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Com data para encontro, Kim tem razões para duvidar de acordo duradouro com Trump

Foto: KCNA VIA KNS / AFP
Imagem: Foto: KCNA VIA KNS / AFP

Do UOL, em São Paulo

12/05/2018 04h00

A decisão do presidente de se retirar do acordo nuclear, que estava sendo cumprido, envia um sinal problemático a Pyongyang. Em pleno degelo, Kim Jong-un tem agora todos os motivos para duvidar da sinceridade americana.

As últimas atitudes do governo dos Estados Unidos poderiam ser objeto de estudo sobre dissonância cognitiva para estudantes de psicologia. Apenas algumas horas após Donald Trump anunciar que se retirava do acordo nuclear com o Irã, o secretário de Estado Mike Pompeo chegava a Pyongyang para tratar do futuro encontro de seu presidente com o ditador Kim Jong-un.

Pompeo levava consigo a seguinte mensagem: se vocês abandonarem as armas nucleares, aliviaremos as sanções e não os atacaremos. Mas, para o regime norte-coreano, cuja desconfiança em relação a Washington já é bastante aprofundada, o rompimento norte-americano com o acordo nuclear não chegou a surpreender.

Especialistas em política norte-americana também criticaram a decisão de Trump. Anthony Blinken, que trabalhou como vice-secretário de Estado no governo Barack Obama, questionou se Kim vai ou não confiar nos negociadores norte-americanos, após Trump "rasgar arbitrariamente um acordo" que estava sendo cumprido.

"É um forte aviso para todo o mundo: acordos são reversíveis e podem ter data de validade, enquanto as armas nucleares podem oferecer garantias mais duradouras", diz Vipin Narang, professor de ciência política no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusets).

A cúpula entre Trump e Kim, prevista para 12 de junho, fará história e será o primeiro diálogo cara a cara entre um presidente americano em exercício e um dirigente norte-coreano.

Mike Pompeo foi à Coreia do Norte para organizar encontro entre Trump e Kim Jong-un - White House/AP - White House/AP
Mike Pompeo foi à Coreia do Norte para organizar encontro entre Trump e Kim Jong-un
Imagem: White House/AP

Discursos contraditórios

As falas de Trump sobre a Coreia do Norte mostram suas idas e vindas em relação ao país. No início de seu mandato, em abril de 2017, o norte-americano chamava Kim de "louco com armas nucleares". No início de maio, Trump surpreende o mundo ao declarar que seria "uma honra" se encontrar com Kim Jong-Un sob "as condições adequadas".

Após seis testes nucleares da Coreia do Norte, Trump declarou na Assembleia Geral das Nações Unidas que se os Estados Unidos "forem forçados a defender seus aliados, não haverá outra alternativa que destruir totalmente a Coreia do Norte".

Em fevereiro deste ano, Coreia do Norte e do Sul se aproximam antes da realização dos Jogos Olímpicos de Inverno e fazem uma trajetória que parece levar passo a passo a um acordo sobre a desnuclearização norte-coreana.

Em abril, líderes das duas Coreias se encontraram em episódio histórico - Foto: AFP - Foto: AFP
Em abril, líderes das duas Coreias se encontraram em episódio histórico
Imagem: Foto: AFP

O fracasso do "modelo da Líbia"

No final de abril, o assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton, afirmou desejar a aplicação do "modelo da Líbia" para o desarmamento nuclear na Coreia do Norte. No início dos anos 2000, o ditador Muammar Kadafi abandonou seu programa nuclear após a pressão diplomática do Ocidente.

Bolton, porém, não mencionou que o governo líbio foi derrubado em 2011 com a ajuda de ataques aéreos ocidentais. Kadafi acabaria sendo brutalmente assassinado por seu próprio povo.

Situações como a da Líbia estão entre a as razões principais para que os membros da linha dura do regime norte-coreano se atenham a todo custo ao seu programa nuclear, que veem como uma forma de garantia de vida.

Do ponto de vista da política externa, a confiabilidade de Washington nas conversações diretas com Pyongyang passou a ser considerada duvidosa. Até o momento, a Coreia do Norte deu indicações de que seu desarmamento nuclear deve caminhar lado a lado com um tratado de paz com os EUA.

Uma gafe recente de Pompeo, recém-empossado no Departamento de Estado, levantou algumas dúvidas sobre sua capacidade de levar os EUA à mesa de negociações. Quando estava a caminho de Pyongyang, ele se referiu ao ditador norte-coreano como "presidente Un", obviamente desconhecendo que seu sobrenome é, de fato, Kim. Um típico erro de principiante.

(Com agências internacionais)