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Trump quebra uma tradição de 124 anos ao não felicitar Biden pela vitória

3.nov.2020 - O presidente dos EUA, Donald Trump, em comício em Michigan - Carlos Barria/Reuters
3.nov.2020 - O presidente dos EUA, Donald Trump, em comício em Michigan Imagem: Carlos Barria/Reuters

Carolina Marins

Do UOL, em São Paulo

09/11/2020 04h00

Passados quase dois dias desde que o democrata Joe Biden foi dado como vencedor da eleição nos EUA, Donald Trump ainda não felicitou o concorrente. O ato quebra uma tradição de 124 anos no país, em que o candidato derrotado não só reconhece como faz algum contato para parabenizar seu oponente pela vitória.

O republicano já se pronunciou algumas vezes após o anúncio, mas apenas para acusar as eleições de fraude e se proclamar o verdadeiro vencedor. Fontes internas da Casa Branca disseram à rede americana CNN que a esposa de Trump, Melania, e outros membros da família tentam convencer o presidente a reconhecer a derrota.

Ao longo desses 124 anos, alguns discursos de derrota marcaram a história. Um exemplo é de John McCain, republicano que perdeu a eleição para Barack Obama, que não só parabenizou o democrata, como reconheceu a importância da eleição do primeiro homem negro no país. A carta de George H. W. Bush para Bill Clinton também é muito lembrada.

A tradição começou em 1896, na disputa entre o republicano William McKinley e o democrata William Jennings Bryan. McKinley venceu Bryan naquela disputa e prontamente enviou um telegrama ao seu oponente.

Apresso-me a dar os meus parabéns. Apresentamos a questão ao povo americano e sua vontade é a lei.

William Jennings Bryan, após perder a eleição de 1896

A partir de então, começou uma tradição de que o candidato derrotado reconhece publicamente o candidato vencedor e o felicita. Até mesmo o democrata Al Gore o fez em 2000 após perder a eleição para George W. Bush em um pleito marcado por judicialização e recontagens.

Veja os discursos de derrota das últimas eleições nos EUA

Na última eleição presidencial americana, Hillary Clinton perdeu para Donald Trump em um pleito surpreendente. Todas as pesquisas projetavam vitória para Hillary e de fato ela venceu nos votos populares, porém Trump levou a melhor no número de delegados.

Em um primeiro momento, ela não foi a público fazer o discurso de derrota —o chefe de campanha foi incumbido da tareda. Mas depois ela ligou para Trump e fez o discurso no dia seguinte.

Parabenizei Donald Trump e me ofereci para trabalhar com ele em nome de nosso país. Espero que ele seja um presidente de sucesso para todos os americanos. Este não é o resultado que queríamos ou pelo qual trabalhamos tanto. Lamento não termos vencido esta eleição pelos valores que compartilhamos e pela visão que temos para nosso país Hillary Clinton em 2016

Na eleição anterior, de 2012, o republicano Mitt Romney parabenizou Barack Obama pela reeleição em um discurso de união entre republicanos e democratas.

Acabo de ligar para o presidente Obama para parabenizá-lo por sua vitória. Sua torcida e sua campanha também merecem parabéns. Este é um momento de grandes desafios para a América, e oro para que o presidente tenha sucesso em guiar nossa nação Mitt Romney em 2012

Na eleição de 2008, aconteceu o discurso histórico de John McCain para o recém-eleito Barack Obama em um pleito marcado por recorde de votos ao democrata.

"Há pouco, tive a honra de ligar para o senador Barack Obama e parabenizá-lo por ter sido eleito o próximo presidente do país que ambos amamos. Em uma competição tão longa e difícil como esta campanha tem sido, seu sucesso por si só impõe meu respeito por sua habilidade e perseverança".

Esta é uma eleição histórica e reconheço o significado especial que tem para os afro-americanos e para o orgulho especial que deve ser deles esta noite. Sempre acreditei que a América oferece oportunidades a todos que desejam aproveitá-la. O senador Obama também acredita nisso John McCain em 2008

Em 2004, o democrata John Kerry também falou em união ao parabenizar George W. Bush pela reeleição:

Tivemos uma boa conversa e falamos sobre o perigo de divisão em nosso país e a necessidade —a necessidade desesperada de unidade, de encontrar um terreno comum, de nos unir. Hoje espero que possamos começar a cura John Kerry em 2004

Em 2000 a eleição foi atípica. O republicano George W. Bush foi declarado vencedor, mas após problemas com a eleição na Flórida —um estado decisivo— a imprensa voltou atrás. O democrata Al Gore já havia parabenizado Bush, mas voltou atrás e levou o pleito à Suprema Corte.

Os americanos esperaram 37 dias para conhecer o vencedor daquelas eleições. No fim, a Corte confirmou Bush vencedor e Al Gore voltou a reconhecer a vitória.

A Suprema Corte dos EUA falou. Que não haja dúvida, embora eu discorde veementemente da decisão do tribunal, eu a aceito. E esta noite, pelo bem de nossa unidade como povo e pela força de nossa democracia, ofereço minha concessão. Al Gore em 2000

De 2000, vale um salto para 20 de janeiro de 1993, quando Bill Clinton assumiu a presidência do país em seu primeiro mandato. Naquele dia ele encontrou uma carta emocionante escrita por George H.W. Bush (Bush pai) no qual ele desejava felicidade e sorte na Casa Branca.

Caro Bill, quando entrei neste escritório hoje, senti a mesma sensação de admiração e respeito que senti há quatro anos. Eu sei que você vai sentir o mesmo. Desejo-lhe muitas felicidades aqui. Nunca senti a solidão que alguns presidentes descreveram George H.W. Bush em carta após perder a reeleição em 1992