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Filha de Bush vai da prisão na adolescência à chefia de missão social de saúde

Barbara Bush ao lado do pai, o ex-presidente George W. Bush, em junho de 2015 - Frank Franklin II/AP
Barbara Bush ao lado do pai, o ex-presidente George W. Bush, em junho de 2015 Imagem: Frank Franklin II/AP

Nicholas Kristof

28/07/2015 06h00

A maneira tradicional de falar sobre os jovens é com horror. Eles são selvagens, rebeldes, irresponsáveis, narcisistas, imorais e intratáveis - e sempre foram.

Agora vem essa geração do milênio, e temos um problema. Eles [nascidos nos anos 1980-90, também chamada de geração da internet] são criados nos "projetos de serviços", inscrevem-se às enxurradas no Ensinar para a América e doam para instituições de caridade em uma porcentagem maior (87%) que seus antecessores. Basicamente, eles apunhalaram pelas costas a nós, das gerações mais velhas, com seu idealismo e altruísmo, roubando-nos a oportunidade de nos sentirmos superiores.

Um dos exemplos dessa tendência, que também a alimenta, é Barbara Bush, 33. Sim, a filha do presidente George W. Bush - aquela de quem talvez você tenha ouvido falar quando foi presa por beber antes da idade permitida, em 2001.

Isso foi um alívio, pois indicou certa irresponsabilidade juvenil para que pudéssemos criticar: uma filha e neta de presidentes provocando um escândalo!

Mas Barbara acompanhou seu pai em 2003 em uma viagem à África e ficou chocada com o preço humano da Aids em Uganda. "Aquela desigualdade me deixou perplexa!", lembrou mais tarde.

Então ela voltou para Yale e teve aulas de atenção à saúde, e então discretamente assumiu um emprego (enquanto seu pai ainda estava na Casa Branca) em um hospital na África do Sul, muitas vezes trabalhando com crianças com Aids.

Depois de voltar, ela e cinco amigas começaram a quebrar a cabeça sobre como recrutar mais gente para ajudar na saúde global. Suas conexões abriram portas - ela é franca a respeito - e acabaram criando a Global Health Corps, que inicialmente pretendia ser uma espécie de versão para a saúde do Ensinar para a América. Bush tornou-se executiva-chefe aos 26 anos.

Hoje o Global Health Corps (GHC) está bombando. Recebe quase 6 mil inscrições por ano para menos de 150 vagas de bolsistas. A metade deles é americana e a metade estrangeira, na maioria africanos, e o programa é muito elogiado por profissionais de saúde.

Barbara Bush admite que seu sobrenome abriu portas e ajudou na expansão do Global Health Corps, e ela não pede desculpas por isso.

"Sou louca por minha família", disse. "Ensinaram-me a me importar com o mundo."

Ela tem uma reputação de liberal na família (como sua avó, também Barbara), pois já se declarou a favor dos direitos gays, vive em Nova York e no GHC formou laços com grupos pelo direito ao aborto, como Planned Parenthood Global e Marie Stopes International.

Mas ainda teme ser muito visada.

"Não sou muito fã de rótulos", disse, citando a romancista nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, que comentou sobre o perigo de se reduzir qualquer coisa a "uma única história".

"É fácil fazer isso com muita gente que é importante para mim", disse Bush.

Perguntei-lhe se às vezes é estranho quando amigos são irônicos sobre seu pai (eu mesmo já fui crítico). "Eu fiz faculdade quando meu pai estava disputando a presidência, e foi muito estranho", respondeu ela. "Não levo para o plano pessoal."

Sua paixão pelo serviço social certamente tem amplo eco em sua geração. O doutor Paul Farmer, cofundador da Partners in Health, enviou-me um e-mail de Ruanda (onde estava trabalhando com bolsistas do Global Health Corps) para dizer que quando fez faculdade de medicina havia pouco interesse pela saúde global. Hoje os jovens têmpaixão por participar.

"Do meu ponto de vista parece que a 'geração eu (meu)' foi substituída por uma geração do milênio muito mais enfocada nos outros", escreveu ele.

Os bolsistas do Global Health Corps, geralmente entre 25 e 30 anos, são colocados em grupos como Partners in Health ou Covenant House na África e na América. Seja em Zâmbia ou nos EUA, dois bolsistas trabalham durante um ano lado a lado, um do país anfitrião e outro do exterior.

Inicialmente eu desconfiei do GHC, perguntando-me como poderiam ser úteis esses jovens que muitas vezes não têminstrução médica. Mas Bush indica um especialista em logística do GHC que trabalhou em uma rede de fornecimento de remédios em Tanzânia, facilitando o acesso da população aos medicamentos. E arquitetos trabalharam projetando clínicas em Ruanda com menos fluxo de ar, para reduzir a probabilidade de contágio entre pacientes.

"Sou um grande fã do Global Health Corps", disse o doutor Peter Piot, que ajudou a descobrir o ebola e mais tarde dirigiu o programa da ONU sobre Aids. "Eles envolvem pessoas de fora da área médica na saúde global" - e isso, disse ele, é um desafio central do atendimento à saúde em todo o mundo.

A lealdade e a paixão da família Bush pela saúde convergem quando ela fala sobre o programa de seu pai contra a Aids, Pepfar - que salvou milhões de vidas (e é, na minha opinião, seu melhor legado).

"Provavelmente vou chorar", disse ela quando lhe perguntei a respeito. "Tenho um orgulho enorme do Pepfar. Me orgulho muito dele - poderia falar sobre isso até outubro!"

Então ela começou a chorar.

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves