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No Memorial do Holocausto, sobrevivente coloca em dúvida a bondade humana

memorial do holocausto 2 - Divulgação - Divulgação
Memorial do Holocausto apresenta reprodução de fachada de uma loja com identificação de "judeu" feita por nazistas
Imagem: Divulgação

Edilson Saçashima

Do UOL, em São Paulo

09/11/2017 04h00

Um jovem polonês é levado pelos nazistas e passa por cinco campos de concentração antes de conseguir a liberdade ao final da Segunda Guerra Mundial. Mais de 70 anos depois, um grupo de estudantes visita uma exposição e conhece os horrores cometidos pelos nazistas. No Memorial do Holocausto, em São Paulo, as duas gerações se encontram. No local, os alunos se deparam com uma frase de Anne Frank: "Apesar de tudo, ainda acredito na bondade humana". Já aquele jovem, hoje com 93 anos, não titubeia em definir: o homem não é bom.

O espaço que ocupa um andar do Memorial da Imigração Judaica, no centro da capital paulista, sintetiza a ascensão do nazismo, a perseguição, deportação e extermínio dos judeus.

Para o sobrevivente do Holocausto, Julio Gartner, o polonês que passou por cinco campos de concentração, inclusive Auschwitz, o que mais se destaca em tudo que é exposto é um painel com fotografias de identificação dos prisioneiros. "Eu olho muito para esses prisioneiros [...] e vejo o horror que está em seus rostos. Isso é o que mais me toca. É um pavor que existe só em uma pessoa sabendo que praticamente está condenada à morte. São inocentes sabendo que estão sendo condenados à morte", diz ao UOL.

Para os estudantes, uma das primeiras imagens do memorial é uma réplica da entrada do campo de concentração de Auschwitz e a frase "Arbeit macht frei" ("O trabalho liberta", em alemão). "Perceberam a letra B de cabeça para baixo? O letreiro foi feito por ferreiros que estavam presos no campo de concentração. Eles queriam alertar quem chegava que algo estava errado ali", diz o rabino Toive Weitman ao grupo de alunos no dia que a reportagem do UOL esteve no local.

8.nov.2017 - Réplica do letreiro da entrada do campo de concentração de Auschwitz no Memorial do Holocausto, em São Paulo - Divulgação - Divulgação
Réplica do letreiro da entrada do campo de concentração de Auschwitz no Memorial do Holocausto, em São Paulo
Imagem: Divulgação

Em silêncio, os alunos acompanham a explicação de Weitman sobre antissemitismo, Holocausto, genocídio. Em alguns momentos, se refere a filmes para os estudantes identificarem o drama das vítimas. "Vejam 'O Pianista'", afirma.

Em outros momentos, incentiva o grupo a tocar em alguns objetos. "Vejam, podem tocar. Era com isso que os prisioneiros tinham que se proteger mesmo nas noites de inverno na Europa", diz Weitman apontando para um fino tecido usado como cobertor colocado em um beliche que simula o dormitório nos campos de concentração. "Nesse espaço dormiam 7 a 10 pessoas", diz Weitman.

O rabino é diretor do Memorial da Imigração Judaica. A entidade concluiu que o Holocausto ainda era pouco conhecido entre os brasileiros, principalmente entre os mais jovens. É daí que surgiu a proposta de se criar a exposição permanente sobre o Holocausto. "Fundado há um ano, o Memorial [da Imigração Judaica] já recebeu a visita de mais de 8 mil alunos de escolas públicas e privadas, entre 12 e 16 anos, que demonstraram pouco conhecimento histórico sobre o tema, nos inspirando a organizar esta mostra", diz Weitman.

Ao final da exposição, Weitman fala aos alunos sobre a ameaça da extrema-direita hoje, mas também afirma que há leis internacionais que impediriam o surgimento de um novo Holocausto.

O cineasta Marcio Pitliuk tem outra opinião. "Sempre existe o risco de ter um novo Holocausto, se não ficar atento aos malucos", diz. Pitliuk, junto com Caio Cobra, realizou o documentário "Sobrevivi ao Holocausto", que conta a história de Gartner.

Como Gartner, Pitliuk não acredita que o ser humano seja bom. "Ele é violento e ruim", diz.

O Holocausto provocou a morte de mais de 6 milhões de pessoas, incluindo 1,5 milhão de crianças. Anne Frank foi uma das vítimas, morta aos 15 anos de idade. Recentemente, a imagem da jovem foi usada por torcedores radicais da Lazio, na Itália, junto com frases racistas e antissemitas, para insultar os rivais.

"Existe muita intolerância no mundo todo hoje. E é preciso diminuir essa intolerância", diz Gartner.

Serviço

O Memorial do Holocausto será inaugurado para o público em geral no domingo, 12 de novembro. Neste dia funcionará das 10h às 17h. Será o único domingo em que ele estará aberto. Após a inauguração, o Memorial irá funcionar de segunda-feira à quinta-feira, das 10h às 17h e sexta-feira, das 10h às 15h.

O endereço é Rua da Graça, 160, em São Paulo.

Gartner e Pitliuk fazem palestras em escolas e universidades para falar do Holocausto.