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Cena do aperto de mãos entre Trump e Kim mostra complexidade da relação entre os dois

O presidente dos Estados Unidos Donald Trump, à direita, estende a mão para cumprimentar o líder norte-coreano Kim Jong-Un, à esquerda - Evan Vucci/AP Photo
O presidente dos Estados Unidos Donald Trump, à direita, estende a mão para cumprimentar o líder norte-coreano Kim Jong-Un, à esquerda Imagem: Evan Vucci/AP Photo

Foster Klug

Da Associated Press, em Singapura

12/06/2018 10h10

Donald Trump se aproximou pela direita, caminhando pela longa varanda no resort da era colonial em Singapura. Kim Jong-Un, vestido com seu habitual conjunto Mao, surgiu pela esquerda. Eles se encontraram no meio, sobre um tapete vermelho, com dezenas de câmeras registrando cada movimento enquanto o mundo todo assistia.

E contava.

Treze segundos. Foi por quanto tempo os líderes americano e norte-coreano apertaram-se as mãos no início de sua reunião de cúpula na terça-feira (12). A duração do contato, suas expressões faciais e a linguagem corporal, o surpreendente pano de fundo das bandeiras nacionais entrelaçadas --tudo isso foi imediatamente analisado, criticado e apreciado em tuítes e comentários na Coreia do Sul, nos EUA e em toda parte.

Kim e Trump deram o primeiro aperto de mãos diante de bandeiras da Coreia do Norte e dos EUA - Saul Loeb/AFP - Saul Loeb/AFP
Kim e Trump deram o primeiro aperto de mãos diante de bandeiras da Coreia do Norte e dos EUA
Imagem: Saul Loeb/AFP

Kim talvez tenha resumido melhor a qualidade surreal do que acontecia quando disse que muitos dos que assistiam pensariam que era uma cena de "filme de ficção-científica".

Os sul-coreanos aplaudiram em uma estação de trens enquanto assistiam; o presidente sul-coreano deu um grande sorriso; uma autoridade comparou a cúpula, favoravelmente, ao nascimento de sua filha. Por outro lado, os críticos disseram que as boas-vindas que Trump deu a Kim em Singapura dariam legitimidade a um dos piores agressores dos direitos humanos no mundo.

Foi um momento único, essencialmente humano --uma saudação, uma aprovação, um início de relações--, mas a reação ao cumprimento foi tão complexa quanto o impasse, durante sete décadas, entre os países que esses homens representam.

Houve choque, alívio, preocupação, às vezes simultaneamente, enquanto o mundo observava Trump e Kim --que apenas alguns meses atrás insultavam suas respectivas capacidades mentais e físicas e ameaçavam a guerra nuclear-- apertando-se as mãos e sorrindo.

Trump estendeu a mão primeiro, seguido por Kim, enquanto caminhavam um em direção ao outro. Trump segurou o braço direito de Kim enquanto se cumprimentavam, e mais tarde pegou o braço esquerdo de Kim enquanto se viravam para enfrentar as câmeras e o mundo, suas expressões momentaneamente ficando impassíveis antes que se voltassem novamente um para o outro e sorrissem.

O presidente sul-coreano, Moon Jae-In, acompanhou pela televisão o encontro - Yonhap via Reuters - Yonhap via Reuters
O presidente sul-coreano, Moon Jae-In, acompanhou pela televisão o encontro
Imagem: Yonhap via Reuters

As bandeiras lado a lado

O pano de fundo era quase tão chocante quanto o calor do cumprimento --uma fileira de bandeiras dos dois países dispostas lado a lado à entrada do resort de Singapura que abrigou a cúpula.

As duas Coreias há muito demonizavam a bandeira da outra. É ilegal mostrar a bandeira da Coreia do Norte no Sul. A propaganda anti-EUA da Coreia do Norte data da guerra e costuma mostrar soldados norte-coreanos dando golpes de baioneta na bandeira americana.

No entanto, muitos sul-coreanos correram para manifestar sua admiração pelos acontecimentos de terça-feira.

O jornal liberal "Hankook Ilbo" se maravilhou porque o presidente americano não deu a mão "à maneira Trump" habitual, dominando seu interlocutor. Ele também notou que Trump deu um suave toque no ombro de Kim e pareceu lhe falar algo corriqueiro.

12.jun.2018 - O líder norte-coreano Kim Jong-Un e Donald Trump, presidente dos EUA, entram na sala em que aconteceu o primeiro aperto de mão dos dois - Anthony Wallace/AFP Photo - Anthony Wallace/AFP Photo
Imagem: Anthony Wallace/AFP Photo

Jung Chung-rae, um ex-deputado do partido liberal Minjoo, tuitou que o aperto de mãos "brilhou com cortesia e respeito" e que a história se lembrará de seus "cumprimentos e sorrisos".

Fotos na mídia mostraram o presidente sul-coreano, Moon Jae-in, com um largo sorriso durante uma reunião de gabinete na Casa Azul, enquanto olhava para uma televisão que mostrava Trump e Kim se cumprimentando diante das bandeiras. "Toda a atenção de nossa população está em Singapura", disse Moon. "Eu também mal consegui dormir ontem à noite."

Pouco antes que os líderes se encontrassem, o chefe de gabinete de Moon escreveu no Facebook que a cúpula lhe lembrava o nascimento de sua filha.

"Eu me lembro que andei de um lado para outro ao redor da sala de parto no dia em que minha filha nasceu. Eu não me importava que fosse menino ou menina. Apenas venha para o mundo saudável, com um grande choro", escreveu Im Jong-seok, aparentemente desejando um resultado de sucesso para a reunião entre os presidentes.

Os críticos, porém, viram o cumprimento e a caminhada noturna anterior de Kim como evidências de que Trump estava ajudando a legitimar Kim como seu igual no cenário mundial, apesar de o regime norte-coreano ser acusado de terríveis abusos aos direitos humanos.

Durante seu passeio na segunda-feira pela beira-mar em Singapura, multidões gritaram o nome de Kim e se empurraram para tirar fotos, e o líder norte-coreano posou para uma selfie com autoridades locais.

No ano passado Kim era o "homenzinho-foguete", segundo Trump, e as autoridades americanas regularmente mencionavam seu provável papel no assassinato de seu meio-irmão com agente nervoso em um aeroporto da Malásia, assim como na execução de seu tio. A imagem de Kim agora seria melhorada, disseram os críticos.

Sue Mi Terry, uma ex-analista da CIA, disse à MSNBC: "Kim Jong- Un está preparado. Ele sabe o que quer, que é ganhar uma... aceitação internacional da Coreia do Norte como uma potência com arma nuclear. Ele está chegando a esta reunião numa posição de força porque atingiu certa capacidade em seu programa de mísseis nucleares. E ele pensa que agora verá o que pode conseguir dos EUA".

Adam  Mount, um analista de defesa dos EUA, manifestou raiva sobre ver as bandeiras dos EUA e da Coreia do Norte lado a lado.

"Deveríamos estar trabalhando diligentemente para transformar a Coreia do Norte e nosso relacionamento com ela", tuitou ele. "Mas até esse dia é abominável ver uma bandeira que representa tanto sofrimento e crueldade ao lado da nossa."