Acordo do clima na COP-21 é sucesso ainda a ser confirmado

Simon Roger

  • Alain Jocard - 12.dez.2015/AFP

    Manifestantes vestidos de urso polar protestam em Paris durante a COP-21

    Manifestantes vestidos de urso polar protestam em Paris durante a COP-21

Obtido após longas noites de negociações, o acordo assinado ao final da 21ª Conferência Mundial sobre o Clima (COP-21), dia 12 de dezembro em Paris, foi saudado como histórico, mas ainda precisa ser colocado em prática.

Em vinte anos de negociações climáticas multilaterais, foram raras as ocasiões para se comemorar um verdadeiro engajamento da comunidade internacional frente à ameaça bem verdadeira do aquecimento global. A 21ª Conferência Mundial sobre o Clima, realizada entre 30 de novembro e 12 de dezembro em Bourget, perto de Paris, deverá ser lembrada como um desses breves momentos de satisfação coletiva.

No palco da assembleia de encerramento, no sábado (12) à noite, o presidente francês François Hollande, o ministro das Relações Exteriores da França Laurent Fabius, o secretário-geral da ONU Ban Ki-moon, a secretária executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (UNFCCC, sigla em inglês) Christiana Figueres e a negociadora-chefe da França Laurence Tubiana posaram para a foto de mãos dadas e braços erguidos em sinal de vitória.

O acordo de Paris, primeiro texto universal para conter "a elevação da temperatura média do planeta nitidamente abaixo de 2º C", acaba de ser aprovado por consenso, com previsão para entrar em vigor em 2020. Nas fileiras da sala plenária, os delegados dos 195 Estados recebem a martelada do presidente da COP21 com uma longa salva de palmas, gritos de alegria... e sinais de alívio.

As últimas noites de discussões foram cansativas e as últimas deliberações, estressantes. No início da tarde, uma simples palavra fez suar frio a delegação americana: um "shall" ("deve"), substituído por engano, segundo a presidência francesa, por um "should" ("deveria"), no artigo do acordo que define as obrigações dos países desenvolvidos em matéria de redução de emissões de gases de efeito estufa, poderia requerer uma passagem pelo Congresso, cuja maioria é hostil à administração Obama.

A frase foi retificada, mas a correção foi contestada no início da plenária pela coalizão dos países em desenvolvimento. Houve um novo conciliábulo, que durou quase duas horas, para convencer estes últimos a aceitarem a versão finalizada. Enquanto Laurent Fabius se preparava para selar o acordo a partir de seu púlpito, a Nicarágua, contrária à cláusula de não-indenização das perdas e danos sofridos pelos países pobres, pediu a palavra, que lhe foi negada. De forma alguma deixariam Manágua, ou qualquer outra capital, estragar essa festa esperada há tanto tempo!

De Copenhague a Paris

"Paris está sendo um ponto de virada na história das negociações climáticas", acredita a especialista em direito ambiental Sandrine Maljean-Dubois. Houve a Cúpula da Terra no Rio em 1992 —que resultou na primeira COP em Berlim, em 1995--, o protocolo de Kyoto em 1997—que determinou números baixos de reduções de emissão somente para os países desenvolvidos--, a conferência de Copenhague em 2009 —que não conseguiu chegar a um acordo universal —e hoje a COP21."

"A conferência de Copenhague não foi um fracasso total", afirma a diretora de pesquisas do CNRS. "Ela lançou o processo que levou ao acordo de Paris". O acordo aprovado no dia 12 de dezembro de fato carrega como herança dois princípios decretados em 2009: a manutenção do aquecimento abaixo do limite de 2º C e a mobilização por parte de países do Norte de US$100 bilhões (R$386 bilhões) ao ano até 2020, para ajudar os países do Sul a enfrentarem os efeitos da mudança climática.

Mas o texto do Bourget vai mais longe ao mencionar o teto de 1,5º C, uma exigência dos pequenos países insulares ameaçados de submersão, e ao classificar os 100 bilhões de montante "mínimo" a partir do qual uma nova meta deverá ser fixada até 2025.

No entanto, Paris também marca uma ruptura com Copenhague. "Foi muito diferente", diz Alden Meyer, da Union of Concerned Scientists. "A COP21 foi bem preparada e bem conduzida, ao explicar regularmente a iniciativa aos Estados para ganhar sua confiança. Foi o inverso no fim de 2009 em Copenhague, onde se viveram duas semanas de crise permanente."

Ciente da importância da conferência de Bourget, o maior acontecimento diplomático já organizado pela França, o palácio do Eliseu ativou sua "máquina" diplomática durante mais de dois anos e enviou Laurent Fabius aos quatro cantos do planeta para aproximar as visões das potências que mais emitem (China, Estados Unidos, Índia) e dos países mais vulneráveis ao aquecimento global.

Ao assumir o desafio de reunir, em 30 de novembro, no dia inaugural da COP, 150 chefes de Estado e de governo, "Paris foi um excelente catalisador de tomada de decisão coletiva", analisa Jennifer Morgan, diretora do programa para o clima do World Resources Institute. "Os ataques terroristas de 13 de novembro em Paris aumentaram um pouco a pressão. A COP21 deveria mostrar que a cooperação internacional podia funcionar e resolver uma crise."

"Sem dúvida nenhuma foi um grande sucesso, mas o trabalho está só começando", relativizava, na noite do acordo, Michael Jacobs, conselheiro do instituto de pesquisas New Climate Economy. "Essas metas devem agora se traduzir em políticas públicas. Os governos têm 24 horas para comemorar, mas depois eles precisarão agir." As 24 horas já se passaram faz tempo e a questão da ação faz sentido para um acordo que só entrará em vigor daqui a somente quatro anos.

"Plano de ação"

O próximo encontro do programa das 196 delegações da UNFCCC é a cerimônia de assinatura do acordo de Paris, em 22 de abril de 2016. A partir dessa data, o acordo só poderá entrar em vigor se for alvo de um processo de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão por pelo menos 55 partes da Convenção-Quadro, representando no mínimo 55% das emissões mundiais de gases de efeito estufa.

Em maio deverá acontecer uma nova etapa, a instauração do grupo de trabalho encarregado de pensar nos métodos de implantação do texto aprovado em Bourget. "Será preciso resolver toda uma série de detalhes técnicos até 2020, além de observar como o plano de ação de Paris irá impregnar a esfera econômica", prevê Jennifer Morgan. "A COP-22, no Marrocos, em novembro de 2016, será um momento interessante para ver se o apoio financeiro e tecnológico prometido pelos países desenvolvidos às nações em desenvolvimento está avançando ou não."

Marrakesh também entregará alguns índices sobre as contribuições nacionais de redução das emissões de gases de efeito estufa anunciadas até o momento por 187 dos 195 países. O acordo de Paris adia para 2025 a primeira revisão para cima dessas contribuições, sendo que a urgência climática exige a realização de relatórios de progressos muito mais frequentes.

Um levantamento parcial está programado somente para 2018, ano em que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) deverá apresentar um novo relatório sobre as consequências de um aquecimento superior a 1,5º C em relação ao nível pré-industrial. Com base nas contribuições nacionais atuais, o aumento da temperatura planetária poderá ultrapassar os 3º C. E 2015 deverá terminar com um recorde preocupante, o do ano mais quente desde o início dos registros meteorológicos em 1880. Um recorde também histórico.

Tradução: UOL
 

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