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Autoridades ignoraram plano para impedir acidente em Israel, diz jornal

Paramédicos e judeus ultraortodoxos caminham entre corpos de vítimas do incidente no festival de Lag Ba"Omer, no Monte Meron, Israel - David Cohen/Jini Pix/AFP
Paramédicos e judeus ultraortodoxos caminham entre corpos de vítimas do incidente no festival de Lag Ba'Omer, no Monte Meron, Israel Imagem: David Cohen/Jini Pix/AFP

Colaboração para o UOL

04/05/2021 14h58

Uma semana antes do tumulto que resultou na morte de pelo menos 45 pessoas em um evento religioso em Israel, autoridades do governo local haviam elaborado um plano para limitar a presença do público na celebração. No entanto, a implantação da medida nunca aconteceu porque nenhum departamento do Executivo se responsabilizou por colocá-lo em prática. A informação é do jornal New York Times.

De acordo com o documento obtido pelo periódico, a ideia do governo israelense era autorizar a presença de apenas três mil peregrinos nas partes mais populares do Monte Meron, onde acontece anualmente o festival ultraortodoxo do Lag Ba'Omer. O evento marca o aniversário da morte do rabino Shimon Bar Yochai, que viveu no século II e foi enterrado no local.

A falta de um sistema de gestão claro na montanha é apontada com uma questão que ajuda a perpetuar o problema com grandes públicos no local. Quatro grupos Haredi administram diferentes partes do complexo, mas nenhum tem jurisdição sobre todo o local. O grupo que supervisiona a área onde ocorreu o desastre, Toldot Aharon, rejeita a autoridade do Estado.

Cada grupo é representado em um comitê administrativo de cinco pessoas, junto com um oficial religioso nomeado pelo governo, Rabi Shmuel Rabinowitz, que supervisiona todos os locais sagrados em Israel.

Também não existe uma cadeia de comando na montanha. Além do governo regional e do comitê de grupos religiosos, um departamento do Ministério dos Serviços Religiosos - o Centro Nacional para o Desenvolvimento de Locais Sagrados - supervisiona a manutenção do espaço e o gerenciamento de eventos na montanha.

Para este ano, as autoridades israelenses propuseram que polícia trabalhasse em conjunto para limitar as multidões nas cerimônias de fogueira, segundo o plano obtido pelo jornal.

Nos últimos dias, funcionários do comitê, do centro e da polícia culparam outras instituições pelo acidente. Questionados pelo New York Times sobre a falha em implementar o novo plano, cada departamento se recusou a responder ou disse que não era responsável pelo controle do público.

As consequências do desastre tem provocado uma discussão no país quanto ao nível de autonomia informal concedido aos judeus ultraortodoxos de Israel, que apesar de representar apenas 12% da população, são uma força política crescente. Os haredim têm permissão para administrar suas próprias escolas, evitar o serviço militar e estudar textos religiosos em tempo integral, principalmente com o apoio do Estado.

"É um lugar sem lei. Todos podiam fazer ou construir o que quisessem", afirmou Mordechai Halperin, ex-prefeito do vilarejo vizinho de Meron e um dos responsáveis pelo planejamento da área.

Há pelo menos 13 anos, políticos e vigilantes tentam criar regulamentos mais rígidos sobre planejamento e controle de multidões no local. Alguns mais radicais propõe o fechamento total do espaço. Um antigo prefeito da cidade chegou a alertar às autoridades que a construção de um albergue ilegal estava bloqueando uma saída de emergência na área.

"Tentei parar com isso. Escrevi cartas. Qualquer pessoa que olhasse para aquela encosta podia ver que era algo que acabou de ser montado", desabafou.

O ex-líder do conselho regional Shlomo Levy disse que ao tentar cancelar o festival, em 2008, recebeu pressões de ministros, legisladores e residentes da região.

"Eles ligaram e disseram: 'Por que você está colocando essa batata quente na ordem do dia?' Está claro hoje que a gestão do espaço é uma máfia, há muito dinheiro e ego envolvidos - tudo menos o temor de Deus", opinou.

Políticos haredi rejeitam a acusação de que usam sua influência dentro de coalizões de governo para abafar as tentativas de trazer ordem ao Monte Meron.