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Cidades grandes dos EUA têm forte alta nas taxas de homicídio

Tamiko Holmes, norte-americana que perdeu dois filhos em um tiroteio em Milwaukee - Nick Cote/The New York Times
Tamiko Holmes, norte-americana que perdeu dois filhos em um tiroteio em Milwaukee Imagem: Nick Cote/The New York Times

Monica Davey, Mitch Smith, Matt Apuzzo e J. David Goodman

Em Chicago, Washington e Nova York

01/09/2015 19h14

Cidades diversas em todo o país estão vendo um aumento surpreendente no número de assassinatos após anos de declínio, e poucos lugares testemunharam uma mudança tão precipitada como Chicago. Antes mesmo do fim do verão, 104 pessoas já foram mortas neste ano. Em todo o ano de 2014 foram 86 homicídios.

Mais de 30 outras cidades também relataram aumentos na violência em relação ao ano passado. Em Nova Orleans, 120 pessoas haviam sido mortas até o final de agosto, em comparação com 98 no mesmo período um ano antes. Em Baltimore, os homicídios chegaram a 215, contra 138 na mesma época em 2014. Em Washington, o número é de 105, em comparação com 73 um ano atrás. E, em St. Louis, 136 pessoas foram mortas neste ano, um aumento de 60% dos 85 assassinatos ocorridos na cidade no mesmo período do ano passado.

Peritos policiais dizem que diferentes fatores estão em jogo em diferentes cidades, embora ninguém saiba ao certo por que as taxas de homicídio estão em alta. Algumas autoridades dizem que as críticas intensas em todo o país contra o uso da força por parte da polícia tornou-a menos agressiva e assim encorajaram os criminosos, embora muitos especialistas contestem essa teoria.

A rivalidade entre gangues de rua, muitas vezes por território de drogas, e a disponibilidade de armas são citadas como fatores importantes em algumas cidades, incluindo Chicago. O que é mais comum, entretanto, e citado por muitos policiais de alta patente é uma disposição crescente entre os jovens frustrados em bairros pobres de usar a violência para resolver disputas comuns.

“Dentro das gangues, manter seu status, credibilidade e honra é literalmente uma questão de vida ou morte”, disse o chefe da polícia de Milwaukee, Edward A. Flynn. “E isso está acoplado a uma realidade muito dura, que é o cálculo mental daqueles que vivem nesse estrato -que é mais perigoso ser pego sem a sua arma do que ser pego com ela.”

Os resultados têm sido frequentemente devastadores. Tamiko Holmes, mãe de cinco filhos, perdeu dois de seus filhos em tiroteios aparentemente não relacionados nos últimos oito meses. Em janeiro, uma filha de 20 anos foi morta a tiros em um assalto a uma festa de aniversário em um hotel Days Inn. Seis meses mais tarde, as autoridades voltaram a procurar Holmes: seu único filho, de 19 anos, tinha sido baleado na cabeça em um carro -a polícia ainda está à procura de um suspeito e do motivo pelo assassinato.

Holmes disse que recentemente convenceu suas filhas adolescentes restantes a irem embora de Milwaukee com ela, mas não antes de uma delas, de 17 anos, ter sido ferida em um tiroteio enquanto andava de carro.

“A violência não era assim antes”, disse Holmes, de 38 anos, que cresceu em Milwaukee. “O que mudou foram as ruas, as leis e os pais. Tornou-se uma confusão e uma luta”.

O derramamento de sangue urbano -bem como a taxa global de crimes violentos- permanece muito abaixo em relação aos picos vistos nos anos 80 e início dos anos 90, e criminologistas dizem que é muito cedo para tirar conclusões dos números recentes. Em algumas cidades, incluindo Cincinnati, Los Angeles e Newark, os homicídios permaneceram a uma taxa relativamente constante neste ano.

