defensora e supervisora do Núcleo de Atendimento e Petição Inicial da Defensoria Pública do Estado do Ceará, que o acompanha, o caso de Taison deve ser resolvido com um exame de DNA para comprovação de paternidade.

"No caso dele, encaminhamos para que fosse realizado o exame de DNA extrajudicial. Assim, a paternidade será comprovada e poderemos em seguida ingressar com ação para lavratura de registro civil da criança", afirma.

Ela explica que somente os depoimentos de testemunhas iriam gerar uma demora maior no registro do bebê.

"Se for discutir a paternidade sem exame de DNA, teríamos que ingressar com uma ação específica para isso. Aqui temos convênio com o laboratório do estado e podemos fazer o exame de forma gratuita. Acredito que em torno de no máximo um mês teremos o resultado", conta.

Ainda segundo Pontes, a situação de Mailson poderia ser diferente se ele tivesse algum documento que comprovasse que vivia com Mirele.

"Se a mãe é casada com o pai e há certidão de casamento ou de união estável, não há problema de esse pai registrar a criança sozinho. A questão é a mãe ser mãe solteira, ou o homem que se diz o pai do bebê não ter como confirmar o vínculo que mantinha com ela. Sem a comprovação desse vínculo, pode ir logo para o exame de DNA e seguir com a lavratura de registro", finaliza.