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Promotor argentino que denunciou Cristina Kirchner é achado morto

Nisman era o autor da denúncia contra a presidente Cristina Kirchner - Marcos Brindicci/Reuters
Nisman era o autor da denúncia contra a presidente Cristina Kirchner Imagem: Marcos Brindicci/Reuters

Do UOL, em São Paulo

19/01/2015 08h43Atualizada em 19/01/2015 10h46

O promotor argentino Alberto Nisman, 51, foi encontrado morto em sua casa, no bairro de Puerto Madero, em Buenos Aires, em circunstâncias ainda não esclarecidas, mas que apontam para o suicídio. Ele era o autor da denúncia contra a presidente Cristina Kirchner por suposto acobertamento de uma investigação contra o Irã sobre o ataque a bomba contra a sede da Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em 1994, que deixou 85 mortos e mais de 300 feridos.

A promotora Viviana Fein, que investiga a morte de Nisman, confirmou que o corpo foi achado, com um tiro na cabeça, pela mãe dele no banheiro do apartamento, apenas algumas horas antes de ele comparecer ao Congresso para detalhar a denúncia que atinge Cristina e vários de seus colaboradores.

A mãe foi avisada pelos seguranças pessoais do procurador, um grupo de dez agentes da polícia, que ele não respondia aos insistentes telefonemas e à campainha de seu aparamento, em um edifício com segurança particular. Ao tentar entrar, a mãe do procurador constatou que a porta estava fechada com a chave colocada na fechadura por dentro. Os familiares pediram ajuda a um chaveiro para entrar no apartamento.

Fein confirmou ainda que uma arma calibre 22 foi encontrada no local, mas pediu "cautela" e "prudência" até que a investigação seja concluída.

"No início da noite, a mãe entrou na casa acompanhada por um dos seguranças, encontrando o corpo de Nisman no interior do banheiro de seu quarto, bloqueando a porta de entrada ao mesmo". "Junto ao corpo de Nisman, que estava no chão, foi encontrada uma arma de fogo calibre 22, além de uma cápsula de bala", indicou.

O corpo do procurador foi levado ao necrotério para que a causa de sua morte seja estabelecida.

Em breve comunicado, o chefe de Gabinete do governo argentino, Jorge Capitanich, afirmou que "o juiz tem todo o apoio por parte das forças de segurança para garantir o esclarecimento deste fato doloroso". Já o secretário-geral da presidência, Aníbal Fernández, disse que é preciso analisar "o que há revelado nos expedientes" e que um novo promotor "vai ter todos os elementos nas mãos para continuar com a investigação".  "Me dói terrivelmente que tenha ocorrido isto. Agora o importante é que sigam adiante as investigações", declarou. 

Denúncia

Nisman tinha se tornado o centro da atenção política nos últimos dias após denunciar a presidente e vários de seus colaboradores por "encobrimento agravado, descumprimento de dever de funcionário público e estorvo do ato funcional". 

A denúncia atinge também o chanceler, Héctor Timerman, o deputado governista Andrés Larroque, os militantes Luis D'Elia e Fernando Esteche, pessoal da secretaria de Inteligência da presidência argentina, o ex-promotor federal e ex-juiz de instrução Héctor Yrimia e o referente comunitário iraniano Jorge "Yussuf" Khalil.

Nisman contava com gravações de conversas telefônicas entre as autoridades iranianas e agentes de inteligência e mediadores argentinos que, segundo ele, demonstrariam que a Argentina assinou em 2013 um acordo com o Irã para encobrir os suspeitos do atentado contra a Amia em troca de impulsionar o comércio bilateral e a troca de petróleo por grãos, em um contexto de crise energética no país sul-americano.

O governo negou a denúncia, chamando-o de mentiroso e atribuindo a atuação de Nisman a conflitos internos na Secretaria de Inteligência. Segundo a gestão Kirchner, o acordo bilateral com o Irã era para investigar os acusados de planejar o ataque. Cinco ex-funcionários iranianos, entre eles um ex-presidente, atuais ministros e líderes religiosos locais, têm uma ordem de captura internacional da Interpol a pedido da justiça argentina.

A acusação de Nisman, designado por Néstor Kirchner como procurador especial para o caso Amia em 2004, um ano após a anulação de um julgamento por irregularidades na investigação, foi o último confronto de uma série de embates entre funcionários de alto escalão e a justiça argentina sobre o esclarecimento deste atentado.

Nisman havia pedido também um embargo preventivo de bens no valor de 200 milhões de pesos (US$ 23 milhões) de Kirchner, de Timerman e de outros funcionários. 

A denúncia foi recebida com cautela por grupos da comunidade judaica, embora ao longo da semana tenham pedido que as provas que Nisman tinha fossem divulgadas. Já a oposição esperava conhecer hoje novos detalhes durante o pronunciamento de Nisman no Congresso.

A deputada opositora Patricia Bullrich, uma das primeiras a ir à casa de Nisman após saber de sua morte, afirmou à imprensa que falou três vezes com o promotor no sábado (17) e que ele mencionou que havia recebido várias ameaças. "Disse que se sentia tranquilo e contou que explicou a situação a sua filha de 15 anos", disse ao canal C5N.

Para a audiência desta segunda-feira o procurador solicitava que seu comparecimento ocorresse em particular, mas parlamentares governistas exigiam que a audiência fosse pública e transmitida pela televisão.

"Um promotor morto antes de fazer um relatório ao Congresso em uma causa onde há terrorismo internacional me parece de uma enorme gravidade", disse Bullrich.

O atentado contra a Amia aconteceu no dia 18 de julho de 1994, dois anos depois que uma bomba explodiu em frente à embaixada de Israel em Buenos Aires causando 29 vítimas fatais. A investigação e a comunidade judaica atribuem ao Irã e à organização Hezbollah o planejamento e execução de ambos os atentados. (Com agências internacionais)