No entanto, com pelo menos 35 das cidades do país registrando um aumento no número de homicídios, crimes violentos, ou ambos, de acordo com uma pesquisa recente, o alarme está soando entre os chefes de polícia. O aumento provocou uma reunião de cúpula de urgência em agosto com mais de 70 autoridades de algumas das maiores cidades do país. Uma conferência em setembro promovida pelo Departamento de Justiça deve enfrentar os crescentes índices de homicídio.

“Com esse número de cidades tendo esse tipo de experiência, devemos nos preocupar”, disse Darrel W. Stephens, diretor-executivo da Associação de Chefes Principais Cidades e ex-chefe de polícia em Charlotte, Carolina do Norte.

Em Nova York e Chicago, os homicídios aumentaram em relação aos números de 2014 que, segundo as autoridades, foram os mais baixos em décadas.

Em Nova York, os assassinatos aumentaram cerca de 9%, de 190 no ano passado para 208 até meados de agosto. Os homicídios em Chicago estão cerca de 20% a mais do que no mesmo período um ano atrás.

O superintendente da polícia de Chicago, Garry McCarthy, acredita que a abundância de armas foi um fator importante no aumento de homicídios de sua cidade. Enquanto as autoridades de ambos os partidos estão pedindo uma redução da população prisional, ele insistiu que os infratores das leis de armamentos deve enfrentar penas mais duras.

“Em todo o país, nós vimos que não é o indivíduo que nunca cometeu um crime que subitamente mata alguém”, disse McCarthy segunda-feira. “São os reincidentes. São as mesmas pessoas repetidamente”.

Entre alguns especialistas e agentes, a teoria de que o policiamento menos agressivo está encorajando os criminosos -conhecida como o “efeito Ferguson” em alguns círculos- é uma teoria popular para o aumento na violência.

“O equilíbrio entre a polícia e os criminosos mudou”, disse Alfred Blumstein, professor e criminologista da Heinz College, da Universidade Carnegie Mellon.

Outros duvidam da teoria ou dizem que não há dados para provar isso. Richard Rosenfeld, criminologista da Universidade de Missouri-St. Louis, disse que os homicídios em St. Louis, por exemplo, tinham começado a subir em 2014 antes do episódio em que um policial branco matou um adolescente desarmado, Michael Brown, na cidade vizinha de Ferguson. Esses dados, segundo ele, sugerem que outros fatores podem estar em jogo.

Menos debatido é o sentimento entre os policiais que os mais jovens estão resolvendo suas brigas no tiro, inclusive com um caso iniciado no Facebook.

O capitão Mike Sack, comandante de homicídios do Departamento de Polícia Metropolitana St. Louis, citou assassinatos provocados por uma briga com relação à namorada, alimentos e até mesmo por personagens em um programa de TV. “O mais notável é que os indivíduos ficam tão chateados com coisas que eu ou outra pessoa consideraria insignificante, e recorrem a tal nível de violência”, disse ele.

Em oito anos como chefe de polícia de Milwaukee, Flynn parecia ter controlado o ritmo dos homicídios. Depois de uma alta de 165, em 1991, os assassinatos haviam mergulhado significativamente.

“Pensávamos que estávamos tendo um impacto”, disse Flynn. Mas, com o aumento dos últimos meses -uma morte em uma casa suspeita de ser ponto de drogas, um colega de quarto espancado até a morte, um adolescente baleado em uma mesa de cozinha- Flynn parece bem menos seguro. “Não me arrisco nem a dar palpite”.

O prefeito de Milwaukee, Tom Barrett, candidato à reeleição no próximo ano, recebe mensagens de texto sobre cada homicídio; elas chegam mais frequentemente agora, a cada poucos dias. A questão está tomando o centro do palco na disputa: alguns críticos de Barrett dizem que ele não está fazendo o suficiente para conter o crime, citando o que consideram um baixo investimento em bairros afro-americanos e maus-tratos de moradores negros pela polícia.

“Eu tenho que encontrar uma maneira para que estes jovens entendam que têm uma participação na sociedade”, disse Barrett, que se reuniu com pastores, líderes comunitários e outros, para discutir as matanças.

Tradução: Deborah Weinberg