Topo

Escândalo na Petrobras aumenta turbulência na eleição presidencial

Paulo Roberto Costa operou esquema de corrupção na Petrobras - Geraldo Magela/ Agência Senado
Paulo Roberto Costa operou esquema de corrupção na Petrobras Imagem: Geraldo Magela/ Agência Senado

Simon Romero

No Rio

21/10/2014 06h00

Paulo Roberto Costa estava vivendo um sonho de homem do petróleo.

Ele tinha uma casa em um condomínio fechado daqui. Comprou um iate e dirigia um Range Rover blindado. Ele tinha mais de US$ 25 milhões em contas bancárias na Suíça e nas Ilhas Cayman.

Mas esse sonho evaporou recentemente, quando a polícia prendeu Costa e o acusou de orquestrar um esquema de propina em escala épica na Petrobras, a companhia estatal de petróleo do Brasil, e de desvio de recursos para o Partido dos Trabalhadores e seus aliados, além de enriquecer a si mesmo.

O caso representa um grande desafio para a presidente Dilma Rousseff, que está em uma disputa amarga pela reeleição contra Aécio Neves, um político centrista que tem ganhado força à medida que a votação de domingo se aproxima.

Com os dois candidatos disputando pela vantagem nas pesquisas de opinião, Aécio Neves está explorando o escândalo do petróleo para criticar duramente Dilma Rousseff e seu governo, colocando Costa, um engenheiro de 60 anos, sob os holofotes nacionais.

Diante da probabilidade de uma longa pena de prisão, Costa, antes um dos executivos mais poderosos da Petrobras, aceitou um acordo de redução de pena oferecido pelos promotores. Em troca, ele testemunhará em detalhes que transformou a divisão de refino da Petrobras, a maior empresa brasileira, em um caixa dois para o Partido dos Trabalhadores de Dilma e sua coalizão em Brasília.

"As acusações sugerem conclusões corrosivas sobre a democracia brasileira", disse Matthew M. Taylor, um acadêmico da Universidade Americana em Washington, que é especializado no sistema legal do Brasil. "Se comprovado, então até mesmo empresas estatais emblemáticas passarão a ser vistas como alvos para financiamento político, e as coalizões no Congresso continuarão sendo mantidas unidas pela cola da corrupção."


O depoimento de Costa, que o juiz que cuida do caso tornou público, está virando de cabeça para baixo uma disputa presidencial já tumultuada, submetendo Dilma a perguntas sobre se ela sabia sobre as práticas corruptas na Petrobras ou se foi negligente na supervisão da companhia de petróleo.

Ao mesmo tempo, o escândalo acentuou as visões ideológicas concorrentes de como a Petrobras, que fez algumas das maiores descobertas de petróleo no mundo deste século, deve ser administrada. Desde que se tornou presidente, Dilma impôs um maior controle sobre a gigante de energia, de acordo com sua visão de que as grandes empresas estatais devem ser os pilares do desenvolvimento econômico do Brasil.

Aécio Neves, o líder dos social-democratas de oposição, argumenta que o escândalo do petróleo é evidência de que a gestão da Petrobras se tornou politizada demais e em uma ferramenta para manutenção do Partido dos Trabalhadores no poder.

Costa testemunhou que começou a inflar os orçamentos para novas projetos depois que foi promovido para supervisar as operações de refino, há quase uma década, aceitando propinas equivalentes a 3% do valor dos contratos obtidos pelas construtoras brasileiras.

Ele testemunhou que uma parte do dinheiro era então entregue a João Vaccari Neto, o tesoureiro do Partido dos Trabalhadores. Costa disse que outros importantes aliados políticos de Dilma Rousseff, incluindo os líderes de ambas as casas do Congresso, Henrique Eduardo Alves e Renan Calheiros, também se beneficiaram com as propinas, segundo uma reportagem da "Veja", uma revista brasileira.

Em outro desdobramento do escândalo do petróleo e sua influência na disputa presidencial, Costa disse que subornou um membro importante do Partido da Social Democracia Brasileira de Aécio Neves, em 2009, para o engavetamento de uma investigação anterior de irregularidades na Petrobras.

