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Comerciantes de Roma dizem que Bento 16 será lembrado como "o papa que não vende"

Patrícia Araújo

Do UOL, em Roma

10/03/2013 10h26

Enquanto analistas e teólogos de todo o mundo discutem sobre como o papa emérito Bento 16 ficará conhecido ao longo da história após ter tomado uma decisão inimaginável nos últimos 600 anos, comerciantes que vivem da imagem do sumo pontífice ao redor do Vaticano já sabem exatamente como Joseph Ratzinger será lembrado: “o papa que não vende”.

Nas vitrines de quase todas as pequenas lojas que margeiam as colunas da imponente praça de São Pedro, é possível ver o rosto do alemão que assumiu o mais alto posto da Igreja nos últimos oito anos.

Mas os acenos e o sorriso esforçado de Ratzinger, segundo os comerciantes, não conquistaram os católicos. Mesmo a reviravolta em seu pontificado causou um impacto efêmero na trajetória de vendas “insossas” dos artigos com a cara do sacerdote.

“Vendemos vários souvenires dele só nas duas semanas após o anúncio da renúncia. Agora, tudo voltou a ser como antes, ninguém procura. Ele não foi um papa amado pelo povo”, afirma Everton Nascimento de Jesus, brasileiro de 31 anos que há cinco anos trabalha como gerente na loja de artigos religiosos situada no número 42 da via della Conciliazione, principal acesso ao Vaticano. De acordo com ele, as vendas estão tão ruins que, quando o atual estoque com produtos de Bento 16 se acabar, nada deverá ser reposto.

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Poucos metros dali, em outra loja da mesma via, a vendedora Giuliana Moretti, de 28 anos, confirma o desencanto dos turistas com os artigos relacionados a Ratzinger. “Ele não foi adorado, não tinha muito carisma.

Ninguém compra as coisas dele. Após a renúncia, vendemos um pouco, mas só por alguns dias.” Giuliana conta que, na loja em que trabalha, é grande a procura por santinhos, postais, medalhas e crucifixos, mas todos com a imagem do polonês Karol Wojtyla. “Quem vende mesmo ainda é o João Paulo [2º]. Todo mundo é apaixonado por ele.”

João Paulo pop

Há 18 anos trabalhando no caixa da loja localizada no número 283 do Corso Vitorio Emanuele II, via próxima ao Vaticano, Monica Amitrano diz que os comerciantes de Roma tentaram aproveitar a renúncia de Bento 16 para “desovar” artigos do pontífice que estavam encalhados desde o início do papado.

“Todos colocaram postais do papa na porta das lojas, mas infelizmente isso não aumentou as vendas. Não sei porquê, mas ele nunca vendeu", diz Monica.

Ela fala que, a cada 15 artigos de João Paulo 2º vendidos, apenas um de Bento 16 sai da loja. "João Paulo salva as nossas vendas. Mesmo antes da beatificação [em maio de 2011], as pessoas procuravam por imagens dele. Para muita gente, ele ainda é o papa."

Além de João Paulo 2º, os comerciantes dizem acreditar que o próximo papa deverá ser um sucesso de vendas. “Tem muito falatório ao redor desse novo papa. Tenho certeza que ele vai vender”, conta o brasileiro Nascimento de Jesus.

A expectativa é tanta que, de acordo com ele, quase todas as lojas da região já fecharam enormes encomendas com as fábricas de souvenires da Itália. “No dia seguinte ao anúncio do novo papa, já teremos material dele aqui na loja para vender.”

Papa incompreendido

Porém, para a vendedora Cinzia Caselli, funcionária da livraria Dom Bosco, famosa na região do Vaticano, ainda “há uma chance” para Joseph Ratzinger.

Segundo ela, nos últimos meses, muitos italianos têm procurado pelas obras escritas por Ratzinger. “Os livros Jesus de Nazaré e A Infância de Jesus [publicados em português pela editora A Esfera dos Livros] têm vendido bastante.”

Cinzia diz acreditar que as pessoas estão começando a se questionar os motivos que teriam levado o papa e renunciar e passaram a ficar curiosas com relação a Ratzinger. Esse interesse, para ela, ainda pode impulsionar as vendas, ao menos, dos livros do papa emérito. “Sempre vai existir uma curiosidade sobre [Bento 16]. Ele foi um papa incompreendido.”