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Nos EUA, aluguel alto leva jovens a morarem em contêineres

Heather Stewart entra no contêiner onde vive em Oakland; aluguel custa US$ 600 - Jim Wilson/The New York Times
Heather Stewart entra no contêiner onde vive em Oakland; aluguel custa US$ 600 Imagem: Jim Wilson/The New York Times

Sarah Maslin Nir

Em Oakland (EUA)

15/10/2015 06h00

Neste verão americano, o aluguel médio de um apartamento de um quarto em San Francisco subiu mais do que em Manhattan, impulsionado por um déficit habitacional alimentado em parte pela chegada de levas de pessoas que vêm minar o ouro da tecnologia.

E assim, como sempre acontece com essas cidades, as pessoas que não conseguem arcar com o aluguel são obrigadas a sair da cidade -- em Nova York, para o Brooklyn e cada vez mais para o Queens. Para os moradores de San Francisco, o refúgio é em Oakland, onde os preços também estão subindo. Tanto é assim que os jovens profissionais estão morando em contêineres reaproveitados, enquanto os sem-teto estão arrastando caixas para dormir sobre rodas.

Estas duas possibilidades de alojamento improvisadas surgiram em um bolsão industrial de Oakland, onde o aluguel médio subiu 20% em relação ao ano passado. Um desses projetos, em um armazém, é chamado de Containertopia, uma comunidade de jovens que criaram uma aldeia de contêineres de 15 metros quadrados, como os usados no porto de Oakland. Cada morador paga US$ 600 por mês (em torno de R$ 2.400) para viver em um recipiente que pode ser modificado com adicionais como isolamento, portas de vidro, tomadas elétricas, painéis solares e um banheiro independente.

O Containertopia foi criado no ano passado por Luke Iseman, 32, e Heather Stewart, 30, que eram casados. Para Iseman, que se formou na Universidade da Pensilvânia e trabalha com tecnologia -- mais recentemente, desenvolvendo sistemas automatizados para regar as plantas --, a vida no contêiner tem sido uma experiência de simplificação, que ele espera ensinar a outros.

“Se nós conseguimos em um dos lugares de maior custo do mundo”, disse ele, “as pessoas podem fazer isso em qualquer lugar”.

Bem na porta do armazém há outra comunidade que também mora em recipientes. Nela, os sem-teto moram em abrigos fabricados por um artista local chamado Gregory Kloehn, montados sobre rodas e feitos para as ruas. Cada um tem cerca de 2,5 metros de comprimento e a altura suficiente para uma pessoa se sentar.

“A estrutura não se encaixa em nossa mentalidade do que é uma casa”, disse Kloehn, 44 anos, que começou a criar e oferecer as casas portáteis feitas de material reciclado em 2011. Oakland tem ao redor de 3.000 pessoas desabrigadas, de acordo com o projeto East Oakland Community Project, uma organização sem fins lucrativos que ajuda a abrigar as pessoas que vivem na rua; San Francisco tem aproximadamente 6.700.

Kloehn fez cerca de 40 caixas sobre rodas alegremente pintadas, persuadindo as pessoas a deixar papelão e lona nas ruas.

“Dentro desta cidade, com todo o seu dinheiro, há outra camada: esses povos nômades que vivem do nosso lixo”, disse ele.

Stewart e Iseman montaram o Containertopia inicialmente em um terreno baldio da região, que eles compraram por US$ 425.000 com vários amigos. Eles foram forçados a sair na primavera deste ano, depois que os vizinhos reclamaram. (O zoneamento da área não permite residências; por enquanto, os proprietários estão cultivando uma horta lá, enquanto decidem o que fazer com o terreno.)

Em seguida, com 12 amigos e uma empilhadeira, Iseman e Stewart transferiram as casas de contêineres para um armazém fechado. Para serem habitáveis, os contêineres de Iseman, pintados de azul por dentro, precisam de um investimento de cerca de US$ 12.000, para uma cama tipo loft e uma janela cortada em uma lateral. Stewart ainda está trabalhando no contêiner dela, usando drywall e esculpindo uma bancada de cozinha a partir de uma tábua que ela extraiu de um tronco gigante.

A mudança de uma casa para um contêiner forçou-os a reavaliarem quase todas as suas prioridades. Stewart deixou o emprego em design digital para gerenciar o Containertopia e vendeu a maior parte de suas posses.

“Eu posso trabalhar em um escritório e pagar meu aluguel todos os meses e ficar estressada por não conseguir fazer qualquer outra coisa, ou eu posso viver em um armazém ridículo”, disse ela. “A escolha é óbvia.”

Kloehn, o artista, é mais conhecido por seu próprio lar, uma lixeira que virou um estúdio no lote de um coletivo de artes em Brooklyn, onde ele passa parte do ano. Sua outra casa é um estúdio em Oakland, no mesmo bairro industrial do Containertopia.

Anos atrás, Kloehn ficou fascinado com a forma como as pessoas sem-teto se apropriavam dos poucos recursos que tinham -- ou seja, o lixo de outras pessoas -- para fazer abrigos. Ele decidiu fazer o mesmo, criando pequenas habitações com remendos e a habilidade de um artista.

“Eu só estou aproveitando uma lição dos sem-teto”, disse ele. “Eles fazem casas deste tipo de material há anos.”

A uma quadra do estúdio de Kloehn, ao virar a esquina do Containertopia, encontramos uma de suas casas para os desabrigados, vivamente colorida com uma pintura trompe l'oeil que faz com que pareça uma microcasa suburbana.

“Esta casa é uma bênção”, disse a mulher que mora nela. Ela se recusou a dar seu nome porque disse que tinha vergonha de morar nas ruas, pois já teve um emprego estável e uma casa de verdade.

Ela acrescentou: “Esta é a minha maneira de tentar voltar a ser o que eu era.”