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Imigrantes resgatados no mar enfrentam incerteza nos campos indonésios

Imigrantes bengaleses em um abrigo em Langsa. A Indonésia e a Malásia concordaram em receber 7.000 imigrantes por um ano. Grupos de ajuda estão preocupados com a falta de condições dos campos de refugiados - Sergey Ponomarev/The New York Times
Imigrantes bengaleses em um abrigo em Langsa. A Indonésia e a Malásia concordaram em receber 7.000 imigrantes por um ano. Grupos de ajuda estão preocupados com a falta de condições dos campos de refugiados Imagem: Sergey Ponomarev/The New York Times

Joe Cochrane

Em Bayeun (Indonésia)

28/05/2015 06h01

Mohammed Salim estava sentado em uma esteira de palha em uma tenda ao ar livre, tentando evitar o calor sufocante do meio-dia.

O rohingya de 23 anos de Mianmar ainda parecia estar se recuperando da desidratação e da leve desnutrição. Ele estava entre os 433 imigrantes de Mianmar e Bangladesh a bordo de uma embarcação em apuros encontrada por jornalistas em 14 de maio, à deriva no Mar de Andaman, perto da Tailândia e da Malásia. Eles estavam na embarcação havia três meses, abandonados por seu capitão e tripulação, e estavam desesperados por comida e água.

Desde que desembarcaram na costa norte da ilha indonésia de Sumatra, na semana passada, os passageiros estão vivendo aqui, em tendas na propriedade de uma fábrica de papel abandonada que se tornou um campo de imigrantes do governo.

Eles dormem em esteiras ou em paletes de madeira no solo lamacento, usando um sarongue fino como cobertor e tomando banho com baldes de água retirada de um poço. Em uma clínica com médicos e enfermeiros voluntários e do governo, o teto está cedendo e alguns pacientes estavam deitados no chão com cateteres em seus braços.

Salim sonha em viver em um "país forte", ele disse. "América, Austrália, qualquer um."

Mas, pelo futuro previsível, Salim e mais de 1.800 outros imigrantes que chegaram à Indonésia neste mês não irão a lugar nenhum.

A ministra dos Assuntos Sociais da Indonésia, Khofifah Indar Parawansa, cujo ministério supervisiona os campos, disse que os imigrantes vão permanecer onde estão.

"Na minha opinião, os campos existentes são bons o bastante", ela disse em uma entrevista, acrescentando que os abrigos fornecidos aos indonésios deslocados por uma erupção vulcânica em 2014 eram igualmente espartanos. "É claro, esse é o padrão indonésio."

Além da fábrica de papel no vilarejo de Bayeun, vizinho da cidade de Langsa, na província de Aceh, os imigrantes estão vivendo em condições semelhantes em três outros campos em Aceh, inclusive em depósitos em um pequeno porto estatal também próximo de Langsa, e em uma instalação do governo abandonada à beira-mar, próxima da cidade de Lhoksukon, a duas horas de carro ao norte, onde dormem no piso de concreto.

Grupos de ajuda humanitária temem que as condições sejam insalubres, com potencial de disseminação de doenças e nunca destinados para habitação por longo prazo.

"São campos de curto prazo", disse Steve Hamilton, vice-chefe da missão da Organização Internacional para as Migrações, em Jacarta. "Nenhum deles foi projetado para ser habitado. Se vier uma tempestade, eles não foram projetados para tempestades."

Apesar de Hamilton dar crédito ao governo por ter encontrado abrigo imediato para os imigrantes, ele e outros trabalhadores de ajuda humanitária disseram que o governo precisa encontrar rapidamente uma solução de moradia de médio prazo, como dormitórios.

"Este lugar nunca foi destinado para moradia de longo prazo", disse Thomas Vargas, representante chefe do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, em Jacarta, a capital da Indonésia. "Foi uma tentativa do governo, com a melhor das intenções, de atender a todos os que chegaram e atender às necessidades urgentes. Mas acho que todos entendem que há lacunas a serem preenchidas e coisas que precisam ser tratadas, como cuidar das condições sanitárias e atendimento a mulheres e crianças."

As organizações internacionais de ajuda dizem que os imigrantes precisam de instalações que possuam cantinas e escolas para centenas de crianças.

Na semana passada, a Indonésia e a Malásia concordaram em receber até 7.000 imigrantes por até um ano. Os bengaleses, que são considerados imigrantes econômicos, provavelmente serão repatriados, enquanto os rohingya, que estão pedindo asilo, poderão posteriormente ser enviados para outro país.

Entretanto, a Indonésia e a Malásia não especificaram como os imigrantes seriam abrigados.

Antes desta onda mais recente de imigrantes, a Indonésia já contava com cerca de 12 mil requerentes de asilo registrados e refugiados oficiais, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, a maioria do sul da Ásia e do Oriente Médio tentando ir para a Austrália ou para algum país do Ocidente. Cerca de 4.800 deles estão sendo mantidos em centros de detenção por todo o país, mas os demais estão vivendo em acomodações privadas financiadas por grupos de ajuda internacionais ou usando seus próprios recursos.

As clínicas inicialmente tratavam os imigrantes por exaustão, desidratação e infecções, apesar de os trabalhadores de ajuda humanitária alertarem que doenças podem se espalhar facilmente em meio a uma grande população vivendo amontoada em uma área fechada.

Mas, considerando que há apenas poucos dias eles estavam sob risco de se afogarem no mar ou morrer de exaustão, fome e sede, há poucas queixas desde que o primeiro barco chegou à deriva a Aceh, em 10 de maio.

Na verdade, os imigrantes disseram ter ficado surpresos com a boa recepção que receberam dos indonésios. Governos locais, organizações não governamentais e grupos de voluntários das províncias de Aceh e Sumatra Setentrional se mobilizaram para ajudar nos campos para imigrantes, enquanto as comunidades locais buscaram doar alimentos, água, roupas, brinquedos para as crianças e até mesmo dinheiro.

Para Salim, as condições não são uma preocupação, principalmente por ele estar vivo.

Ao ser perguntado sobre o que o espera, ele disse: "Eu não entendo a palavra futuro. No futuro, eu quero aprender sobre computadores, mas, em Mianmar, eu só conseguia pensar em quanto tempo ainda teria de vida".