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Apesar de inconstitucional, 21 analfabetos se inscrevem para eleições 2020

Getty Images
Imagem: Getty Images

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

28/09/2020 20h22

Vinte e um candidatos se inscreveram e se registraram como analfabetos para as eleições municipais de 2020. Eles são inelegíveis segundo a Constituição Federal, mas, caso tenham "capacidade mínima de escrita e leitura", podem comprovar o mérito à Justiça Eleitoral e concorrer.

O levantamento foi feito pelo UOL com dados disponibilizados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até a manhã desta segunda (28). Segundo os registros, 20 tentam vagas em Câmaras Municipais em todas as regiões —entre eles, um busca a reeleição— e um é postulante a vice-prefeito. TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) têm até 26 de outubro para analisar os casos.

Ao todo, são candidaturas em 20 municípios de 14 estados: Baturité (CE), Brumado (BA), Caracari (RR), Careiro da Várzea (AM), Catende (PE), Centenário do Sul (PR), Cordeiro (RJ), Getulina (SP), Itaúna (MG), Jacareacanga (PA), Japurá (AM), Maranhãozinho (MA), Mogi Guaçu (SP), Queimadas (PB), Santana do Ipanema (AL), São Domingos (GO), Tarauacá (AC), Tucumã (PA) e Viçosa do Ceará (CE). Monte Alegre (PA) teve o registro de um candidato a vice-prefeitura.

João Mamede dos Santos (PDT), conhecido como João Boeiro, já exerce o mandato de vereador em Viçosa do Ceará, a 350 km de Fortaleza. O UOL tentou entrar em contato, mas não teve sucesso até a publicação deste texto. À reportagem, o TRE-CE (Tribunal Regional do Ceará) afirmou que seu registro, preenchido pelo partido, consta como "lê e escreve", ou seja, estaria dentro da regra eleitoral.

Sem diploma, é preciso comprovar que sabe ler e escrever

Segundo o artigo 14 da Constituição Federal, que trata dos direitos políticos, analfabetos e inalistáveis são inelegíveis. Para facilitar o processo, os TREs exigem um comprovante de escolaridade. Caso o candidato não tenha, ele pode provar que sabe ler e escrever.

"O candidato tem a oportunidade de provar ao juiz eleitoral que, mesmo que não tenha nenhum diploma, tem o mínimo de compreensão de leitura e escrita, é um direito do cidadão. Se o juiz tiver dúvidas, o TRE pode ainda aplicar uma prova", afirma o advogado eleitoral Alberto Rollo, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Um caso famoso é do deputado federal Tiririca (PL-SP), que, acusado pelo MPE (Ministério Público Eleitoral) de ter forjado seu registro eleitoral nas eleições de 2012, foi ao STF (Supremo Tribunal Federal), em 2013, provar que sabia ler e escrever.

Essa questão foi pacificada pelo TSE em acórdão em 2018. "Sempre que o candidato possuir capacidade mínima de escrita e leitura, ainda que de forma rudimentar, não poderá ser considerado analfabeto para fins de incidência da inelegibilidade em questão", decidiu o tribunal.

Até a manhã desta segunda, 17.053 candidatos (3% do total) se registraram como "Lê e escreve".

Casos ainda serão analisados, dizem TREs

Por lei, os TREs têm até o dia 26 de outubro para julgar todos os pedidos de candidatura. Ao UOL, os tribunais com registro de candidaturas como analfabetos responderam que casos ainda serão analisados e, caso seja comprovado que não sabem ler e escrever, vão ser indeferidos.

"Após o registro de candidatura, cada juiz eleitoral irá analisar e decidir se a pessoa é elegível ou não. Assim é possível haver registro de candidaturas de pessoas analfabetas, mas que terão a elegibilidade julgada pelo juiz eleitoral, ou seja o parágrafo 4º do Artigo 14 da Constituição permanece em vigor", afirmou o TRE-PR (Tribunal Regional Eleitoral do Paraná).

"Tem situações em que o candidato não apresenta a prova da escolaridade, ainda que declare, no RRC [Requerimentos de Registro de Candidatura], grau de instrução diverso de analfabeto. Havendo necessidade de comprovação, pode ser aferida a alfabetização, via de regra, com a aplicação do teste", declarou o TRE-MG (Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais).

"Caso em questão pode ter sido um equívoco no ato do preenchimento do formulário. Por conta disso, a pessoa, que não apresentou comprovante de escolaridade, foi convocada para uma prova, na qual essa questão poderá ser devidamente esclarecida", afirmou o TRE-RR (Tribunal Regional de Roraima).