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Oregon limpa fichas criminais e se prepara para a venda de maconha

A legalização do uso recreativo da maconha em Oregon foi comemorada em evento - Steve DiPaola/Reuters
A legalização do uso recreativo da maconha em Oregon foi comemorada em evento Imagem: Steve DiPaola/Reuters

Kirk Johnson

Em Portland, Oregon (EUA)

27/09/2015 06h00

Cerca de 15 anos atrás, quando tinha seus vinte e poucos anos, Erika Walton passou um cachimbo de maconha para alguém que acabou se revelando um policial à paisana, e foi intimada por porte de maconha. Ela pagou a multa, mas a violação continuou lá, assombrando sua ficha, diz ela.

Em uma tarde recente, Walton estava num atendimento jurídico gratuito em Portland, maior cidade do estado de Oregon (EUA), preenchendo os documentos para que a infração seja eliminada para sempre. Uma vez que o processo estiver concluído, ela poderá afirmar legalmente para qualquer empregador, locador, ou qualquer outra pessoa que pergunte, que ela nunca foi condenada ou intimada por nenhum crime relacionado às drogas.

"Isso tirou muita coisa da minha vida", disse Walton enquanto deixava suas impressões digitais, coisa que o estado de Oregon exige que os candidatos à eliminação de infrações apresentem.

A mancha em sua ficha não foi grave – uma intimação por porte de drogas segundo a lei de Oregon, mesmo naquela época, estava abaixo do nível de um delito leve, mais ou menos o equivalente a andar de metrô sem passagem. Mas ainda assim teve um custo quando ela teve de revelá-la ao se candidatar para empregos e cargos voluntários na escola de seus filhos, disse.

"É por esse motivo que isso significa muito para mim hoje", acrescentou.

O Oregon não foi o primeiro Estado a legalizar o uso recreativo da maconha, que aconteceu através de uma votação estadual em novembro, nem o maior. Mas ao se preparar para começar a venda de maconha no varejo no mês que vem, ele não deixa de estar abrindo um novo caminho, dizem juristas e empresários da maconha.

"O Oregon é um dos primeiros estados a pensar de fato na questão do que fazer com os registros de algo que antes era um crime e hoje não é mais", disse Jenny M. Roberts, professor de Direito na Universidade Americana em Washington, especialista em direito criminal e penas.

Estigma

Muitos estados nos últimos anos começaram a repensar as implicações das leis rígidas sobre as drogas e das sentenças obrigatórias que levaram a altos índices e custos de encarceramento, revendo as regras para que as pessoas que tenham corrigido suas vidas possam fugir do estigma de ter uma ficha criminal.

Walton usou uma lei estadual, que não está restrita a delitos relacionados às drogas, que permite que qualquer pessoa que tenha cometido um delito leve, contravenção ou violação não relacionada ao trânsito limpe sua ficha se tiver passado dez anos ou mais sem nenhuma outra condenação. A partir do ano que vem, condenações mais graves ligadas à maconha no passado, como por produção, por exemplo, também poderão ser eliminadas das fichas criminais.

A história idiossincrática da lei de drogas do Oregon explica em parte essa trajetória. O estado foi o primeiro a descriminalizar o porte de pequenas quantidades de maconha, em 1973. Isso deu início a um arco de experimentação jurídica que continuou este ano, com duas novas leis aprovadas pelo Legislativo para facilitar que pessoas como Walton voltem atrás e apaguem o passado.

Uma nova lei diz especificamente que os tribunais devem usar as regras da lei atual – segundo a qual portar, plantar e vender maconha são atividades legalizadas – ao considerar pedidos para limpar as fichas. Outra lei permite que a eliminação dos registros seja mais rápida para pessoas que tinham menos de 21 anos na época em que foram condenadas.

"Na reforma penal sobre a maconha, o Oregon foi mais longe do que qualquer outro estado", disse Leland R. Berger, especialista em leis e regulamentação sobre a maconha em Portland.

Menos impostos

Mas as diferenças na maneira como Oregon lida com a maconha vão muito além do direito penal.

Os impostos que os consumidores pagarão sobre a maconha de uso recreativo estão entre os mais baixos do país. Do outro lado da fronteira, o estado de Washington estabelece um imposto de 37%, em comparação com 17% em Oregon e um acréscimo municipal opcional de 3%.

Isso levanta a possibilidade de que, pelo menos no noroeste do país, os consumidores de maconha comecem a ir para o Oregon em busca de preços mais baixos. (Eles já fazem isso para comprar muitas outras coisas, uma vez que o Oregon tampouco tem um imposto regular sobre as vendas ao consumidor.)

Mas as autoridades de Oregon dizem que sua principal motivação para esta política fiscal é melhorar a concorrência com o mercado doméstico não-regulamentado e ainda ilegal, oferecendo preços mais próximos do que as pessoas estão acostumadas, mas com produtos e produtores agora inspecionados e monitorados.

O Oregon também rejeitou as ideias testadas em Washington e no Colorado sobre como monitorar e licenciar novos participantes do setor. Washington, por exemplo, criou um número definido de licenças e realizou um sorteio para distribuí-las; o Oregon não está estabelecendo limites sobre quantas empresas podem entrar no setor. Da mesma forma, o Oregon não tem restrições à chamada integração vertical, na qual uma empresa pode controlar o produto desde o plantio até a venda, uma prática que Washington também restringe.

Em Washington e no Colorado, a polícia deve fazer exames de sangue em motoristas suspeitos de ter sua capacidade de dirigir prejudicada por uso de maconha. Para evitar esse sistema tão complicado e incômodo, os legisladores de Oregon adotaram uma norma mais aberta aprovada pelos eleitores, que permite que os policiais usem seu julgamento para saber se uma pessoa está muito alterada para dirigir.

Limpar a ficha de condenações passadas, mesmo nos estados onde a maconha foi legalizada para uso recreativo, ainda é algo controverso. No Colorado, os promotores têm ampla liberdade para negar esses pedidos e fazem isso com frequência, especialmente nos casos em que a pessoa enfrenta acusações criminais mais graves, como a de produzir drogas, mas se declara culpada de um delito menor, como o porte.

"Há uma tensão entre o que a ficha de um caso mostra e o que a polícia e os promotores acreditam que poderia ser provado", disse Sam Kamin, professor de direito e processo penal na Universidade de Denver.