Jack Lang: "Os métodos do Daesh são os mesmos que os dos nazistas"
Florence Evin
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AP
Membros do Estado Islâmico (El) destroem esculturas antigas no museu de Mossul
Jack Lang, presidente do IMA (Instituto do Mundo Árabe), fala sobre o vídeo feito pelos jihadistas do Daesh (acrônimo árabe para o Estado Islâmico) e divulgado na internet na quinta-feira (26), mostrando a destruição de estátuas e relevos de pedra milenares do império assírio, no museu de Mosul e Nínive, no Iraque. O ex-ministro da Cultura faz um apelo pelo reforço da coalizão internacional, sobretudo de países árabes, contra os terroristas, que usam a cultura como arma.
Le Monde: O Daesh trouxe de volta o obscurantismo e uma cultura totalitária similar ao nazismo?
Jack Lang: Estamos lidando com fanáticos que têm por ambição instaurar uma ordem ditatorial e totalitária, com um único líder, uma única filosofia. Todo o resto é ímpio, deve ser massacrado, dilapidado, destruído. Eles se afastaram do humano, adotando uma ideologia de destruição do humano. Seus métodos são os mesmos que os dos nazistas, que atacavam tanto o pensamento quanto os próprios seres humanos, com as queimas de livros e os campos de concentração. Os nazistas queriam a supressão de qualquer pensamento, exceto os de Hitler.
Le Monde: Olhando mais para trás, é possível fazer uma comparação com a Inquisição?
Lang: Os terroristas fanáticos usam o islamismo e o deturpam. Isso lembra a Inquisição, quando a fanática Isabel, a Católica, expulsou os judeus e os muçulmanos da Espanha, aqueles que se recusavam a se converter. Todos os símbolos religiosos que não fossem cristãos foram destruídos. Provavelmente também houve califados na história da conquista que agiram dessa maneira. Expulsar ídolos não é algo novo.
Le Monde: Como entender as raízes do mal?
Lang: Não adianta nada buscar as raízes do mal, quando os ocidentais se acham superiores. As pessoas se esquecem de que George W. Bush desencadeou a desestabilização do Iraque: a destruição foi seguida pela instalação de um governo intolerante, de grande crueldade, que afastou os sunitas. O Daesh é o fruto amargo de Bush e de Bashar al-Assad.
Le Monde: Na visão dos terroristas, a cultura é a arma mais eficaz para se atingir um público maior?
Lang: Essa empreitada criminosa, totalitária, lucrativa, cínica, usa o sistema terrorista que vimos em diferentes períodos da história – sob o regime stalinista, inclusive - , para encenar e colocar na internet a destruição de obras de arte e divulgá-la mundialmente com um verdadeiro conhecimento midiático. É um fenômeno completamente novo, que busca aterrorizar o mundo através de atos, imagens, comportamentos que podem causar medo, até a capitulação.
Le Monde: A comunidade internacional, em especial a árabe, está fazendo o suficiente?
Lang: A situação é monstruosa. O que fazer? Diante disso, não se deve aceitar nenhuma concessão, de nenhum tipo. Qualquer sinal de fraqueza é de interesse deles. Aceitar bater em retirada, ainda que um milímetro, seria dar razão a pessoas que usam o terrorismo para impor uma ordem totalitária absoluta. A França não deve ceder nada. A monstruosidade é tanta que ela acabará suscitando, inclusive entre alguns ingênuos que se deixaram abusar, uma coalizão. A dos países árabes está se ampliando.
Tradutor: UOL
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