Os investigadores corroboraram as alegações de Costa por meio de um associado, Alberto Youssef, um doleiro que testemunhou que ajudou a lavar o dinheiro do esquema. Youssef, que também aceitou o acordo dos promotores, testemunhou que mais de uma dúzia das maiores construtoras do Brasil pagou altas propinas para obtenção de contratos da Petrobras.

Se o depoimento deles for comprovado, o escândalo do petróleo tornaria minúsculos casos anteriores de corrupção no Brasil, incluindo o esquema de compra de votos que resultou na prisão de importantes membros do Partido dos Trabalhadores, em 2013. A condenação e punição deles foi vista como mudança na cultura política, na qual a impunidade há muito prevalece.

Mas o esquema descrito por Costa mina as esperanças de uma nova era na política brasileira.

"Escândalos como o da Petrobras derrubam presidentes em países com consciência política", disse Ruth de Aquino, uma colunista da revista "Época". "No Japão, alguns políticos e executivos cometem suicídio quando são pegos em um roubo dessa magnitude. Aqui no Brasil, isso nem mesmo incomoda nossas líderes."

Como parte de seu acordo, Costa, que foi preso em março como parte de uma investigação da polícia federal de lavagem de dinheiro, concordou em entregar a fortuna de US$ 25 milhões que escondia em contas no exterior, seu iate e seu carro de luxo, além de pagar uma multa de mais de US$ 2 milhões. Em troca, ele foi autorizado a permanecer em prisão domiciliar no Rio enquanto usa uma tornozeleira eletrônica.

Os políticos e empresas citados por Costa e Youssef como participantes no esquema negaram as acusações, prenunciando uma longa batalha judicial. Uma porta-voz da Petrobras se recusou a comentar sobre o escândalo.


Mesmo assim, o escândalo prejudicou a campanha de Dilma Rousseff, que supervisionou a Petrobras por mais de uma década. Como ministra e protegida do ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, ela foi presidente do conselho de Administração da Petrobras durante o período em que Costa disse que montou o esquema de propina dentro da empresa. Ela não faz mais parte do conselho da Petrobras, mas escolhe seus principais executivos.

Após sua eleição, Dilma manteve Costa em seu cargo até 2012, quando ele deixou a empresa para abrir uma consultoria.

Ela criticou a revelação pública do depoimento dele, a considerando o equivalente a um "golpe" visando impedir sua reeleição. O juiz no caso, Sergio Moro, respondeu dizendo que a lei obriga que a evidência no caso seja pública.

Mas Dilma também reconheceu a corrupção predominante dentro dos gabinetes executivos da Petrobras, apesar de ter negado que sabia sobre o esquema de propina enquanto este ocorria.

"Se houve alguma coisa, e tudo indica que houve, eu posso te garantir que todas, vamos dizer assim, as sangrias que eventualmente pudessem existir estão estancadas", disse Dilma Rousseff ao jornal "O Estado de São Paulo" em uma entrevista.

Dilma também apontou para uma série de escândalos de corrupção dentro do partido de Aécio Neves, que esteve no poder no Brasil de 1995 a 2002.

Analistas dizem que a gigante do petróleo e outras empresas estatais permanecem vulneráveis a esquemas de propina por um motivo principal: os presidentes no Brasil governam em coalizões à mercê do Congresso, que inclui mais de 20 partidos de diferentes ideologias.

"É o básico da corrupção: você consegue o controle de uma empresa estatal e então canaliza os recursos dela para os partidos da sua coalizão", disse Sérgio Lazzarini, um economista da Insper, uma escola de administração e negócios de São Paulo, que escreveu extensamente sobre o capitalismo de Estado do Brasil. "A situação é endêmica e dificilmente mudará, independente de qual presidente esteja no poder."

Costa reconheceu isso em seu depoimento, descrevendo como ascendeu a um cargo de influência na Petrobras com o apoio de um pequeno partido da coalizão do Partido dos Trabalhadores. Ele comparou o processo à política delicada envolvida na escolha dos comandantes das forças armadas do Brasil.

"Ninguém chega a general se não for indicado nas Forças Armadas", ele disse. "É óbvio que nenhum partido indicou algum diretor só pela capacidade técnica dele."