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Polícia admite erro, e cientista de dados da IBM preso por 22 dias é solto

O cientista de dados, Raoni Lázaro Barbosa, 34, foi preso injustamente - Arquivo pessoal
O cientista de dados, Raoni Lázaro Barbosa, 34, foi preso injustamente Imagem: Arquivo pessoal

Por Marcela Lemos,

Colaboração para o UOL, no Rio de Janeiro

09/09/2021 17h33

O cientista de dados, Raoni Lázaro Barbosa, 34, foi solto hoje (9), mais de 20 dias após ser preso injustamente. Homem negro, Barbosa foi acusado de integrar uma milícia em Duque de Caxias, cidade da Baixada Fluminense, após a polícia conduzir uma investigação falha e usar uma foto para caracterizá-lo como criminoso.

Raoni é formado em Ciência de Dados pela PUC-Rio, com pós-graduação na FGV (Fundação Getúlio Vargas) e especialização no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos Estados Unidos. Funcionário da multinacional IBM, a situação dele na empresa agora gera incerteza na família.

"Até o momento ele está de licença não remunerada, sem direito a nada. É uma licença que só garante o cargo. Foi muito desesperador não saber quanto tempo ia durar todo esse pesadelo", disse ao UOL, sua esposa Érica de Souza Barbosa, 31, que também precisou pedir licença do estágio de Engenharia de Produção para dar atenção ao caso do marido.

Ao UOL, ela também explicou que a prisão injusta de seu marido, por pouco, não acabou com um dos sonhos do casal. Sem previsão de soltura até então, a festa de casamento marcada para o dia 16 de outubro, e que está sendo preparada há cerca de três anos, corria o risco de ser cancelada.

O cientista de dados, Raoni Lázaro Barbosa, 34, e a esposa Érica de Souza Barbosa, 31. - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
O cientista de dados, Raoni Lázaro Barbosa, 34, e a esposa Érica de Souza Barbosa, 31.
Imagem: Arquivo pessoal

Prisão

Barbosa foi preso no portão de casa na frente dos vizinhos e permaneceu até esta quinta no presídio de Benfica, na zona norte da cidade. Sua prisão fez parte de uma operação da Draco (Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas) realizada no dia 17 de agosto contra integrantes de uma milícia chefiada por quatro policiais militares em Duque de Caxias.

"Acordamos com a campainha. Quando o Raoni chegou no portão, os policiais puxaram ele e o algemaram. Ele estava com o short do pijama ainda. Comecei a dizer que eles estavam errados, onde ele estudou, o que ele fazia, para eles entenderem que estavam cometendo um erro. Depois de muita insistência, eles falaram que o Raoni estava sendo acusado de participação em milícia. Deixaram ele colocar uma bermuda na rua, na frente dos vizinhos. Uma humilhação"
Érica de Souza Barbosa, 31, esposa de Raoni Barbosa

Na ação, o cientista de dados acabou preso no lugar de um outro homem identificado como Raony, com "Y", também conhecido como "Gago". De acordo com a defesa, a foto usada no inquérito é do suspeito, mas a Polícia Civil do Rio prendeu o homem errado.

Segundo a advogada Carolina Altoé, a única semelhança entre os dois é a cor da pele. A advogada conversou com o UOL e classificou a prisão como um erro grosseiro.

"Ingressamos no processo após a audiência de custódia e assim que vimos a foto percebemos que não se tratava da mesma pessoa. O Raoni estava preso desde o dia 17 e três dias depois não tinham feito um reconhecimento pessoal dele ainda. Além disso, não há previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro por reconhecimento por foto. Os tribunais superiores têm entendido que a fotografia pode fazer parte do inquérito, mas não pode ser o único elemento para determinar a prisão nesses termos".
Carolina Altoé, advogada de defesa

Mesmo diante das falhas no inquérito policial, a prisão de Raoni foi mantida na audiência de custódia, que ocorreu no dia 20 de agosto. Ele também teve um habeas corpus negado no último dia 3 de setembro. A decisão pela soltura dele só ocorreu após a Polícia Civil do Rio reconhecer o equívoco na prisão.

Procurada, a Draco informou que vai instaurar uma sindicância interna, já que "a orientação da atual gestão da Secretaria de Estado de Polícia Civil (Sepol) é de que o reconhecimento fotográfico é um dos elementos do inquérito policial e não pode ser o único fator determinante para pedir a prisão de suspeitos".

A Draco informou ainda que a prisão de Barbosa era temporária, de 30 dias, e que o pedido de renovação não será solicitado.

"Não investigaram esse caso, pois se tivessem investigado o mínimo, saberiam que não se trata da mesma pessoa. Já pensou se meu marido não tivesse carteira assinada, não fosse funcionário de uma multinacional? Quantas pessoas ficam presas injustamente?", conclui Erica.