Ao defender controle de natalidade e casamento gay, presidente eleito das Filipinas compra briga com Igreja Católica

Harold Thibault

  • King Rodriguez/Prefeitura de Davao/AFP

    O presidente eleito das Filipinas, Rodrigo Duterte (centro), tira selfie com membros de seu gabinete na cidade de Davao

    O presidente eleito das Filipinas, Rodrigo Duterte (centro), tira selfie com membros de seu gabinete na cidade de Davao

Recém-eleito, mas ainda não empossado, o futuro presidente filipino, Rodrigo Duterte, já atraiu a fúria de uma instituição incontornável: a Igreja Católica. Duterte, que venceu a eleição de 9 de maio e que se tornará chefe do Estado em 30 de junho, tem dado diversas declarações atacando os valores defendidos pelo clero católico.

Em um país que possui pouco mais de 80 milhões de católicos dentre 100 milhões de habitantes, essa é uma aposta arriscada. Porém, na visão de Duterte, atacar a igreja contribui para reforçar sua imagem de homem que não teme atiçar um formigueiro.

No dia 22 de maio, "Rody" propôs implementar uma política que limita a três o número de filhos que um casal pode ter, arrumando briga com os bispos, que são contrários à contracepção. No entanto, essa posição não prejudica sua popularidade, pois agrada a uma opinião popular: para muitos cidadãos, o elevado índice de fecundidade das filipinas (três filhos por mulher) é um obstáculo ao desenvolvimento econômico.

Duterte, que foi prefeito durante 22 anos de Davao, grande cidade do Sul, onde ele se gaba de ter conseguido uma drástica queda na criminalidade, é acusado pelas organizações de direitos humanos de estar ligado ao surgimento na cidade, a partir dos anos 1990, de um esquadrão da morte, que executou sumariamente traficantes e usuários de drogas, mas também em alguns casos simples moradores de rua.

"Instituição mais hipócrita"

Antes mesmo de se instalar no palácio presidencial de Malacanang, "Digong", como é chamado por seus partidários, manifestou sua intenção de restabelecer a pena de morte, abolida em 2006 no arquipélago. Só que o clero local é contrário à pena capital, por considerar que só cabe a Deus dar e tirar uma vida.

Oitenta quilômetros ao sul de Manila, o arcebispo conservador de Lipa, Ramon Arguelles, chegou a se voluntariar para ser executado no lugar de seus seguidores. "Não foi o que Cristo fez?", questionou Dom Arguelles à imprensa local.

Rodrigo Duterte não esconde que acredita em Deus à sua maneira, mas não tem a Igreja católica no coração. O machista populista se gaba de um modo de vida bem distante dos preceitos religiosos, orgulhoso por manter amantes e não conseguir viver sem Viagra, aos 71 anos de idade.

As hostilidades começaram na ocasião da visita do papa às Filipinas, em janeiro de 2016, que causou engarrafamentos monstruosos. Rodrigo Duterte chamou na época o pontífice soberano de "filho da puta". Em seguida, ele escreveu ao papa para se desculpar, e em troca Roma respondeu que Francisco rezava para que ele fosse tocado pela "sabedoria e pela paz" divinas. Infelizmente, o papa evidentemente não teve seu desejo atendido.

Desde sua vitória nas eleições presidenciais, o "Punidor", como foi apelidado pela revista "Time", passou a atacar com mais força. No dia 16 de maio, ele acusou os bispos de terem exigido carros oficiais durante a presidência de Gloria Macapagal Arroyo (2001-2010), e viu na igreja "a instituição mais hipócrita" do país, repetindo o insulto antes dirigido ao papa desta vez na direção dos bispos do país.

"Duterte quer mostrar que ele é uma fonte de novidades, de mudanças e seu meio de chamar a atenção é o exagero", resume Edna Co, cientista política da Universidade de Filipinas. "É o modo de funcionamento do personagem, tudo é dito de maneira teatral."

Por trás de suas declarações incendiárias, Duterte sabe se mostrar bem mais aberto que a maior parte da classe política sobre questões ainda sensíveis nas Filipinas. Ele já se disse a favor do casamento homossexual. Tal medida permanece impensável para a grande maioria da opinião pública, mas para ele "todo mundo merece ser feliz."

Segundo ele, seu ódio pela instituição católica começou na adolescência. Em dezembro de 2015, Duterte revelou ter sido abusado por um padre durante seu primeiro ano de colegial na universidade jesuíta Ateneo de Davao.

"Outras vítimas deram queixa. Eram casos de apalpamentos, sabe, durante as confissões. Foi assim que perdemos nossa inocência prematuramente", explicou o candidato.

No dia 26 de maio, o porta-voz de Duterte tentou consertar as coisas, considerando que o futuro presidente não era contra a igreja em si, mas contra certos indivíduos pertencentes a ela.

Mas, no meio tempo, o esforço foi minado por outras declarações de Duterte, interpretando agora sua ampla vitória como um referendo a favor dele e contra a igreja.

Tradutor: UOL

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