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Ministro e chefe da polícia são destituídos após morte em protesto contra reeleição no Paraguai

Retrato de Rodrigo Quintana é colocado junto ao local onde foi morto, na sede do Partido Liberal, em Assunção, no Paraguai - Marcos Brindicci/Reuters
Retrato de Rodrigo Quintana é colocado junto ao local onde foi morto, na sede do Partido Liberal, em Assunção, no Paraguai Imagem: Marcos Brindicci/Reuters

Do UOL, em São Paulo

01/04/2017 16h33

O ministro do Interior, Tadeo Rojas, e o comandante da polícia, Críspulo Sotelo, foram destituídos na tarde deste sábado (1º), depois que uma pessoa foi morta durante protestos contra a aprovação de uma emenda constitucional permitindo a reeleição presidencial no Paraguai. 

Além disso, quatro policiais foram detidos em conexão com a morte, segundo uma fonte do ministério.

Os enfrentamentos iniciados na tarde da sexta-feira causaram danos ao Congresso por furiosos manifestantes opositores, que derrubaram grades, portões, quebraram janelas e atearam fogo em várias partes do edifício. Ao menos 30 pessoas ficaram feridas e mais de 200 foram detidas.

Entre os feridos pelo impacto das balas de borracha está o próprio presidente do Congresso, o opositor Roberto Acevedo; o titular do Partido Liberal, Efraín Alegre; e o deputado liberal Edgar Acosta, atingido na boca por um projétil.

O presidente da Juventude Liberal, Rodrigo Quintana, 25, morreu depois da violenta entrada da polícia na sede deste grupo político durante a madrugada. Segundo o hospital para onde foi levado, ele foi atingido por nove disparos, a maioria nas costas.

Lorenzo Lezcano assumiu como novo ministro do Interior e Luis Carlos Rojas, como comandante da Polícia, prometendo investigar as circunstâncias da morte do jovem e punir os responsáveis.

Em nota, o presidente Horacio Cartes afirma que realizou essas mudanças "considerando os últimos eventos no âmbito da segurança e perante a ordem expressa de extremar cuidados para evitar excessos no uso da polícia".

Dentre os quatro policiais detidos, o principal é o suboficial Gustavo Florentín, quem já confessou aos superiores que havia atirado contra Quintana, de acordo com a fonte do ministério.

A fonte indicou que a investigação foca agora em saber como Florentín, da unidade antidistúrbios da polícia, portava uma arma carregada com "balas de chumbo em vez de balas de borracha", já que a legislação obriga que esta equipe utilize munição não letal.

Os quatro detidos prestam depoimento à promotoria encarregada do caso e ficarão em prisão preventiva em Assunção.

1.abr.2017 - Uma dos centenas de manifestantes que protestaram no Congresso em chamas no Paraguai após aprovação da reeleição - Cesar Olmedo/AFP - Cesar Olmedo/AFP
Uma dos centenas de manifestantes que protestaram no Congresso em chamas no Paraguai após aprovação de projeto de reeleição
Imagem: Cesar Olmedo/AFP


O sábado amanheceu calmo, com centenas de policiais ao redor do edifício legislativo, enquanto militares reforçaram a guarda no Palácio do Governo, a duas quadras de distância.

Reeleição

O oficialismo busca abrir as portas para a reeleição, mas a oposição rejeita esta ideia e quer que seja mantido um único mandato presidencial, como determina a Constituição de 1992.

A um ano da eleição presidencial, a reforma permitiria que o atual presidente conservador, Horacio Cartes, no poder desde 2013, se candidatasse a um novo mandato, assim como o ex-presidente de esquerda Fernando Lugo, ex-bispo católico destituído após um julgamento político.

Uma maioria de 25 senadores, de um total de 45, aprovou nesta sexta-feira o projeto de emenda constitucional, e, neste sábado, o mesmo deveria ser ratificado pela Câmara dos Deputados, mas a sessão foi suspensa após as confusões.

A votação foi realizada em um gabinete do Senado, pois o salão plenário estava ocupado por senadores do opositor Partido Liberal, que se opõem à reforma.

Sob gritos de "Ditadura nunca mais", centenas de opositores entraram no edifício legislativo após a destruição de portões, grades e janelas, e provocaram um incêndio.

No interior do Congresso, saquearam os gabinetes dos senadores que apoiaram a emenda.

1.abr.2017 - Prédio do Congresso do Paraguai após incêndio - Roberto Duarte/AFP - Roberto Duarte/AFP
Prédio do Congresso do Paraguai após incêndio
Imagem: Roberto Duarte/AFP

Referendo

Depois da longa ditadura do general Alfredo Stroessner, a Constituição de 1992 proibiu a reeleição presidencial, a fim de proteger o Paraguai de um presidente que tentasse se agarrar ao poder.

A Câmara dos Deputados, onde o governo possui ampla maioria, também deve aprovar o projeto de reforma. O passo seguinte é um chamado a um referendo pelo tribunal eleitoral em um prazo de três meses.

"Não faremos sessão no sábado. Me impressiona o que está acontecendo. Me afeta muito. Espero que a calma e a concórdia voltem", disse o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Velázquez, em uma mensagem transmitida pela televisão.

O presidente do Senado, Roberto Acevedo, afirmou que a votação de sexta-feira "é inconstitucional" e pediu à Suprema Corte de Justiça que a invalide.

"Queremos que os cidadãos decidam se querem ou não a reeleição por meio de um referendo", disse a senadora Lilian Samaniego, presidente do oficialista Partido Colorado, horas antes dos confrontos.

Os opositores consideram a aprovação da emenda constitucional um "golpe parlamentar", e fizeram um pedido ao povo "para resistir com todas as formas ao nosso alcance".

À noite, Cartes qualificou de "bárbaros" os manifestantes e responsabilizou os fatos a "um grupo de paraguaios metidos na política e nos meios de comunicação para conseguir o objetivo de destruir a democracia e a estabilidade política e econômica".

Em seu Twitter, Cartes escreveu: "A democracia não se conquista nem se defende com violência", e ratificou a vigência do "Estado de Direito".