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Submarino completa 1 ano desaparecido na Argentina, e famílias ainda esperam notícias

Ara San Juan partiu para um exercício de rotina e nunca mais voltou - Xinhu
Ara San Juan partiu para um exercício de rotina e nunca mais voltou Imagem: Xinhu

Luciana Rosa

Colaboração para o UOL, em Buenos Aires

15/11/2018 04h01

Um dos objetivos de um submarino é passar despercebido pelos inimigos. Por isso, são projetados para não serem descobertos. E saber disso só aumenta a agonia dos familiares que, há um ano, não têm notícias dos 44 tripulantes que embarcaram no Ara San Juan S-42, o submarino argentino que perdeu contato com a superfície e nunca mais deu sinais.

Nossas vidas pararam em 15 de novembro de 2017

Zulma Sandoval, mãe de Celso Oscar Vallejos, operador de sonar do submarino desaparecido

Até hoje, não se sabe exatamente o que aconteceu. Cogitou-se explosão, falha técnica e até sequestro. Mas fato é que ninguém tem conhecimento do que aconteceu com o equipamento militar --nem com as pessoas dentro dele.

Ao UOL, Zulma conta que, junto ao marido, costumava visitar a base naval de Mar del Plata para tomar "uns mates" com o filho Celso, que trabalhava no submarino, muitas vezes tendo o próprio Ara San Juan de fundo.

O equipamento partiu da base militar de Ushuaia, no sul da Argentina, em 13 de novembro de 2017, tendo como destino Mar del Plata --onde Zulma se encontrava com o filho. Era uma operação de rotina. Mas, dois dias depois, a embarcação perdeu a comunicação com os militares em terra, a uma distância de 430 quilômetros da Península Valdez.

"A última vez em que nos encontramos foi em 21 de outubro de 2017, no aniversário da minha neta mais velha. A última conversa por telefone foi em 7 de novembro. Falamos por quase duas horas, eu em Missiones, ele em Ushuaia", relembra. 

Família de Alberto Sanchez, um dos desaparecidos no ARA San Juan - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
O suboficial Alberto Sánchez, um dos desaparecidos junto com o submarino ARA San Juan, e a família: "Temos esperança", diz a mulher, Marcela
Imagem: Arquivo Pessoal
'Continuo esperando que ele volte'

Um dos desfechos mais prováveis para o submarino, a morte de todos os ocupantes, é frase proibida para as famílias.

"Vivemos com incerteza cada dia, é uma agonia que não termina nunca", diz Marcela Fernandes sobre os seus últimos 365 dias.

Ela é esposa do suboficial Alberto Sánchez. "Continuo esperando que ele volte, porque não há nada que me demonstre o contrário", conta com a voz embargada. 

Mãe de dois garotos, um de 8 e outro de 14 anos, ela diz que encontra conforto ao relembrar o amor de Alberto pelo trabalho. "É sua vocação da alma, em todos os sentidos. Ele ama ser submarinista", diz fazendo questão de colocar a frase em tempo presente.

"Eu não consigo acreditar que isso esteja acontecendo com a gente. O governo não se compromete como devia", diz Marcela.

"Nós estávamos sempre juntos, esperávamos que cada um chegasse do trabalho para ir ao supermercado e resolver as coisas da casa juntos. Namoramos há 25 anos e estamos oficialmente casados há 17", diz.

Protesto Ara San Juan - Bruno Aragaki / UOL - Bruno Aragaki / UOL
Parentes dos desaparecidos do Ara San Juan protestam em frente à Casa Rosada
Imagem: Bruno Aragaki / UOL
Famílias nas buscas

Em setembro deste ano, teve início uma nova etapa de buscas, com o barco norueguês Seabed Constructor, da empresa Ocean Infinity. Na embarcação, viajam também três familiares dos desaparecidos no Ara San Juan. Entre eles, está o advogado Luis Tagliapietra, pai de Alejandro, que ocupava o submarino. 

Há 67 dias a bordo do Seabed Constructor, Tagliapietra diz que as expedições, nos próximos dias, deverão alcançar um ponto ainda não investigado pelas equipes anteriores. E com o avanço, vem a esperança: os familiares dizem que, nesse local, um operador de sonar ouviu sons que poderiam ser de golpes no casco do submarino. 

"Não estava no planejamento da empresa, mas eles ouviram a nossa opinião e vamos ver isso", conta o advogado. Ele deixou tudo para trás e há um ano dedica a vida para tentar encontrar o filho. 

Essa nova incursão é resultado de pressão feita pelos familiares, que acamparam por 52 dias na praça de Maio, em Buenos Aires. Em um dos atos, os familiares se acorrentaram às grades que protegem a Casa Rosada, sede do Executivo, dizendo que só se soltariam se o governo se comprometesse a não interromper as buscas. 

"Eu fui uma das pessoas que convocou para que fossemos à praça de Maio", conta Marcela. Ela intercala as manifestações na capital do país com viagens de volta a Mar del Plata para visitar os filhos. "Eles me dizem: 'Mamãe, faça o que tiver de fazer para que o papai apareça'".

O que se sabe sobre os últimos minutos do Ara San Juan

Segundo um relatório da Organização para a Proibição Total de Provas Nucleares entregue à Marinha argentina, houve um "evento violento consistente com uma explosão", detectado pelos peritos de medição hidroacústica que monitoram eventos nucleares.

Análises feitas pelo serviço de Inteligência Naval dos Estados Unidos sugerem que o Ara San Juan teria liberado uma energia similar a uma explosão de 5.700 quilos de explosivos após o ruído.

Segundo a hipótese defendida pelo Ministério de Defesa, haveria ocorrido uma falha em uma das válvulas de ventilação das baterias de proa.

Para Luis Tagliapiedra, expressando a opinião da maioria dos familiares, "a explosão não está ainda claramente comprovada".

Descrentes em relação ao governo, muitos se apegam a teorias conspiratórias. Há quem prefira acreditar que o submarino foi sequestrado --abrindo espaço para a tese de que os tripulantes poderão ser encontrados com vida.