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Poucos escutam um jihadista que pede perdão ao voltar para casa

Jihen Laghmari e Caroline Alexander

14/01/2016 16h05

Foram necessárias poucas semanas de combates brutais para que Ahmed percebesse que a viagem desde sua casa de classe operária na capital da Tunísia até os campos de batalha da Síria tinha sido um erro.

Radicalizado em uma mesquita clandestina de Túnis, Ahmed, à época com 24 anos, recebeu ajuda de militantes que conheceu nas redes sociais para entrar na Síria. Com o auxílio deles, ele atravessou fronteiras no início de 2013 a caminho de aldeias controladas pelos jihadistas. Ele diz que esperava defender muçulmanos presos a uma guerra civil, mas em vez disso se viu entre seus opressores.

"Eu vi com meus próprios olhos como grupos armados como Ahrar al-Sham e Frente Al-Nusra matam e aterrorizam civis sem motivo, especialmente mulheres e crianças, apenas para intimidar os moradores e controlar cidades", disse Ahmed. Ele pediu que seu nome verdadeiro não fosse revelado e respondeu às perguntas por meio de seu advogado. "Quem rejeita ordens ou tenta ir embora é morto. Sair da Síria vivo foi como nascer de novo", disse.

De volta a Túnis, onde tenta passar inadvertido para escapar das buscas policiais, Ahmed está no centro de um debate sobre como lidar com os combatentes que retornam --uma discussão que poderá em breve ecoar por toda a Europa, pois 30 mil estrangeiros viajaram à Síria e ao Iraque. Isso coloca os ativistas que pedem uma ênfase maior na reabilitação frente a frente com os políticos que temem serem vistos como fracos diante do terrorismo.

Raro sucesso

Os atentados contra turistas e forças de segurança arranharam a imagem construída pela Tunísia de país da Primavera Árabe que evitou a espiral de violência e realizou eleições bem-sucedidas --uma transição recompensada com o prêmio Nobel da Paz. O que agrava o problema é o total estimado de 3.000 tunisianos que viajaram para lutar em zonas de guerra.

O governo declarou estado de emergência e está cercando parte de sua fronteira com a Líbia, onde, segundo as agências de inteligência, foram planejados ataques a um museu de Túnis e a uma estância balneária. A medida não será suficiente, dizem aqueles que propõem um projeto de lei que daria um futuro a homens como Ahmed.

"Não se pode combater o terrorismo com violência, prisão e insultos", disse Mohammad Iqbal Ben Rajab, presidente da Associação para o Resgate de Tunisianos Presos no Exterior. "Sem uma estratégia clara, a maior parte dos que retornam se transformará em bombas-relógios e em células adormecidas".

Os políticos ainda estão debatendo um plano de anistia elaborado no ano passado, mas que não foi apresentado ao Parlamento. Ridha Sfar, ministro que estava no comando da segurança no Ministério do Interior até fevereiro passado, diz que a Lei do Perdão e do Arrependimento permitiria que os que retornam e não têm as mãos "manchadas de sangue" recebessem penas de detenção reduzidas em troca da participação em programas de reintegração.

'Mesmos erros'

"Muitos jovens tunisianos que sofreram uma lavagem cerebral pela máquina midiática do Daesh, com a promessa de dinheiro, mulheres e armas, se arrependem do que fizeram", disse Samir Ben Amor, ex-assessor presidencial que é também advogado de Ahmed, usando a sigla árabe para Estado Islâmico, o maior grupo jihadista da Síria. "É preciso fazer uma distinção entre os que representam um perigo para o Estado e os que não".

Os opositores da anistia dizem que ela corre o risco de repetir os erros cometidos pela Tunísia há alguns anos.

Após os distúrbios de 2011 que derrubaram o presidente Zine El Abidine Ben Ali, os islamistas presos foram perdoados, incluindo radicais que buscavam impor sua interpretação do Islã em um dos estados mais seculares do mundo árabe.

"Essas pessoas que dizem estar arrependidas são, antes de tudo, nossas inimigas e precisam ser consideradas prisioneiras de guerra que se renderam", disse o ministro das Relações Exteriores, Taieb Baccouche. "Não podemos, pela causa da paz, limpar a ficha delas sob o pretexto de que elas simplesmente se perderam no caminho. Não podemos repetir o erro de fevereiro de 2011".