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Crimeia é "buraco negro" para jornalistas, diz ONG

Homens armados sem identificação checam a documentação de jornalistas em Simferopol, na Crimeia - David Mdzinarishvili
Homens armados sem identificação checam a documentação de jornalistas em Simferopol, na Crimeia Imagem: David Mdzinarishvili

Leandro Prazeres

Do UOL, em São Paulo

21/03/2014 06h01

Pelo menos 90 ataques a jornalistas foram cometidos na região da Crimeia desde o início da invasão russa, afirmou a ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF). Há pelo menos dois jornalistas desaparecidos.

Em entrevista concedida ao UOL, o chefe da seção para Leste Europeu e Ásia da entidade, Johann Bihr, disse que a Crimeia é hoje um "buraco negro" de informação onde jornalistas estão submetidos a todo tipo de violações.

A Crimeia é uma península localizada no leste ucraniano. Pertencia à União Soviética até 1954, quando foi "dada" de presente para a Ucrânia.

Após a deposição do ex-presidente ucraniano Viktor Yanukovich, em 28 de fevereiro, homens armados sem identificação, mas apontados como sendo russos, tomaram o controle de aeroportos, instalações militares e prédios onde funcionam órgãos de imprensa.

De acordo com Bihr, a situação é grave.

“A Crimeia é, hoje, uma região sem lei controlada por bandos armados. Ela se transformou em um buraco negro de informação, a despeito da presença de muitos jornalistas estrangeiros”, disse Bihr.

O representante da RSF afirma que, desde a invasão, os canais de TV ucranianos foram desligados e a população local passou a ter acesso apenas às emissoras russas.

“A população está completamente carente de informações isentas”, disse.

Segundo um relatório pela ONG ucraniana Instituto de Informação de Massa (IMI), obtido pelo UOL, os ataques a jornalistas envolvem sequestros, detenções, tortura e outros tipos de agressões. De acordo com o relatório, pelo menos um jornalista já morreu desde que os protestos na Ucrânia e a invasão da Crimeia começaram.

“As violações na Crimeia são graves. Há duas semanas, dois jornalistas desapareceram. Eles reapareceram dias depois, após terem sido presos e torturados. Além deles, há dois jornalistas cidadãos que estão desaparecidos. Ainda não sabemos se eles desapareceram pelo trabalho que exerciam como repórter ou pelo ativismo político”, disse Bihr.

O representante da RSF diz que a violência física e a censura a jornalistas têm atingido tanto os profissionais ucranianos quanto os estrangeiros.

“Temos relatos de profissionais da BBC, de emissoras e veículos da Bulgária e Turquia, que nos informaram terem sido vítima de algum tipo de violência”, afirma.

O histórico de repressão à liberdade de expressão na Rússia também preocupa a entidade. Regularmente, a RSF divulga um ranking em que os países são classificados de acordo com as condições de trabalho e liberdade para jornalistas. A Rússia está na posição 148º posição, em um ranking que tem 180 países.

“Eles [os russos] estão numa situação muito ruim e a extensão do poder deles sobre a Ucrânia deixa a gente ainda mais preocupado. Estamos pedindo às autoridades russas que, pelo menos, reestabeleça a ordem  na Crimeia para que violações aos direitos de liberdade de expressão possam ser investigadas e punidas”, afirma.

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No início do mês, a apresentadora de uma TV estatal russa pediu demissão no ar alegando não concordar com a linha editorial da emissora, contrária às manifestações populares na Ucrânia.

Vídeo

Apesar de a situação na Crimeia ser mais grave, Bihr disse que, na Ucrânia, o quadro também inspira cuidados. Ele se disse indignado com o vídeo em que o presidente da TV estatal ucraniana, Oleksandr Panteleymonov, aparece sendo ameaçado e agredido por pelo menos três parlamentares do país que o obrigam a assinar uma carta de renúncia.

O ataque ocorreu porque o grupo considerou que a cobertura da TV sobre os protestos do início do ano e a invasão da Crimeia tinham um viés pró-Rússia.

“O que aconteceu lá foi intolerável. Já pedimos ao governo da Ucrânia que destitua Igor Miroshnichenko da Comissão de Liberdade de Expressão, da qual ele faz parte”, disse.