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Joe Biden: sem dinheiro, mal nas pesquisas, e ainda assim o maior rival de Hillary

Beto Barata/AFP
Imagem: Beto Barata/AFP

Nate Cohn

12/10/2015 06h00

O vice-presidente Joe Biden tem menos apoio nas pesquisas do que Bernie Sanders, e não levantou um dólar sequer para uma campanha presidencial. No entanto, se Biden decidir entrar na disputa para a Presidência, ele representará um desafio maior para a nomeação de Hillary Clinton pelos democratas.

Em Biden, Clinton teria um oponente capaz de ameaçar seu controle sobre a coalizão formada pela elite do partido e os eleitores mais moderados, que parece ter uma vantagem nesta disputa em relação à ala de ativistas brancos liberais que agora apoia Sanders.

Clinton continuaria sendo favorita, mesmo que Biden concorresse. Mas ao contrário de Sanders, o senador de Vermont que avançou em grande parte por conquistar eleitores já inclinados à insatisfação com Clinton, Biden teria uma força que viria quase que exclusivamente às custas dela.

De acordo com pesquisas do mês passado, Clinton é a segunda escolha de quase todos os que apoiam Biden. Sua força, que vem crescendo desde julho –quando ele começou a flertar com mais uma disputa presidencial e quando se intensificaram as investigações sobre a conta de e-mail particular que Clinton usava quando era secretária de Estado– é em grande parte responsável pela queda dela nas pesquisas.

Se ele ficar fora da disputa, Clinton retomará a liderança de 57% em relação aos 31% de Sanders, numa média de sete pesquisas nacionais. Essas mesmas pesquisas mostram Clinton à frente de Sanders por uma margem menor, 44% contra 27%, se Biden entrar na disputa; Clinton sobe 13 pontos sem Biden, enquanto Sanders sobe apenas 4 pontos.

A ideia de que a maioria dos eleitores de Biden prefere Clinton a Sanders poderia ser surpreendente se esses mesmos eleitores de Biden ou Sanders fossem considerados eleitores de "qualquer um menos Clinton". Mas, assim como Clinton, Biden é um democrata tradicional do establishment. Seus apoiadores são demograficamente muito parecidos com os de Clinton.

Sem ele na disputa, ela poderia unir a coalizão de eleitores mais velhos, moderados e não-brancos que tradicionalmente tem apoiado democratas do establishment para vencer a nomeação. É basicamente a mesma coalizão de Clinton em 2008, com o acréscimo dos eleitores negros. E os eleitores negros têm em geral apoiado candidatos moderados do establishment (Al Gore contra Bill Bradley, Bill Clinton contra Paul Tsongas, Walter Mondale contra Gary Hart), exceto quando um candidato negro, como Barack Obama ou Jesse Jackson, também busca a Presidência.

Essa coalizão poderia ser uma base suficiente para Clinton vencer a nomeação, mesmo que a deixe em disputas apertadas ou que ela perca em Estados onde os progressistas desempenham um papel desproporcional nas primárias ou convenções democratas, como em Iowa ou New Hampshire.

Entre os eleitores não-brancos, ela lidera numa disputa de um a um com Sanders por uma margem grande de 71% contra 16%.

Da mesma forma, ela lidera entre os eleitores moderados por uma margem de 63 contra 23 pontos. A disputa é mais acirrada entre os brancos e os liberais, mas ela ainda assim leva uma leve vantagem nos dois grupos numa disputa individual com Sanders.

Há poucos motivos para crer que Biden seja uma figura política tão convincente a ponto de simplesmente roubar a coalizão de Clinton. Ele concorreu duas vezes à Presidência com pouco sucesso. Foi vice-presidente por oito anos, mas não houve nenhuma onda de apoio para que entrasse na disputa. Ele pode estar indo bem nas últimas pesquisas, mas sustentar altos índices de favoritismo depois de entrar na briga e se tornar uma figura mais politizada pode ser uma história bem diferente. Ele enfrentaria ataques sobre seu passado longo e às vezes moderado demais no Senado em temas como a criminalidade, o orçamento ou o Iraque.

O desafio é ainda maior porque Sanders já consolidou boa parte da oposição natural a Clinton, e é um exagero sugerir que Biden –um democrata tradicional com um histórico não muito diferente do de Hillary– tem alguma chance de afastar os eleitores leais e entusiásticos de Sanders.

Mas ao contrário de Sanders, Biden é aceitável para as elites do partido, e quase todos os eleitores democratas o enxergam como "elegível". Ele é bem conhecido e apreciado por democratas de menor escolaridade e mais moderados, e sua relação com Obama também poderia, por fim, ajudá-lo com os eleitores negros.

Se Hillary Clinton titubear, o que é imaginável enquanto durar a controvérsia dos e-mails, Biden estaria pronto para aproveitar a oportunidade. Assim como Hillary é a segunda escolha dos eleitores de Biden, Biden é a segunda escolha dos eleitores de Hillary.

Um cenário no qual a candidatura de Hillary Clinton implode e deixa Biden numa corrida individual com Sanders é improvável. Mas Biden seria o favorito nesse caso, mesmo que tivesse que correr atrás da vantagem de Sanders na organização e captação de recursos. Uma pesquisa do YouGov mostrou Biden à frente de Sanders por uma margem de 58 a 42 em uma disputa um a um –ainda que fique atrás de Sanders numa disputa entre os três–, atraindo a maior parte do apoio de Hillary entre os eleitores mais velhos e não-brancos.

Uma possibilidade mais provável do que a implosão da candidatura de Hillary é que ela seja mais prejudicada do que se imagina agora pela controvérsia dos e-mails, ou que seja prejudicada por desdobramentos futuros. Nesse caso, a presença de Biden permitiria que as elites democratas a abandonassem, em vez de tentar fortalecer sua campanha, sabendo que têm uma alternativa aceitável e elegível.

Ainda assim seria muito difícil derrotar Hillary, graças à sua base forte e recursos consideráveis, e isso poderia levar a uma verdadeira disputa de três vias. Mesmo que Biden não consiga derrotar Hillary no final, ele dificultaria bastante seu caminho até a vitória.

Talvez o melhor cenário para Sanders envolva uma disputa acirrada e prolongada entre Hillary Clinton e Biden, na qual nem um nem outro consiga consolidar o voto do establishment ou o moderado, e que nenhum candidato esteja disposto a desistir. Os 30% ou 40% de Sanders na coalizão democrata podem ir muito mais longe se Biden e Hillary Clinton dividirem o restante. Quanto mais tempo durar uma disputa como esta, mais plausível será para Sanders espremer uma vitória plural. É uma possibilidade muito remota, mas não pode ser descartada.

O que sabemos com certeza é que Hillary começaria com uma grande vantagem numa disputa de três vias e que Biden é o tipo de candidato que teria a chance de abocanhar essa vantagem se ela encontrar mais problemas. E se ele não concorrer? Ela volta a ser a maior favorita para a nomeação. A decisão dele é, com certeza, a notícia política mais importante do momento.

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