Turquia, a arriscada escala no caminho para a Europa

  • Osman Orsal/Reuters

    Menina síria dorme próximo ao porto de Izmir, na Turquia

    Menina síria dorme próximo ao porto de Izmir, na Turquia

Desde o início do ano a marinha turca teria resgatado 42 mil pessoas em alto-mar

"A humanidade naufragada" ou "kiyiya vuran insanlik", em turco: essa foi a legenda que acompanhou as primeiras imagens nas redes sociais dessa criança de 3 anos, cujo corpo foi encontrado junto com o de seu irmão mais velho em uma praia perto da estação balneária de Bodrum, à beira do mar Egeu.

Na manhã de quarta-feira (2), foram vários corpos que naufragaram não longe de Akyalar, último vilarejo na ponta da baía de Bodrum. Do outro lado do vilarejo se vê a cidade grega de Kos, na ilha de mesmo nome, situada a menos de cinco quilômetros. Aylan Kurdi, de 3 anos de idade, era originário de Kobane, cidade do norte da Síria que foi libertada do Estado Islâmico pelas forças curdas em janeiro. O cadáver de seu irmão de 5 anos, Galip, e de sua mãe, também foram encontrados nas proximidades. O pai deles, Abdullah, sobreviveu ao naufrágio.

Foi um pescador local o primeiro a descobrir o corpo do pequeno Aylan por volta das 6h da manhã de quarta-feira, antes de alertar as autoridades locais. Segundo um porta-voz da marinha turca, duas embarcações, que teriam ido para alto-mar separadamente durante a noite de terça para quarta a partir de dois pontos da margem, afundaram pouquíssimo tempo depois de darem a partida.

O primeiro barco levava 18 refugiados sírios, dos quais sete se afogaram, nove foram socorridos pela guarda-costeira turca e dois continuam desaparecidos. A segunda embarcação continha seis sírios, dos quais três crianças e uma mulher morreram, e dois outros passageiros conseguiram chegar até o litoral turco graças ao colete salva-vidas.

A península de Bodrum, meca do turismo balneário, é um dos pontos de passagem preferidos dos refugiados que se dirigem para a Grécia, em razão de sua proximidade com a ilha de Kos. Todos os dias, e às vezes em meio aos banhistas e veranistas, o mar cospe pedaços de botes infláveis, retalhos de tecidos e coletes salva-vidas.

Crise sem precedentes

Segundo as autoridades da Turquia, o número de travessias a partir das margens turcas com direção à Grécia aumentou consideravelmente nos últimos dias. Ancara calcula em aproximadamente 2 mil o número de pessoas que agora estão tentando diariamente atravessar a fronteira marítima, que também constitui o limite externo do espaço Schengen no sudeste da Europa.

Desde o início do ano, a marinha turca teria resgatado 42 mil pessoas em alto-mar, sendo 2.160 na última semana e quase 500 pessoas só desde o dia 1º de setembro. Somente no setor de Bodrum, 96 foram salvas das águas desde o início de setembro, e treze pessoas se afogaram ou continuam desaparecidas, segundo Ancara.

A Turquia está na linha de frente nessa crise humanitária sem precedentes. Na quarta-feira, o Conselho de Segurança Nacional (MGK), instituição militar-civil presidida pelo chefe do Estado, lamentava a "abordagem preocupante" da União Europeia em relação ao fluxo de refugiados, e estimulava a Europa a agir "pela perspectiva dos direitos humanos."

Fluxo desviado

Durante o verão Ancara já havia anunciado ter "atingido sua capacidade máxima de acolhimento de refugiados", sendo que a Turquia agora está abrigando oficialmente 2 milhões de refugiados sírios, e na verdade certamente mais.

Em julho, o ministro turco para Assuntos Europeus, Volkan Bozkir, estimava em 5,3 bilhões de euros os custos gerados por essa crise humanitária para o orçamento turco, e lamentava a negligência da UE, cuja verba prometida a Ancara para suportar o peso da crise continuava por vir.

Os sírios, que estão chegando à Turquia por terra ou, no caso dos mais afortunados, de avião, sobretudo a partir do Líbano, não precisam de visto para entrar em território turco. Os refugiados em seguida se dirigem ou para os portos do litoral ou para Istambul, a metrópole turca que sozinha concentra quase 1 milhão de refugiados provenientes da Síria, que se instalaram ali há algumas semanas ou há alguns meses, sobretudo nos bairros periféricos como Esenyurt, na margem europeia da cidade.

De lá, a maioria tentará chegar até a Europa a partir da cidade de Edirne, na fronteira búlgara, ou ainda pelos portos do mar Egeu na direção das ilhas gregas. O muro que está sendo construído pelas autoridades búlgaras desviou parte do fluxo de refugiados na direção da Grécia, agora preferida pelas redes de coiotes.

Estes, aliás, estão bem presentes nas redes sociais, através das quais recrutam candidatos ao exílio em vários grupos do Facebook que oferecem a viagem, em condições cujas dificuldades variam em função dos preços. Uma travessia a partir de Bodrum até a ilha de Kos hoje chega a pelo menos mil euros por cabeça, ou até 2 mil ou 3 mil em embarcações consideradas mais seguras e menos cheias. As embarcações carregadas de refugiados cruzam em alguns pontos com as balsas que fazem a ligação regular entre Bodrum e Kos. Para esses turistas, a viagem dura menos de uma hora, a um preço de aproximadamente trinta euros.

Tradução: UOL

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